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Lingua e Cidadania: novas perspectivas para o ensino Claudio Cezar Henriques e Darcilia Simées (orgs.) Agostinho Dias Carneiro André Valente / Ataliba de Castilho Claudio Cezar Henriques Darcilia Simées / Fritz Utzeri / Helénio Oliveira Isaac Epstein / José Carlos de Azeredo / Jussara Abracado Luiz Antonio Marcuschi / Luiz Carlos Travaglia Maria Teresa G. Pereira / Nuria Gregori / Roberto Flores Roberto Moura / Sérgio Rodrigues / Vera Aguiar Thafs Nicoleti de Camargo Editora Europa Copyright © 2004 dos autores Coordenacdo editorial Claudio Cezar Henriques Comissaic editorial André Valente Darcilia Simoes Helénio Fonseca de Oliveira José Carlos de Averedo Maria ‘Teresa G. Pereira Hidvonaydio Bletranica Tunagem & Pexte Etch Reenine Clamhe Cezar Henriques Hiapir Laranelie Henriques CIP-BRASIL. CATALOGAGAO-NA-FONTE _SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ Tlenriques, Claudio Cezar, 199 imées, Darcilia, 1951- Lingua e Cidadania: novas perspectivas para o ensine / Claudia Cezar Ueariques (org). - Rio de Janeiro > Ed. Kuropa, 2004 328p. 2lem Palestcus e conferéacias, soba forma de arligas, proferidas no VIE Forum de Estudos Lingilisticos, promovido pelo Programa de Mestrado/Doutorado em Lingua Pore cuguesa, uo Instituto de Letras da UERJ, realizado em outubro de 2003. ISBN §5-7091-033-9 1, Lingua portuguesa - Estudo ¢ ensino. 2. Lingltisties - Estudo e ensino. 3. Line gus ¢ Tinguager - Estude ¢ ensine, Muibida a reprodugae total ou parcial. Qs infratores serio processados na formsa da lei EprTorA EUROPA Rua Riachuelo, 109 - Centro - Rio de Janeiro ‘Tels (21) 3852-8252 - imagem@rio.com.br SUMARIO Prefacio 9 Apresentacao - lt REFLEXOES SOBRE © PORTUGUES FALADO E O EXERCICIO DA CIDADANIA ; cliabiba T. de Castilho esses ecceneee 15 LEITURA E CIDADANIA Vive Teixeira de AME? een 34 GRAMATICA E CIDADANIA NAS SALAS DE AULA BRASILEIRAS (tandio Cezar Henriques .......... LINGUA PADRAO E CIDADANIA Thais Nicoleti de Camargo... 63 MUDANCA LINGUISTICA, ENSINO E CIDADANIA Pussara Abracadd va. ‘ 75 LINGUA PORTUGUESA £ CIDADANIA: UMA PERSPECTIVA MULTIDIALETAL PARA O ENSINO. Dareilia Simées 89 TIPOLOGIA TEXTUAL, ENSINO DE GRAMATICA E © LIVRO DIDATICO Tutz Carlos Travagha 1i4 TEXTO, SENTIDO E ENSINO DE PORTUGUES José Cartas de Azeredo .... 139 © TEXTO NOS LIVROS DIDATICOS Agostinho Dias Carneiro cco. 137 © TEXTO LITERARIO NA ESCOLA: PERSPECTIVAS DE ABORDAGEM Maria Terese Gangaltes Peveiv ccs susie VPS OS GENEROS DA REDACAO ESCOLAR E O COMPROMISSO COM A VARIEDADE PADRAO DA LINGUA Mebireie Vionsced de ORI acc sesesstcsssesettssesestssiccistsvisesne 183 LETRAS DE MUSICA NAS AULAS DE PORTUGUES: ESTILO, CULTURA E CIDADANIA cludre Vilente ..... NO PRINCIPIO ERA A RODA: UM ESTUDO SOBRE SAMBA, PARTIDO-ALTO E OUTROS PAGODES Roberto M. Moura .... 208 A CRONICA LINGUISTICA Sérgio Rodrigues .... QUANDO UM FATO SE TORNA NOTICIA NO JORNALISMO E NA CIENCIA Fsttac EPSte tte esscseessecsessccssasessseessssesssavseveessaee nernocavccememecns atthe CONTRIBUIGOES DA LINGUISTICA CONTEMPORANEA AO ESTUDO DAS RELACOES ENTRE LINGUA E CONHECIMENTO fais Anidnto Marcuscht. © DESGASTE DOS SENTIDOS NAS SOCIEDADES CONTEMPORANEAS 3 Roberta Flores .. a7: A \MPLANTACAO DE UMA POLITICA LINGUISTICA EM UM PAIS MONOLINGUE, MONOETNICO E MULTIRRACIAL Naviae Grogort Torada.weescssevssssvestssesoeseseeactstneennsestencnes 286 A NOVILINGUA E A PACIENCIA DAS PALAVRAS . thus Utsert ... 3 325 APRESENTAGAO DOS AUTORES CO Lute snteantes Mhatce us be PINKER. Mianza Editorial, 1995. SALOMAO, Margarida, A questio da construcao do sentido ¢ a revisin da agenda dos estudos da linguagem, Veredas, v3 (1). Juiz de Fora, 1999, p. 61-79, , SCHWARTZ, Monika, Einfitlung in die Verlag, 1992. SPERBER, Dan & WILSON, Deirdre. Relevance. Communivation and Cognition Oxford: Basil Blackwell, 1986. —— ‘TOMASELLO. Michael, The Cultural Ovigins of Human Cognition. C. London: Harvard University Press, 1999. Constructing Language; a Use-Based Theory of Language Acquisition ___ Cambridge: Cambridge University Press, 2003. UNGERER, Friedrich & SCHMID, Hans-Torg. An Introduction to Cogattive Linguistics. London and New York: Longman, 1996. : Kognitive Linguistik. Titbingea: Francke ambridge/ even. HL instinio det lenguaje. Coma crea el lenguaje ia mente. Madrid: O DESGASTE DO SENTIDO NAS SOCIEDADES CONTEMPORANEAS Roberta Flores 1. Introdugao Freqiientemente, a pratica da andlise semitica se realiza sobre textos “nobres”, com um certo valor estético, ctnolégico ou historio- grafico, para mencionar apenas alguns desses “valores”. Em tais tex- tos, o proprio teor do discurso é garantia de sua