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P rojeto

PERGUNTE
E
RESPONDEREMOS
ON-LINE

Apostolado Veritatis Spiendor


com autorizagáo de
Dom Estéváo Tavares Bettencourt, osb
(7n memoriam)
APRESENTAQAO
DA EDIQÁO ON-LINE
Diz Sao Pedro que devemos estar
preparados para dar a razáo da nossa
esperanca a todo aquele que no-la pedir
(1 Pedro 3,15).

Esta necessidade de darmos conta


da nossa esperanca e da nossa fé hoje é
•- mais premente do que outrora, visto que
". somos bombardeados por numerosas
correntes filosóficas e religiosas contrarias á
fé católica. Somos assim incitados a procurar
consolidar nossa crenca católica mediante
um aprofundamento do nosso estudo.

Eis o que neste site Pergunte e


Responderemos propóe aos seus leitores:
aborda questóes da atualidade
controvertidas, elucidando-as do ponto de
vista cristáo a fim de que as dúvidas se
dissipem e a vivencia católica se fortaleca no
Brasil e no mundo. Queira Deus abencoar
este trabalho assim como a equipe de
Veritatis Splendor que se encarrega do
respectivo site.

Rio de Janeiro, 30 de julho de 2003.

Pe. Esteváo Bettencourt, OSB

NOTA DO APOSTOLADO VERITATIS SPLENDOR

Celebramos convenio com d. Esteváo Bettencourt e


passamos a disponibilizar nesta área, o excelente e sempre atual
conteúdo da revista teológico - filosófica "Pergunte e
Responderemos", que conta com mais de 40 anos de publicacáo.

A d. Estéváo Bettencourt agradecemos a confiaga depositada


em nosso trabalho, bem como pela generosidade e zelo pastoral
assim demonstrados.
ANOXXXVm NOVEMBRO 1997 41
"Ó Morte, onde está a tua Vitoria?" (1Cor 15,55)
A Biblia escondida debaixo da Biblia

Liberada a Esterilizado

"Em Nome da Ciencia, parem..."

O Caso de D. Lefébvre atualmente

Os Estigmas: Que sao? Por que sao?

Transe e Éxtase: Que sao?


"Ouco Vozes do Além que me atormentam..."

"Chamada da Meia-noite"

Livros em Estante
PERGUNTE E RESPONDEREMOS NOVEMBRO 1997
Publica9áo Mensa! N°426

SUMARIO
Diretor Responsável
Estéváo Bettencourt OSB
"Ó Morte, onde está a tua Vitoria?
Autor e Redator de toda a materia (1Cor 15.55) 481
publicada neste periódico
Misterio Cabalísticos:
Diretor-Administrador: A Biblia escondida debaixo da Biblia .... 482
D. Hildebrando P. Martins OSB
No Brasil de nossos dias:
Liberada a Esterílizacáo 486
Administracáo e Distribuicáo:
Edicóes "Lumen Christi" Voz corajosa:
Rúa Dom Gerardo. 40 - 5° andar -sala 501 "Em Nome da Ciencia, parem..." 491
Tel.: (021) 291-7122
Excomunháo?
Fax (021) 263-5679
O Caso de D. Lefébvre atualmente 495

Enderece- para Correspondencia: No Setor do Extraordinario:


Ed. "Lumen Christi" Os Estigmas: Que sao? Por que sao?. 499
Caixa Postal 2666
Ainda no Plano do Extraordinario:
CEP 20001-970 - Rio de Janeiro - RJ
Transe e Éxtase: Que sao? 508
Visite O MOSTEIRO DE SAO BENTO Que será?
e "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" "Ouco Vozes do Além
na INTERNET: http://www.osb.org.br que me atormentam..." 514
e-mail: LUMEN.CHRISTI @ PEMAIL.NET
Colecáo Fundamentalista:
"Chamada da Meia-noite" 519
Impress3oe Encadernacío
Livros em Estante 527

•marquessarama" COMAPROVACÁO ECLESIÁSTICA


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NO PRÓXIMO NÚMERO:

A Historicidade dos Evangelhos (José Miguel García). - "A Historia Perdida e Recupera
da de Jesús de Nazaré" (Juan Luís Segundo). - A Exploracáo Sexual das Criarlas. -
O Trabalho Infantil. - "Há outro Cristo?"(J.T.C.)

