Documentos de Académico
Documentos de Profesional
Documentos de Cultura
do Gato
Fico
Poncio Arrupe
Parte I
Poncio Arrupe
Parte I
11
Luzes
Enquanto caminha, com a dezena na mo direita, vai
recitando automaticamente as suas partes do tero em
sincronia e complemento com as de Manuel. F-lo em puro
automatismo, sem esforo consciente. Ao mesmo tempo a
sua mente rev com orgulho o episdio no qual foi
protagonista na manh daquele dia. Por vezes esse
sentimento transmuta-se em algo menos digno e louvvel:
em apenas alvio perante uma situao constrangedora e de
embarao que conseguiu ultrapassar apesar de no se ter
preparado para ela. Ou talvez precisamente por isso, por a
no ter antevisto, que se envolveu at um ponto em que se
tornou mais fcil para si seguir em frente do que retroceder.
A mando de um mais velho, passou por casa dos pais de
Manuel com a misso de o trazer. No lhe foi dada qualquer
explicao e deduziu que seria por qualquer motivo sem
demasiada importncia. Talvez s para lhe fazer companhia,
ou para servir de guia para uma viajem que Manuel nunca
havia feito.
Mas no. Foi recebido pela me e pela irm daquele com
frieza glida, embora educadamente. No se inteirou logo
plenamente do clima em que foi recebido. S agora, naquele
momento em que reza o tero, entregue exclusivamente
reflexo, adquire plena conscincia de que no era bemvindo, que foi para elas motivo de desapontamento, que as
duas mulheres no o esperavam ou que, pelo menos,
alimentaram at ao ltimo instante a esperana de que
Manuel no se ausentaria de casa, que no partiria. Foi
recebido quase como um raptor. Teve que aguardar por ele
na sala de estar, observando as duas mulheres a prepararem
a contragosto a mala, em silncio ostensivo, exibindo para
2
Poncio Arrupe
Poncio Arrupe
Poncio Arrupe
Poncio Arrupe
Poncio Arrupe
Poncio Arrupe
Poncio Arrupe