densidade semantica ¢ de sua riqueza expressiva. Vemo-los como testemunhos de uma cultu- ra ou de uma idiossincrasia, sem que seja possivel ou pertinente por em diivida sua representatividade ou sua importancia. Realizamos, pois, andlise semidtica sobre textos extraordinarios, que contrastam com a ordinariedade de nossa fala cotidiana, com a trivialidade do “pequeno” discurso proferido pelo mais comum dos mortais. Tal selecéo nos remete, em muitos casos, a privilegiar o dado fora do comum, a ordenagdo surpreendente, o dito inédite, em detri- mento das formas lingitisticas estereotipadas, manipuladas intermina- velmente, usadas ¢ desgastadas, que constituem nosso pao de cada dia. Ocexercicio que aqui se propée é uma reflexdo sobre o sentido quan- dea fala se estereotipa a ponto de parecer perder suas virtudes infor- mativas¢ s¢ aproximar do que anteriormente, em teoria da informacao, sc chamava “rufdo”. Diante de tais situagées, o analista da linguagem enfrenta a dificuldade de reconhecer efeitos de sentido supervenientes, que capiem sua atengae ¢ o guicm na interpretacao dos discursos. Tais dificuldades aparecem em miiltiplas formas do discurso: na existéncia de encadeamentos sintagmaticos quase lexicalizados, no processo de trivializacao de formas lingilfsticas que em sua origem foram inovado- ras, em discursos fortemente coletivos ideologizados ou que parecem responder a formas de expressao esquematizadas ou ritualizadas, ccm representacdes culturais de caratcr canonico. Frente a toda esta gama de fendmenos, a andlise semiética pode constituir um insirumento efi- caz de andlise — sob a candigao de que seu praticante evite esclerosar seus métodos € conccitos. uy 4 2. O distanciamento Como diz Landowski (1999, p. 8), a semiética pode ser considera- da um estilo de vida na medida em que. independentemente de ser uma pritica cientifica, é wma maneira de situar-se frente a lcxtos e frente ao mundo significante; uma maneira de investigar, mas tam- bém uma maneira de interrogar o mundo das manifestacées sensiveis. Considerada assim, torna-se possivel refletir sobre esse estilo de vida, sobre essa mancira peculiar de situar-se frente a linguagem ¢ suas manifestacoes para nela descobrir os alcances dessa atividade ¢ 0 modo pelo qual ao praticar essa disciplina, no momento de desvelar o mun- do do sentido, o semioticista se transforma a si mesmo. Essa forma peculiar de agio que éa pratica semidtica opera quan- do se realizam descrigdes do discurso para seguir os meandros do sen- tudo e chegar a suas fontes origindrias. Tal exercicio de “geografia” semantica exige do analista uma disposi¢do para seguir os contornos do caminho que sua andlise Ihe indica, de modo que sua atividade exploratoria saiba desentranhar a riqueza e variedade dos cenarios que se oferecem ante seus olhos, Embora a compreensao do sentido de um texto requeira uma competéncia lingitistica ao alcance de qualquer falante, a prdtica do semioticista supée, entao, uma habilidade previa- mente obtida a partir de inumerdveis exercicios descritivos que o fa- zem dono de scus instrumentos de observacao. A primeira delas é um distanciamento — de uma boa distancia como a chama Coquet (1984) — que permita ressaltar os fendmenos estudados scm se perder em nenhum detalhe, sem permitir que as ar~ vores impegam a visao do bosque. Como as montanhas, os discursos 36 sao percebidos a uma certa distancia ~ uma distancia que nao pressu- ponha um padrao comum de medida, um determinado afastamento ou aproximacao do objeto analisado. Sobre iso é possivel mencionar que, para o caso da lingua matcrna ou daqueia que o analista pratica fluentemente, muitas vezes , coma veremos adiante, se requer manter certo desapego a respeito da compreensao imediata do texto analisa- do. Enquanto no caso de linguas exéticas ou jd em desuso, par ndo haver uma compreensao cabal, é preciso um maior apego a forma lin- guistica, a qual nem sempre é garantia de éxito pois pode ter-se perdi- do a intuigdo semantica bdsica. Assim, por exemplo, a forma do espanhol leer (um Livro), com a qual pensamos ter recolhido inteira- mente seu conteuido, tem como equivalente no nahuatl classico 0 ver- bo quizaloa, cuja tradugao aproximada corresponde a organizar coisas, OU Seja, UNper uma ordem, o que esta muito longe da nogiio de recolhido © DESGASTE DO SENTIDO NAS SOCIEDADES CONIEMFORANIAN + como apropriagdo do conhecimento. Isto sucede a tal ponto que, para lin guas mortas, um anélise scmidtica enfrentaré obstaculos insuperaveis. Esta boa distancia (ou distanciamento) foi anteriormente chama- da “desfamiliarizacdo” ou “estranhamento”, pelos formalistas russos, os