(PARA RENOVACÁO OU NOVA ASSINATURA: RS 25,00).


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Obs.: Correspondencia para: Edicoes "Lumen Christi"


Caixa Postal 2666
20001-970 Rio de Janeiro RJ
"Ó MORTE, ONDE ESTÁ A TUA VITORIA?"
{1 Cor 15,55)

O mes de novembro sugere o binomio "Morte-Vida" ou "Vida-Morte".


Quem percorre os escritos do Novo Testamento, verifica que, assim como a
palavra-chave dos Evangelhos Sinóticos (Mt, Me, Le) é "Reino dos Céus", a pala-
vra-chave no quarto Evangelho é VIDA: sim, Jesús é a VIDA (Jo 14,6) e veio para
que "os homens tenham a vida, e a tenham em abundancia" {Jo 10,10).
Para se etender o alcance destas afirmacoes, é oportuno reconstruir o paño
de fundo respectivo. O homem grego pré-cristáo tinha como grande anseio a
athanasía ou a imortalidade. Esta era tida como privilegio dos deuses, que faziam
tudo o que os homens fazem (guerras, orgias, bacanais...), mas nao morriam, ao
passo que o homem sabia estar condenado á morte; daí a inveja dos homens em
relacáo aos deuses. A conviecáo de que a morte é inevitável imprimía urna nota de
tristeza á literatura helénica. Com efeito; o oráculo de Delphos incutia: "Conhece-
te a ti mesmo". Esse conhecer-se implicava tomar conhecimento de que o homem
é mortal; é mortal, e nao deus; somente os deuses sao ¡moríais. Um abismo
separava dos deuses os homens; eles nao sao da mesma estirpe. Escrevia Píndaro
(t438a.C):

"Nos outros, moríais, só desejamos, da parte dos deuses, bens que nos
sejam proporcionados. Conhegamos bem a nossa estrada, a porcáo que nos foi
assinalada. Nao queiras, ó minha alma, desejar urna vida sem fim" (Pitesinas
3,59).

A certeza da morte podia suscitar desánimo e prostragáo: vale a pena viver


alimentando ideáis e esperanca, para acabar no nada?
Pois bem. Foi sobre este paño de fundo que ressoou a mensagem crista.
Esta apregoa que o próprio Deus se fez homem, assumiu a dor e a morte dos
homens, para vencé-las ressuscitando. Ele convida os discípulos a segui-Lo, pois
"quem morre com Cristo, com Ele vivera" (2Tm 2,11). É esta urna das grandes
notas da Boa-Nova: o Senhor trocou o sinal negativo da morte por um sinal positivo,
a tal ponto que Sao Paulo podia dizer: "Para mim, viver é Cristo, e morrer é lucro...
O meu desejo é partir e estar com Cristo, poís isto me é muito melhor" (Fl 1,21 -23).
Ou ainda: "Estamos cheios de confianga, e preferimos deixar a mansao deste
corpo, para ir morar junto do Senhor" (2Cor 5,8).
A certeza de que a morte nao é um fim, mas sim urna passagem, e passa-
gem para a plenitude da Vida, suscitou de muitos Santos e justos palavras surpre-
endentes. Seja citada Santa Teresa de Lisieux, que, no fim da sua vida terrestre,
declarava:

"Sinto que vou entramo repouso... mas sinto principalmente que minha mis-
sao vaicomegar, minha missáo de fazeramaroBom Deus como O amo" (Verba).
Possa a mesma fé vibrar no coracáo de todo cristáo, levando-o a antecipar já
na Térra o feliz encontró com o Senhor, que estará consumado na eternidade, da
qual a Dama Morte é o limiar!
E.B.

481
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS"

Ano XXXVIII - N° 426 - Novembro de 1997

Misterios cabalísticos:

A BÍBLIA ESCONDIDA DEBAIXO DA BIBLIA

Em síntese: A opiniáo pública foi sacudida pelas proposigóes do


Prof. Michael Drosnin, que disse ter descoberto na Escritura profecías
surpreendentes relativas aos tempos modernos, bastando para isto ler
ñas entre-linhas e contar letras, palavras... Na verdade, tal conclusáo é
destituida de fundamento, pois Deus nao fala por palavras cruzadas, mas
tem urna mensagem dirigida a todos os homens, tendo em vista a salva-
gáo eterna e nao o curso da historia universal em si mesma.
* * *

Foi publicado, há meses, o Nvro do Prof. Michael Drosnin, que em


traducáo francesa tem o título "La Bible: Le Code Secret" (A Biblia: o
Código Secreto). O autor julga que as Escrituras indicam, de maneira
velada, acontecimentos de épocas futuras, inclusive do século XX: so-
mando letras e versículos, multiplicando, dividindo..., deslocando ou re
tocando certos vocábulos, ter-se-iam profecías surpreendentes!

O livro foi noticia de televisáo muito comentada pelo público, cau


sando grande perplexidade. Na verdade, trata-se de manipulacáo do tex
to sagrado, que absolutamente nao foi redigido para predizer a historia
dos séculos do Cristianismo em sua face política e estratégica. Pode
haver coincidencias, habéis jogos de palavras, concepcóes predefinidas
na base das conclusóes de Michael Drosnin.

Entre as varias réplicas a tal obra, destaca-se um artigo muito sim


ples, mas denso, do Pe. Olivierde la Brosse O.P., porta-voz da Conferen
cia dos Bispos da Franca, publicado no boletim SNOP, órgáo oficial da
mesma Conferencia, edicao de 28/6/1997, p. 1 - Eis o teor de tal artigo:

1. O PROFETA NAO É UM FUTURÓLOGO


"Um livro cabalístico, traduzido do norte-americano, nos informa,
nos últimos dias, que a Biblia traz um código secreto, que prediz o futuro

482
A BÍBLIA ESCONDIDA DEBAIXO DA BÍBLIA

e principalmente as desgragas que este acarretará nos próximos anos.


Todo um sistema de acrósticos,1 palavras cruzadas, leituras ascenden
tes e descendentes, binarias ou diagonais dos caracteres hebraicos re
vela ao perito de informática acontecimentos outrora ocultos, hoje des
vendados e geralmente catastróficos: assassínios, quedas de Governo,
holocaustos atómicos e outras guerras mundiais. Até há pouco sabía
mos que a Biblia ensina como ir para o céu; agora ela nos diz quando e
como o céu nos vai cair sobre a cabega... Nostradamus e suas profecías
sao relegados para o armazém dos acessórios... Viva a informática! Existe
urna Biblia debaixo da Biblia.

É esta a ocasiáo de nos recordarmos de que um Profeta, no Livro


Sagrado, nao é tanto um vidente, um adivinho ou um futurólogo quanto
um homem que fala de Deus para o seu tempo, e que fala em nome de
Deus, para todos os tempos. Nao é o futuro que ele desvenda, mas é o
presente. Ele é o mensageiro da eterna presenga de Deus a todos os
dias deste mundo que passa. Ele liberta o homem, pela esperanca, dos
medos que Ihe inspira o misterio do pon/ir.

Isaías lembra as exigencias da justiga. Oséias, as dificuldades e as


grandezas do amor. Ezequiel, a necessidade da conversáo dos coracóes
(Ez 36,25-27). O Profeta bíblico nao precisa dos olhos do vidente; ape
nas se Ihe pede que tenha labios puros para anunciar a Paiavra de Deus
(Is 6,6s). O Cristo mesmo, modelo dos Profetas, nao predisse muita coi-
sa, mas sim a renegagáo de Pedro (Mt 26,34) e o seu próprio retorno no
fim dos tempos (Mt 24,30). Em compensagáo, Ele nao se cansou de es
clarecer o sentido da vida humana pela luz da esperanga.

No livro da Paiavra, os vocábulos que contam, sao os de urna Ver-


dade que nao se oculta nem se torna cifrada, mas, ao contrario, nunca
deixa de se exprimir com clareza. Deus nao brinca de palavras cruza
das".