quais nela viam uma condigao para a andlisc poética que permite recuperar um sentimento ou “visdo” de inovacao frenie ao discurso, em contraste com os habitos e automatismos lingiiisticos: “o proposito de criar uma arte nova é 0 de regressar ao objeto do reconhecimento a ‘visao’” - afirmava Shklovsky (apud Cook, 1994, p. 131). Este conceito surgiu na base da tese de que a forma € contcudo, pela qual seus auto- res se referiam A forma artistica, & deteccio das formas significantes, ainda que buscassem em witima instancia uma renoyagao do contett- do. De modo que o discurso cotidiano se apresentava como um obs culo a vencer, como uma forma discursiva desgastada e esvaziada de sentide. Com ele abandonavam tanto o realismo em literatura, a mimesis aristotélica, como 0 critério romantico de originalidade na viséo do mundo. Atendendo tanto ao critério de boa distancia como ao ¢stra- nhamento , 6 preciso situar-se cm um poste de observagio que contri bua com a emergéncia dos efeitos de sentido de modo que a andlise possa ir desentranhando sua ordem subjacente. Lévi-Strauss ¢ G. Dumézil, por sua vez, assinalaram que as propriedades estrutarais dos objetos n§o sao acessiveis imediatamente mas que exigem um esforgo analitico que cuimina quando, nao sé por detras da diversidade dos fendmenos, mas também detras dos objetos mais mondétonos, de re- pente surge a sistematicidade do discurso. Do ponto de vista semidtico, propomos apelar para a nocao de debreagem para captar esse vinculo entre o semiolicista € o objeto semistico que observa. A debrcagem enunciativa é paraiela a que 0 sujeito enunciador realiza no momento de produzir o enunciado, mas neste caso ¢ 0 sujeite enunciatario que se debreia do texto — mais que debreia o proprio texto — para permitir que este “fale” ¢ se mostre, ou seja, para que torne aparente esse sentido profundo que antes estava velado. Afastamo-nos do texto para poder vé-lo melhor, perdemos par- te desse envolvimento intimo com a lingua na qual esta expresso para poder contemplé-lo como algo alheio. Aparentemente esse movimento de tomar distancia ¢ contrario 4 compreensao, ¢ inchui a empatia, pre- conizada pelo hermencuta: nao buscamos encontrar raz6es para reco- nhecer esse texto como um ato familiar, senéo justamente as razdes para considera-lo alhcio, estranho a nossa propria linguagem. Mas, no fundo, se trata de um procedimenta que o hermencuta nao rechagaria, 21h ER RE Porque x compreensie tambenre da distancia que separa, len da apro- ximacdo que irmana, 2.1. Esperar o iG esperado A experiéneia da andlise semiética confirma esta Operagac enunciativa basica de debreagem, Quando nos defrontamos pela pri- meira vez com um discurso, a Principio nao hé nada a dizer, j4 que esse discurso estd fechado diante de nés. Nao s6 esté fechado porque as unidades lingitisticas que 0 compéem sejam tao diversas ou estejam ordenadas de Maneira aparentemente cadtica, mas porque o discurso mesmo nos Pode parecer to evidente que qualquer comentério seria ario, dado que no todo Alu € se ordena conforme o esperado. Por sua evidéncia intrinseca, o discurso nos impede o acesso ale, Nestes textos opera-se um esvaziamento do sentido que se produz por “nossa familiaridade com as coisas”, pelo fato de “vivermos reduzindo gran- de quantidade de Nossos Comporiamentos, gcstuais ou linguisticos, a Simples automatismos” (Greimas, 1973, p. 13). ° Nao me refiro tanto a textos singulares, produto de exercicios de audacia Na esctitura ou a discursos Provenientes de culturas totalmen- te diferentes da nossa, senao a textos que sentimos entender em sua primeira leitura, textos Iransparentes que néo Parecem oferecer difi- culdades © que, portanto, cremos compreender. Em tal caso efetuar uma anélise semiantica nos pareceria ocioso ou redundante: explicari- amos aquilo que qualquer Pessoa haveria compreendido na primeira Jeitura. Lemos, por exemplo: “Sairam essas nagoes indigenas no ano do Senhor de citocentos ¢ vinte... Tardaram a chegar mais de oitenta anos... F assim chegaram a estas terras de Nova Espanha no ano tre zentos ¢ dois." Esta série de fatos telatados sc ordena de acordo com uma forma candnica evidente, na qual um deslocamento de um ponto de origem a outro nao pode senio refletir-se mediante suas fases incoativa, durativa ¢ terminativa, Assim apresentada, essa série nao Pode suscitar nossa curiosidade, nela nao ha nada Inesperado e, por- tanto, nada digno de andlise A cotidianidade nos veda o acesso ao sentido e, por conseguinie, limitamos nosso olhar ao esperado, nao hé nada que ver. No entanto, a pratica sistematica da andiise, 6 Tato: de Segulr OS passes assinalados Pelo