2. REFLETINDO...

Em suma, o autor quer dizer que

1) a finalidade da Biblia nao é revelar a historia universal nem os


acontecimentos fináis da historia. Ela foi inspirada para dizer aos ho-
mens como podem e devem ir para o céu ou como háo de viver para
gozar da plenitude da vida na patria eterna. Por conseguinte, o objetivo
da Biblia é estritamente religioso, e nao profano;

1 Acróstico é urna composicáo poética na qual o conjunto das letras iniciáis (e, as
vezes, as mediáis e fináis) dos versos compóe verticalmente urna paiavra ou frase.
(Aurelio)

483
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 426/1997

2) a Biblia nao é um Hvro de futurologia. Ela é profética no sentido


etimológico da palavra. Prophétes, em grego, é aquele que fala pro,
isto é, em lugar de Deus ou também... antes de... ou antecipada-
mente. Com outras palavras: os autores sagrados falaram em nome
de Deus, analisando os acontecimentos contemporáneos, exortando,
louvando ou censurando e também... falaram predizendo o futuro, ou
seja, a vinda do Messias e seu Reino, sem descer a pormenores da
historia dita "profana". Há relativamente poucas predicóes na Biblia e
muito maior número de narracoes do passado e exortacóes referen
tes ao presente;

3) "Deus nao fala por palavras cruzadas"; nao fala apenas para
"iniciados" espertos, adivinhos geniais, decodificadores,... mas a Pala
vra de Deus interpela todos os homens, de modo que ela pode e deve
ser acessível a qualquer leitor que se Ihe queira aplicar, usando os re
cursos convencionais do estudo, sem recorrer a regras do "preciosismo"
ou do malabarismo cabalístico;

4) a Cabala é urna modalidade de interpretacáo da Biblia relativa


mente tardía. Com efeito; Cabala (do hebraico qaballah = tradicáo ou
transmissáo) designa a doutrina esotérica dos judeus, que se foi forman
do aos poucos desde o inicio da era crista e no sáculo XII d. C. atingiu a
sua configuracáo mais elaborada. Resulta da fusáo de genuínos elemen
tos bíblicos (o texto sagrado é básico ñas especulares cabalísticas)
com o neoplatonismo panteísta e outros elementos "místicos" da antigui-
dade e da Idade Media.

Os cabalistas assim explicam a origem da Cabala:

Henoque (cf. Gn 5,21-24) ensinou ao Patriarca Abraáo (séc. XIX a.


C.) urna doutrina oculta, que Abraáo transmitiu oralmente a seus filhos e
netos. No século XIII a. C. Moisés redigiu por escrito esses ensinamentos
no livro da Lei ou no Pentateuco.

Acontece, porém, que Moisés fora iniciado nos misterios do Egito.


Por isto escreveu em estilo simbólico servindo-se da língua egipcia, lín-
gua que havia chegado ao mais alto grau de perfeicáo. Moisés previa
que a sua mensagem, pura como era, nao se conservaría ñas máos do
seu povo, que peregrinava pelo deserto. Por isto, tencionando evitar fal
sas interpretares, confiou as chaves do entendimento de seus escritos
a homens seguros, de fidelidade comprovada; entregou-lhes de viva voz
os esclarecimentos necessários para urna auténtica compreensáo da
Tora (Lei).

Os discípulos de Moisés confiaram esses ensinamentos secretos a


outros homens, que os passaram adiante. Assim, de geracáo em gera-

484
A BÍBLIA ESCONDIDA DEBAIXO DA BÍBLIA

gao, chegou até nos essa doutrina esotérica ou oculta que os rabinos
chamam Cabala.

Moisés tinha acesso ao templo egipcio de Tebas, que continha os


arquivos sacerdotais da extinta raga vermelha ou atlántida e os da seita
de Ram, que tinha sede na india. Moisés, portanto, foi iniciado em todos
esses conhecimentos, como também nos misterios da raga negra, guar
dados no templo de Jetro, seu sogro, que foi o último sobrevivente dos
sacerdotes dessa raga (cf. Ex 3,1). Assim a tradigáo oral que Moisés
deixou aos seus discípulos, continha o essencial de todos os ensinamentos
ocultos que existiam na face da térra.

Dizem também os cabalistas que Moisés escreveu em caracteres


Vattam; todavía no século VI a. C. o sacerdote Esdras os substituiu pelos
caracteres hebraicos atualmente utilizados. Isto deve ter criado distancia
entre o texto primitivo e o texto atual do Pentateuco. A genuína interpre-
tagáo deste foi entregue por Moisés nao á tribo sacerdotal (levítica), mas
a comunidades leigas de profetas e videntes, das quais a principal foi a
dos essénios.

Para se conservar inalterado o texto sagrado, os profetas davam


normas aos leitores e copistas, normas que se derivavam do esoterismo
de Israel e que hoje se chamam a Massorah. Esta, juntamente com outras
tradicóes secretas (Michná, Gemará, Targum), constituí a Cabala judaica.

Em suma, vé-se que a Cabala é um tecido de proposigoes imagino-


sas, destituidas de fundamento histórico, literario ou científico. Abrange
a numerologia, a astrologia, a magia, a comunicagáo com os espíritos do
além, o curandeirismo... Há quem tencione, na Cabala, diagnosticar do-
engas, detectar a personalidade de alguém, predizer o futuro, orientar o
comportamento dos clientes, etc.

Comparando entre si os autores cabalistas, verificamos que nem


sempre concordam entre si ao indicar o significado dos números e das
letras do alfabeto. A interpretagáo destes sinais é altamente subjetiva e
pessoal, pois ao mesmo sinal se podem atribuir mensagens diferentes
ou mesmo contraditórias. Embora táo frágilmente construida, a Cabala
atrai muita gente, porque parece oferecer solugoes prontas e eficientes
por vias sobre-humanas a pessoas que estáo cansadas ou céticas em
relagáo á ciencia e pericia dos homens, ou também a pessoas que póem
a razáo de lado para atender á fantasía desenfreada.

É para desejar que todo homem, ao receber urna mensagem "mara-


vilhosa", exerga urna crítica sadia e pergunte quais as credenciais de tal
mensagem ou em que fundamentos lógicos e objetivos ela se apoia... E
verá que muita fantasía se dissipará.

485
No Brasil de nossos días:

LIBERADA A ESTERILIZAQÁO

Em síntese: A legislagáo brasileira permite a esterilizagáo de ho-


mens e muiheres a partir dos últimos meses. Este novo dispositivo fere a
natureza e suas leis (que sao as leis de Deus), pois propicia a mutilagáo
do organismo humano; todo ataque á natureza está sujeito a réplicas da
mesma. Além disto, a nova leí favorece o recurso aos anticoncepcionais
(que fazem mal á saúde), pois os profissionais tém de explicar aos inte-
ressados o funcionamento dos recursos artificiáis de contengáo da nata-
lidade antes de aceitar o pedido de esterilizagáo. Mais aínda: a esteriliza
gáo condena o Brasil a progressivo envelhecimento,... envelhecimento
que se vem notando nos últimos anos; com efeito, o número de jovens
tem decrescido, ao passo que o de anciáos aumenta em nosso país - o
que provoca desequilibrios varios nos planos económico, social, educa
cional, hospitalar...
* * *

A legislagáo brasileira já faculta a esterilizagáo de homens e muihe


res, desde que se cumpram algumas exigencias previas estabelecidas
pelo Governo. A medida governamental assim concebida sugere ponde-
racóes de ordem ética e social. É o que será proposto ñas páginas subse-
qüentes, depois de se apresentarem os traeos gerais da nova legislacáo.

1.0 Problema

A lei permite a esterilizagáo de homens e muiheres com idade supe


rior a 25 anos ou, pelo menos, com dois filhos vivos. As pessoas com
deficiencia mental só podem ser sujeitas á esterilizagáo após autoriza-
gao judicial. Os hospitais públicos tém de se aparelhar para o processo
cirúrgico e oferecer os servigos respectivos; o Servigo Unificado de Saú
de (SUS) fica obrigado a ressarcir as instituigóes convencionadas pelas
cirurgias realizadas.

Antes da intervengáo cirúrgica, os interessados tém de se cadastrar


nos programas de planejamento familiar de seus municipios. Durante
sessenta dias, recebem instrugóes sobre os métodos contraceptivos pre
vistos pelo Ministerio da Saúde, como preservativo, dispositivo intra
uterino (DIU), diafragma e pílula anticoncepcional. Também sao alertados
sobre os riscos de irreversibilidade da esterilizagáo e sobre os altos cus-

486
LIBERADA A ESTERILIZADO

tos desse tipo de cirurgia. Os hospitais devem desencorajar a esteriliza-


cao precoce. O paciente há de exprimir por escrito sua vontade de ser
esterilizado e os médicos tém o dever de comunicar ao Ministerio da
Saúde todas as cirurgias de esterilizacao que tenham efetuado.

A lei exige autorizacáo judicial em casos de ligadura de trompas e


vasectomia em menores de idade. Quem induz alguém a praticar a este-
rilizacáo, pode ser condenado a prisao de um a dois anos.