métoda, PoucO a pouco nos entreabre ae + “Salieron esas Saciones indiasem el afio Del Schor de ochocientos y veinte, ‘Tardaron em liegar mas de ochenta aos... ¥ asi llearon a estas tierras de la Ni el aie trescientos das,..” eva Espafia em © DESGASTE DO SENTIDO NAS SOCIEDADES CONTEMPORANEAS © 277 as complexidades do sentido, para permitir-nos entrever significagdes cxtraordindérias que sc escondem detras da aparéncia mais ordindria. A série sair, tardar e chegar se torna problematica quando se poe em contexto “pelas grandes pausas e demoras que vinham fazendo”. Por que se detinham essas nagdes indigenas? Que faziam nessas pau- sas? Por que nao scguiam scu caminho? Ja faz varios anos, ao formular essas pergunias, mosirci que neste fragmento da Hatéria das Indias, do frei dominicano Diego Duran, os verbos com que era relatada a pere- grinacdo de seis tribos até o planalta central de México nao se organi- zavam simplesmente como as fases incoativa, durativa © terminativa de um deslocamento espacial, mas constituiam um enigma para o reli- gioso cronista, ja que era “1a0 pouco 9 caminho que em um més se anda”, Ao reconhecer a perplexidade do narrador, a série de verbos deixa de ser um mero automatismo da linguagem para mostrar-se come a manifestagio de estruturas semanticas subjacentes. Ao formular essas perguntas nao buscava desentranhar cadcias causais de eventos, intencionalidades ocultas ou vontades desfalecentes, ao modo de uma semdntica logica; tampouco buscava reconhecer uma metdfora basica na lingua, como Lakoff, que pudesse ser transposta para essa série de verbos e que servisse para relatar uma migracao ou representar o per- curso. Meu objetivo era mostrar que esse deslocamento, esse relato de uma migragao era um relato singular c izrepetivel, embora as palavras que o manifestam fossem enganosamente Previsiveis. As perguntas buscavam imterrogar a esse relate Gnico de uma mi- gragdo camo algo distante de outros relatos de trajetérias, percursos ou viagens. Ao formuli-tas situava-me na posigao do analista que tem que “debrear” o texto da cotidianidade da linguagem, dos horizontes compartilhados de expectativas que torna tedo texto previsivel. E cer- to que os eventos de um relato parecem encadear-se segundo padroes metaféricos subjacentes a lingua, formas prototipicas, esquematizagées ou cendrios pré-construidos, Nao é possivel negar a existéncia de for- mas preestabelecidas na lingua, simplesmente negamos que scja a essa distancia de observacie que se constitui o sentido de um discurso, Os mesmos encadeamentos que encontramos uma ¢ outra vez ree petidos em distintos discursos se tornam inespcrados no momento em que se formulam perguntas: — Por que isso no lugar de outra coisa? O que ndo deixa de parecer uma reformulacao da pergunta anterior for- mulada por Leibniz: - Por que algo no lugar de nada? O distanciamento, a desfamiliarizagde ou 9 estranhamento obti- dos mediante a pratica de certo rigor disciplinary, no sentide quase ianastico da expres Ao, andloga a pratica de ascetas que buscam certa luminagao, Todavia, neste caso, disciplina nao tem cores misticas, apenas se apdia inicialmente em certos procedimentos elementares. Basta, por exemplo, jogar com a ordem de uma série de eventos relata- dos para constatar a pertinéncia da pergunta de abertura que permite ate as infinilas variagdes do sentide. Conhecemos o famoso dito de César Vim, vi, venci, 0 qual se converteu com 0 passar do tempo e pelo prestigio de seu autor em uma séri¢ estereotipada: atualmente pode- mos encontra-la aplicada a muitas situacées alheias ao contexto guer- reiro em que foi enunciada. De modo tal que essa série compartilha seu cardter de csteredtipo com a primeira série mostrada. Se intercambiamos a ordem de apresentagao de seus componentes, ela perde imediatamente seu valor tipico e se reintegra ao oceano de eau ciados sut generis: Venci, vim e vi. Os Pintores ¢ historiadores de arte conheccm estes recursos de desfamiliarizagao, uma vez que trocam cores, fecham um olho, inver- tem a simetria de uma imagem para pér em relevo os valores plasticos que o objeto representado impede de ponderar. Estas técnicas de estranhamento correspendem a debreagem cnunciativa que realiza um semioticista durante sua andlisc, técnicas que subjazem A metodologia que a leoria propoc. Construir a possibilidade de trocar a ordem dos componentes de um discurso ou jogar com os paradigmas para substi- luir um clemento por outro sao alguns dos mecanismos que é possivel uulizar para ressaltar o cardter estercotipado de um discurso. 