2. Que pensar?

A nova lei é condenada por razóes de ordem ética e ordem social.


2.1. A Ordem Ética

a) A mutilacáo do organismo humano é algo que fere a natureza e


suas Ieis incutidas pelo Criador. Ora toda intervencáo que contraria a
natureza, está sujeita a réplicas da própria natureza. É o que se dá com
os métodos artificiáis de contencáo da natalidade. É o que se dá também
com certas pessoas que, tendo sofrido a esterilizacao, se juigam menos
homens ou menos mulheres.

b) É de notar ainda que, em muitos casos, a esterilizagáo nao será


produzida por motivo de doenca do homem ou da mulher, mas por ra-
zoes de ordem hedonística: o(a) interessado(a) quer ter relacoes sexuais
e o prazer que proporcionam, sem correr o risco de prole. Ora tal inter
vencáo já nao é da aleada do médico, que jura cuidar da saúde e defen
der a vida; mutilar por motivos hedonísticos foge á órbita de trabalho do
médico; significa inverter ou perverter o papel da medicina.

c) A título de protelar ou evitar a esterilizacáo, a lei preconiza que se


instruam jovens e adultos a respeito dos meios artificiáis de contencáo
da natalidade. Isto vai, de um lado, prejudicar a saúde da populacáo, pois
crescerá o número de usuarios de tais recursos .(que fazem mal ao orga
nismo); de outro lado, vai incentivar, sob o falso pretexto de "sexo segu
ro", a prática livre do sexo, á qual estáo associadas a AIDS e as molesti
as sexualmente transmissíveis.

Eis algumas conseqüéncias daninhas da execucáo da lei pró-esteri-


lizacáo; concebida para o pretenso bem do povo brasileiro, parece desti
nada a Ihe causar maiores danos.

A medicina conhece meios naturais de contencáo da natalidade,


que sao plenamente éticos, entre os quais o método de Billings e o da
temperatura. Além de nao fazerem mal á saúde, apresentam a vantagem
de promover a uniáo e a solidariedade de marido e mulher, pois um tem
de ajudar o outro a cumprir o propósito firmado em comum pelo casal. Ao

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"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 426/1997

contrario, os meios artificiáis e a esterilizacáo geralmente pesam sobre


um dos dois cónjuges apenas, ficando o outro isento de qualquer daño -
o que muitas vezes redunda em machismo.

2.2. A Ordem Social: Envelhecimento da Populacáo

Precisamente na semana em que o Congresso Nacional aprovou a


nova lei, a revista VEJA publicou notável artigo intitulado "Desafios de
um país de cábelos brancos" (edicáo de 13/08/1997, pp. 34-36). Alias,
nao foi essa a primeira vez que a imprensa alertou para o envelhecimen
to da populacáo no Brasil; pode-se dizer que repetidamente o clamor tem
sido lancado.

O texto de VEJA fala de rápido envelhecimento da populacáo. E


apresenta dados estatísticos significativos, como sao os seguintes:

Em 1940, a populacáo do Brasil era de 41 milhóes; a maioria dos


cidadáos era jovem; os idosos, com mais de 65 anos, eram apenas 2%.

Em 1996, o total de habitantes do país era de 157 milhóes; caía a


natalidade e aumentava a expectativa de vida. Os jovens na base da
pirámide populacional diminuiram numéricamente.

Em 2020, prevé-se que haverá 207 milhóes de brasileiros, sempre


mais idosos do que jovens, a ponto que aqueles constituiráo 9% da po-
pulacao.

A populacáo do Brasil tem crescido menos. Assim, por exemplo,

Na década de 1940, crescia de 2,39%.

Na década de 1950, crescia de 2,99%.

Na década de 1960, crescia de 2,89%.

Na década de 1970, crescia de 2,48%.

Na década de 1980, crescia de 1,93%.

Na década de 1990, crescia, e cresce, de 1,38% (quase 1,0%).

«O Brasil de jovens precisa de escolas e de bons professores - o


de velhos necessita de mais hospitais, mais médicos, mais aposentado-
rías. A dificuldade é que, num país de cábelos brancos, há menos bra-
gos para pagar contribuigóes que alimentam a Previdencia e impostos
que pagam remedios nos hospitais. Quando o desemprego cresce e o
trabalho informal ganha corpo, como acontece hoje, a dificuldade só
pode agravarse. Quando, ao lado disso, nada se faz para melhorar a
Previdencia nem o sistema de saúde, a situagáo é preocupante.

488
LIBERADA A ESTERILIZAgÁO

Os números do IBGE sobre o novo perfil demográfico do país sao


enfáticos. Em 1980, quando se formava urna rodinha com 100 brasilei-
ros, o grupo dejovens e criangas era presenga dominante - 38 tinham de
14 anos para baixo. Em 1996, essa participagáo caiu para 32%. Em
compensagáo, o número de velhos nao para de aumentar, engordando
numa velocidade tres vezes mais rápida do que o conjunto da populagáo.
Os brasileiros com mais de 65 anos eram apenas 2,7% da populagáo em
1960. Tornaram-se 3,1% em 1970. Sao 5,4% hoje em día. Os técnicos
do Instituto calculam que em 2020 a participagáo dos idosos na popula
gáo será 60% maior do que hoje e a dosjovens, 30% menor. Outro fator
é o aumento da expectativa de vida ao nascer, que também nao para de
crescer - ganha-se um ano a mais a cada sete anos.

O envelhecimento da populagáo é um problema serio em qualquer


lugar do mundo - e aínda mais no Brasil, com o mecanismo deficiente
que alimenta o caixa do seu sistema previdenciário. O regime que sus
tenta o pgamento daspensóes e aposentadorias só fica empé enquanto
houverpessoas trabalhando e contribuindo com a Previdencia em núme
ro suficiente para cobrir os gastos do governo com o pessoal de pijama.
Essa relagáo está cada vez mais estreita no Brasil. No inicio da década
de 80, havia 2,8 trabalhadores no batente para cada aposentado na folha
da Previdencia. Na semana passada, com a divulgagáo dos resultados
do censo, descobriu-se que a coisa piorou: havia em 1996 apenas 1,9
contribuinte para cada ¡nativo. 'Do jeito que estamos indo, e levando em
conta as projegdes mais otimistas para o mercado de trabalho, em 2030
teremos 1,5 contribuinte por aposentado', calcula o pesquisador Francis
co Oliveira, do Instituto de Pesquisa Económica Aplicada, o Ipea» (VEJA
13/08/97, p. 34).

Como se compreende, a solucao da problemática da fome nao está


em esterilizar homens e mulheres no Brasil; esta medida acaba voltan-
do-se contra a vida e promovendo a cultura da morte, nociva para o país.
- Numa reflexáo serena, verifica-se que o Brasil é um país jovem, nao
plenamente povoado e dotado de grandes riquezas naturais nao explo
radas. Ele precisa nao de esterilizacáo, mas de juventude,... e juventude
preparada para assumir o futuro da nacáo e acabar de a construir, explo
rando o seu grande potencial. Em conseqüéncia, o problema número 1
do Brasil nao é o crescimento demográfico (que se tornou um título vazio
ou um tabú, como demonstram as estatísticas), mas é a educacáo. Faz-
se necessário dar formacáo humana, ética (e por que nao o dizer?...
religiosa) á juventude que deve surgir nos horizontes da patria, para que
ela, consciente de suas responsabilidades, possa trabalhar honestamente
em favor de um Brasil maior e melhor. Se se cerceia esta perspectiva,
condena-se o país ao desestímulo e ao envelhecimento. Tal é o caso de

489
10 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 426/1997

outros países, nos quais a natalidade mal cobre o número de óbitos. Na


Italia, por exemplo, o crescimento da populacáo chegou a 1%, o que é
alarmante, embora as conseqüéncias nao se facam sentir de ¡mediato.
Eis alguns dados da Italia:

De 1951 a 1961, a juventude passou de 18,8% a 17,3% sobre o


total da populacao. Em 1970, era 16%. Em 1981, 15,5% e em 1994
13,8%. O decréscimo está continuando... até onde? até quando?... com
que resultados?

Sao estas algumas reflexóes que mostram os aspectos negativos


de urna legislacáo que, á primeira vista, parece contribuir para resolver
um problema, mas na verdade vem agravar a situacáo geral do Brasil. O
médico e os agentes da saúde católicos devem ter direito á objecáo de
consciéncia, de modo que nao sejam sujeitos a cometer a iniqüidade
prevista pela lei.

Crescer em Comunháo com o Pai, 5 volumes, por varios autores.