3. A evidéncia do discurso . Outros. casos, mais préximos de nosso tempo que os exemplos his- toricos mencionados, constituem todas os discursos ideoldgicos assu- midos per coletividades inteiras para dar conta de suas visocs especificas de mundo: discursos politicos ou partidarios, mas também discursos lecnocratas que s¢ apresentam como os mais adequados para expres- sar nossa modernidade. Por serem [estes discursos] préprios de coleti- vidades c ndo de autoria individual, nos envolvem em seus jogos ¢ tentam impor-se como os mais adequados para a sociedade inteira Sao discursos assumidos como evidéncias por seus praticantes ¢ por isso nao admitem réplica. Antes pelo contrério, sao discursos que pre- tendem a hegemonia, que nao buscam o consenso ou a unanimidade. Por mais que sejam visées parciais, jA que se aprescntam com 0 di: curso das coisas em Si. Para eles, os franceses cunharam a expressdo lingua de madeira”. 0 DESGASTE DO SENTIDG NAS SOCIEDADES CONTEMPORANEAS + 279 E preciso reconhecer neles, conforme Greimas (1973, p. 8), que “o homem vive em um mundo significante ou de sentidos” ¢ que, “para o homem, o problema do sentido n&o se formula, 0 sentido existe, sc impée como uma evidéncia, como um ‘sentimento de compreender’ completamente natural” Estes discursos nos formulam, por razdes sociolégicas que nao vem ao caso elucidar aqui, a impossibilidade de permanecer alheios a seus sentidos, Por um lado, quando se oferecem como evidéncias, nao per- mitem a polémica ou a argumentacdo, pois so discursos da simples denominag&o, discursos que pretendem ser realistas em maximo grau. Por outro, nado buscam a adesio c nos profbem de nos refugiarmos na indiferenga ou nos impedem de nos retrairmos 4 insensibilidade. Por seu efeito manipulatério nos modalizam mediante o néo poder nao escutar. Esses discursos sao destinadores de um programa narrativo, seniio de accitacdo, ao menos de atencao, ou seja, de uma negacao da indiferenga Dai, se ndo é possivel escapar a escuta, nos convém escutar bem, escutar melhor ¢ mais profundamente o que nos dizem, de modo que compreendamos 0s efeitos persuasivos de sua evidéncia, Um reconhe- cimento desse tipo de linguagem supoc exercer a analise semidtica como uma atividade terapCutica. Nao é 0 caso de se opor uma ideologia a outra ideologia ou, como preconizava Roland Barthes faz quase cin- quenta anos (1957, p. 8), de desideologizar o discurso mediante um exercicio de “semioclastia” que oponha ao discurso mistificador uma linguagem desmistificada; mais exatamente seguimos a Greimas, au- tor de De la imperfeccin (1987) em seu afa terapéutico por reintegrar 0 sentido & linguagem através da andlise semidtica. Exemplo indispensavel dessa lingua de madeira é 0 discurso da globalizacao referido a todos os Ambitos de nossa vida. Incessantemente escutamos dizer que a glohalizacde ¢ um fato inevitavel, gue € preciso adaptar-nos a cle sc queremos sobreviver no mundo contemporaneo ¢, com esse propésito, se nos propdem programas de agao salvadores que respondem ao lema onipresente: “pensa globalmente, atua localmen- tc”. Para nés, académicos universitérios, o discurso da globalizagao nos foi imposto como a Unica linguagem possivel ¢ nos leva a assimilar 9 mais rapidamente seus lemas. O discurso da educacao universitaria nos propée na atualidade uma redefini¢ao de papéis dentro de progra- mas de acgdo imperatives. Leio, por exemplo, na publicidade de uma universidade privada em meu pais que cla “prepara seus estudantes para triunfar num mundo global” outra assevera encontrar-se “sem pre na vanguarda na formagio de lideres”, ao passo que cla mesma TN ee elle 280 © Robie Late “realirma sua [propria] liderangu”; uma cnfatiza mais as “vantagens compctitivas” que sua formacao ¢ oferece como Prova “o éxito de scus egressos”, Liderange, competitividade, éxito: estas palavras se repetem uaa ¢ outra vez na “mercadotcenia” universitaria € constituem exem- plos vivos de um discurso que por forca de sua repetic¢ao morre ¢ cai na Insignificdncia, Se a partir da lideranga da instituigao, chegamos 8 li- deranca € éxito de scus egresses por vin de uma formacao competitiva, estamos irente a uma série tio estereotipada come as palavras de César ou as do frei historiador, mas que se resolve em um circulo, de lider a lider, que sé pretende virtuoso. O pereurse universitario é pois um es- forco perpétue para chegar ao mesmo: um lugar, a lideranga, que, no enlunto, aparece curiosamente vazio de contedda, Afinal, como enten- der que um institato de tnvestigacado antropoldgica se promova como lider em seu campo? Como medir nas ciéncias humanas 0 pretendido Progresso? Omitindo todo o questionamento, o discurso da globalidade se apresenta como 0 unico discurso Possivel, como o mais adequado e, portanto, aquele a que se atribui o valor de evidéncia do que vimos falando. Diante dele se constroem as alternativas que o carater mesmo do discurso rechaca: assumi-lo em sua evidencia e render-se portanto a sua familiaridade, tratar de permanccer indiferente — escapatéria que, ja vimos, 0 préprio discurso nos impede -, opor-lhe um discurso contrario, mas igualmente idcolégico. Por ele a tinica saida possivel consiste cm desentranhar seus sentidos Pprofundos e denunciar a im- postura de sua evidéncia para que, ao final da anélise, o semioticista assumia sua propria posicae c identidade e que o discurso analisado. cre suas proprias variantes ¢ alternativas, 4. O risco do reducionismo semidtico Diziamos quea debreagem realizada pelo enunciatério é uma das operagoes iniciais da andlise semidtica: debreamos o texto para poder vé-io meihor. Nesse sentido ela se inscreve no percurso narrativo de construcao reflexiva que o analista realiza Para converter-se em semioticista. Este percurso nao é simples, pois 6 cheio de surpresas, esconde perigos e peripécias, nos conironta com adversarios mais, ov MEnNos, astutos. O Lexto nos opde resistencia porque, quando sua sim- plicidade € aparente, s6 nos ofcrece o previsivel som surpreender-nos com sug singularidade, O texto € nosso adversario, nosso anti-sujeito. O analista tem de distanciaz-se do texto segundo dois pontos de vista: como objeto déja vu e como objeto de estudo singular. Para con- © DESGASTE DO SENTIDO NAS SOCIEDADES CONTEMPORANEAS * 281] trabalangar a dupla influéncia do discurso se opera uma tomada d upla de distancia a respeito de ambos os polos de atracao. A primeira debreagem instaura um objeto passivo de conhecimento que nos imp6e sua propria monotonia (~ Que diabo digo dele?), uma singeleza que nos desarma. De acordo com a teoria semidtica, esse dis- curso seré um actante-objeto, de que nos apropriaremos cognitivamente Se possuirmos as competéncias requeridas, competéncias meramente pragmaticas que sdo as adequadas para nos conectarmos com os obje- tos do mundo, ¢ n&o competéncias manipulatorias — de que se requer para interatuar com outros sujeitos. Nossa competéncia serd eventual- mente um saber técnico ¢ quasc mecdnico, nossa habilidade semiética sera taxonémica ¢ analdgica, mas nao interpretativa. Em termos de dinamica de forgas (ef. Talmy, 1988), diremos que esse objeto nos opde a resistencia passiva, que esse objeto ndo nos esca- pa nem s¢ esconde, nao se defende nem sc nos arremete: simplesmente opée a nossa cognicao o peso de sua simples presenga inerte. Nesse caso, sua familiaridade é superior a nossos esforcos analiticos. A ten- déncia desse texte sera a permanéncia: é um objeto cognitive estavel que se mantem em seu estado apesar de nossa investigagdo. Para que cle saia desse estado é preciso que o analista redobre esforcos ¢ ponha em marcha o discurso — a menos, claro, que nos conformemos com a primcira leitura c¢ sigamos adiante. No catanto, se nos deixamos influenciar por baixo dessa resistén- cia, sucederd que os papéis se invertem: jf ndo sera o texto um objeto Passivo, se nao como aa “lingua de madeira”, esse texto nos submetera € nos transformara em objetos, receptores passives de seu contetido. Em tal caso, efetivamente, j4 nao haverd nada a dizer, pois que a ideo- logia esclerosada haverd falado. A tnica alternativa possivel sera a re- pcligéo do teor do texto, como quem repete um texto canénico inalteravel: nao havera andlise do discurso, mas parafrase ou glosa in- termindvel. A segunda debrcagem instaura um texto cujo conteido nos opoe uma resisténcia, sendo actancialmente um sujeito que duplicames mediante a manipulagio ¢ o exercicio da intersubjetividade. O texto submetido a andlise é visto entéo como um sujeito vago (furtive) que se esconde atras de suas proprias aparéncias, que se gaba de sua retori- ca simploria, que se escuda atras da cotidianidade para negar-nos o acesso a seu sentido. A tendéncia dessc texto sera a de mudar-se ac fim de nossas inquisicoes: ¢ um objeto cognitive ndo-estivel em constante transformacao. Para dominé-to, 0 analista tem de conter essa dindmi- ca, Seja fixando uma s6 interpretagao, seja descobrindo a chave de suas 282 EREE'" OI + Roberto Flores mudungas, seguindo a corrente de transformagoes. E 0 caso de textos ambiguos que tiram proveito de sua propria polissemia: chistes, jogos de palavras, mas também relatos miticos que mudam constantemente de registro isotépico. Ao exigir essa dupla debreagem, a teoria da linguagem sc apre- senta como uma bussola para o analista desorientado que, perdido no habito ou na novidade, carece de pontos de referencia confidveis. Aos procedimentos j4 mencionados de desfamiliarizagio devemos acres- centar o rigor disciplinar de quem pratica o método semiético, pois a busca de estruturas narrativas e discursivas submete 0 discurso a um ascctismo destinado a tensionar a leitura até 0 ponto em que, dos formalismos que obtém, obtenha uma nova visio do conietido. Mas € preciso mencionar uma experiéncia nociva da pratica des- critiva: por forga de recomhecer estruturas narratives em miltiplos dis- cursos, terminamos por encontra-las em qualquer parte e com qualquer pretexto. Encontramos sempre o mesmo e reduzimos a diversidade a tinico discurso de contetido homogéneo. E assim como vemos estados de caréncia v esquemas de busca em textos das mais variadas origens; jé n&o nos € possivel ir ao cinema ou ler uma novela sem reconhecer 0 esquema narrative canénico nem todo seu esplendor, satisfeitos por haver encontrado por fim as trés provas de Propp. Vemos herdis ¢ trai- dores por todos os lugares ¢ terminamos considerando que todo dis- curso é avatar de um tinico e mesmo arquidiscurso. Esta deformacdo de nosso olhar é suficiente para muitos semioticistas que se alegram de encontrar 6 mesmo que outros jd haviam encontrado em outras cit- cunstancias ¢ acabam por reduzir sua investigacdo a busca de um mitico quadrado semidtice em detrimento do recanhecimento da ri- queza expressiva das linguas c dos discursos ¢ da variabilidade de suas estruturas, Ao nos tornarmos presas desta ilusdo de andlise, s6 substituimes uma cotidianidade por outra; por gencralizar certas estruturas deixa- mos de perceber a diversidade, assim como ao reconhecer esteredtipos deixamos de perceber 0 contexto que os individualiza. A esse respeito falou-se de um reducionismo semiético, de um imperialismo ou da prevaléncia irrestrita de Gnico esquema de narratividade, 0 que em minha opiniao corresponde nao a uma deficiéncia da teoria, mas a uma miopia da pratica que confunde a confirmagio de resultados ja obti- dos com a busca das estruturas do sentido. Frente a este risco é preciso recordar que a descrigdo semidtica consiste cm uma descrigao do sen- tido imanente ao discurso e um reconhecimento do significado ineren- te das unidades que o manifestam. © DESGASTE DO SENTIDO NAS SOCIEDADES CONTEMPORANEAS ¢ 283 5. A trama das esquematizacées Outras ciéneias da linguagem tampouco escapam do reducionismo ¢ das falsas explicagées. Os riscos ndo sao privativos da semidtica, encontramo-los em Ambitos como a teoria de prototipos ou a lingitistica das marcas e das molduras. Por sua parte, a construgao de redes concei- tuais desemboca em muitas ocasides em uma combinatdria de marcas ou de planos de agio, de roteiros ou de molduras previstos pela cultu- ra, todas clas formas da ritualidade c nao da criatividade lingitistica. O conceito de desfamiliarizagde dos formalistas russos foi critica- do porque, para justificar a novidade de uma forma literdria ou lin- gilistica, teria de contar de antemo com uma tcoria da familiaridade, com uma teoria do que constitui as formas canénicas da linguagem que delimitam 6 ambito de nossas expectativas ¢ a partir das quais se mediria todo desvio com relacdo a uma norma. Cook (1994, p. 138-88) atribui tal “debilidade” dos formalistas 4 “auséncia de uma tcoria lin- gilistica rigorosa”, a que concebe como wma tcoria gue inclui desde as andliscs sintaticas nos niveis oracional e suboracional até a andlise do discurso em termos de esquemas da linguagem, do texto ¢ do mundo. Tal proposta se inscreve dentro das propostas instrumentadas no mar- co da Inteligéncia Artificial (TA) para o processamento da linguagem natural. Dentro da problemiatica do desgaste do sentido ¢ da prevaléncia de esteredtipos cm nossa fala cotidiana, que ¢ o tema que nos ocupa, a proposta equivale a postular representagées mentais que servem de base para as expressdes lingitisticas. De modo que, ante a mencionada série saz, atrasar e chegay, a IA se vé levada 2 reconhecer a construgdo de formas esqueméticas subjacentes, responsdveis tanto pela produ- ¢4o lingitistica come por seu armazenamento na memoria sob a forma de representacoes nao-lingilisticas, No exemplo citado, leriamos en- 140 que evocar a existéncia de uma forma esquematica do caminko ou da senda pela qual circulam os participantes, A lingua dispenibiliza uma instncia para esta forma esquemitica ¢ elege uma forma lingiiis- tica determinada entre um conjunto de possibilidades. Estes esquemas correspondem a molduras ¢ situagdes descontex- tualizadas que sao guardadas na memoria — n4o estamos longe da no- cdo de cédiga — e servem como elementos construtivos das expressdes lingiiisticas. Também uma séria como a de Vin, vi, venci sera construida a partir de uma forma esquematica cuja identificagao ¢ mais proble- miatica, pois envolve nao a imagem esquemética de um objeto relacional —ocaminho -, masa cxisténcia de formas candnicas de processualidade. 28A © Reberte Lhe Ademais, independentemente de que dito esquema seja identificndo, Testa por resolver um problema crucial da andlise dos textos: i possibi lidade de etiquetar essas séries como sequéncias constitutivas de um desenvolvimento narrativo. No primeira exemplo, estamos faiando de uma migracdo ou pere- srinagao; no scgundo, de uma guerra ou uma conquista. Isto é toda série verbal 6 suscetivel de, pelo menos, duas pessiveis esquematizacoes: uma interoracional ¢ outra natrativa, A primeira se elabora compo cionalmente, oragio por eracaa; a segunda o faz por meio de relagdes de pressuposicao entre seqiiéncias constitutivas de um mesmo relato Poderia parecer que, 20 reconhecer estas duas classes de depen- déncias discursivas, tivéssemos resolvido o problema de explicar 0 ca- rater estereotipado de um discurso. No entanto, é preciso mencionar que, por um lado, ainda que a IA tenha teconhecido as dependéncias interoracionais, nao ocerrey 0 mesmo com a existéncia de seqiiéncias perteacentes a um mesmo discurso por caréncia da nogao de esquema narrativo. Por outro, a identificagdo des esquemas nao é automatica ¢ deve ser processada manualmente a partir de inumeraveis exercicios de andlise do discurso, 0 que apresenta todas as dificuldades de um tralamento casufstico do dado lingilistico. Ou seja, nao ha como con- trolar o numero de esquemas que serdo considerados, nem de cvitar a proliferacao de variantes, subvariantes C excecées a norma, muito me- nos de constituiz um modelo da inteligéncia humana, como alguns de seus seguidores tém proclamado. Contudo, além dessas objegées, a debilicdade de qualquer tweoria dos esquemas mentais reside fundamen- talmente nu fate de Que se substituig um dado “duro”, um “observavel lingttistico”, por um dado “brando” ¢ inverificdvel, a mente 6. Saida Come dar conta entio da existéncia, nao do extraordindrio, mas da inovagao ou do inaudito na linguagem sendo pelas formas mais na- turais de nossa comenicacao humana? Temos visto que por toda parte existem riscos ¢ tramas nes métodos Avia — jd cstava insinuado no principio ~ nao reside na aproxima- ¢do a um objeto que ingenuamente pensamos que se oferece a nossa investigagao em toda sua escassez, mas que encerra mais exatamente a ameaga de nos envolvermos em sua propria naturalidade. A via se en- contra no proprio analista que, negando-se a ser vitima das idcologi- Zacoes travestidas de evidéncia, evita cait no papel de espectador passivo de uma linguagem que s¢ apresenta como reflexo fiel de uma rea lida- © DESGASTE DO SENTIDO NAS SOCIEDADES CONTEMPORANFAS « 285 de inevitavel. Pensemos nessa globalizacao que, independente de ser um fato ao qual sé nos resta acomodar-nos, pareee trazer consigo sua propria linguagem. Nao € na andlise do objeto que residem as virtudes lerapéuticas da semidtica, mas na possibilidade de que, ao conhecer seus mecanismos mais intimos e profundas, o analista logre uma maior compreensdo de si mesmo, de modo que 0 sujeito passe a ser seu pro- prio objeto. Nisso reside a debreagem proposta: uma debreagem do sujcito a respcito dos discursos naturalizados que se Ihe Propdem ¢ aos quais Greimas mesmo — embora se refira ao fato estético — no impic uma tcoria que ifumine imperfeitamente os discursos, mas uma prdt, ca analitica que responda is exigéncias da lucidez. A indagacio semidtica se torna assim a pratica de uma ética. Mais que esmiugar a “lingua de madeira”, 0 semioticista se vé impelido a assumir uma Posicdo surgida da desmontagem minuciosa das engrenagens do sen- tido e do exercicie de sua capacidade critica. Referéncias bibliograficas BARTHES, R. Mythologies. Paris: Seuil, 1957. COOK, G. Discourse and Literature, Oxford: OUP, 1994. ; COQUEL J. C. La bonne distance. Actes Sémioriques-Documents, $3, Paris: GRSL-CNRS, 1984. GREIMAS, A. J. En torno al sentido, Madrid: Fragua, 1973 ——. De limperfection. Périgueux: Pierre Faniac, 1987. LEVANDOWSKI, 5. De imperfection: el libzo que se habla, In: —, DORRA, R. & OLIVEIRA, A. C. (cds.) Semititica, estesis e estética. Puebla-Sio Paulo: Educ-UAP, 1999. ‘TALMY, L. Force dynamics in language and cognition. Cognitive Science, v, 12, n? 1, 1988. dos Orgs.: Traduzido do original em espanhol por Darcilia Sines. com a cotuhora- gio de Claudio Cezar Hensiques,

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