-Ed. Vozes, Petrópolis 1996, 180x260mm.

Eis um manual de catequese destinado a idades sucessivas desde


a infancia até a adolescencia. Deve-se a urna equipe de professores do
Paraná. O texto é muito ilustrado, cheio de sugestóes para celebrar a
Palavra, além de numerosos gráficos e exercícios que facilitam a apren-
dizagem. Essa bela apresentagáo, porém, reveste um conteúdo que sur-
preende pela sua superficialidade de explanagoes; dir-se-ia que os au
tores quiseram evitar ser precisos, de modo a apresentar um Cristianis
mo vago, fácil, que nao incomode muito. Especialmente lacunosa é ai a
Moral católica: versa mais sobre a vida comunitaria e social do que sobre
a grande realidade da comunháo com as tres Pessoas da SSma. Trinda-
de e as expressóes da mesma na prática das virtudes teologais e mo
ráis; os capítulos sobre o pecado sao também muito distantes do concei-
to preciso de pecado. Quem aprende por tais livros, está insuficiente
mente catequizado e mal preparado para ser, como diz o Senhor Jesús,
sal da térra, luz do mundo e fermento da massa (cf. Mt 5, 13s; 13,33).
Em conseqüéncia de táo deficiente catequese, nao há como estranhar
que naja católicos ecléticos, mais levados pelas emocoes religiosas do
que pela luz da Verdade do Evangelho; váo procurar fora do Catolicismo
o que Ihes pode ser dado, com muito mais riqueza doutrinária, dentro do
Catolicismo.

490
Voz corajosa:

"EM NOME DA CIENCIA, PAREM..."

Em síntese: O biólogo francés Dr. Jacques Testard concedeu urna


entrevista em que chama a atengáo para os perigos que a pesquisa cien
tífica pode acarretar para a dignidade humana, se nao leva em conta os
limites que a Ética indica. O ser humano nao pode ser tratado como "coi-
sa"ou como materia da qualsó interessem as reagóes físico-químicas. A
manipulacáo genética, se, de um lado, pode beneficiara medicina, pode,
de outro lado, sacrificar o ser humano, fazendo-o joguete de interesses
espurios e degradantes.

As experiencias de Engenharia Genética tém-se multiplicado, pro


vocando comentarios, uns alvissareiros, outros sinistros. Há quem veja a
pessoa humana ameacada em sua dignidade singular, pois a reprodu-
cao humana é tratada como qualquer outro processo bioquímico, sem se
considerar o que nela há de específicamente humano.

A propósito o biólogo francés Dr. Jacques Testard concedeu signifi


cativa entrevista publicada na FOLHA DE SAO PAULO em 8/3/87 e que,
com o tempo, em vez de perder, só ganhou atualidade. É de notar que
Jacques Testard nao é contrario ao progresso da ciencia, pois tem prati-
cado a fecundacáo artificial; julga, porém, que a pesquisa científica tem
de reconhecer os limites que a Ética, salvaguardando a dignidade hu
mana, impóe ao estudioso. A ciencia sem consciéncia ética, em vez de
servir ao homem, se volta contra o homem. - Publicamos, a seguir, o
texto de Jacques Testard juntamente com a introducáo que o jornalista
Milton Blay redigiu para a FOLHA.

1. Introducáo

«Pela primeira vez um dentista especializado ñas técnicas da pro-


criagáo artificial proclama publicamente suas 'vivas inquietudes' face a
evolugáo de sua disciplina e propóe urna moratoria internacional. 'Eu
nao irei mais longe. Nao tentarei outras 'premieres'. Minha última proeza
foi o congelamento de embrides humanos.'

Quem langa o grito de alerta, é o professor francés Jacques Testan,


biólogo, pesquisador do Inserm, Instituto Especializado em Inseminagáo

491
12 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 426/1997

Artificial, membro da equipe do Hospital Antoine-Belcere, em Claman


(suburbio parisiense), e um dos melhores especialistas mundiais em fe-
cundagáo 'in vitro'.

Tratase de uma posicáo ultra-minoritáría deste ex-militante trotskista?


Ou, ao contrario, é o inicio de uma tomada de consciéncia frente á ame-
aga da manipulagáo das células sexuais e dos embrides humanos?

Desiludido, Jacques Testart respondeu á Folha em París: 'Tratase


de uma posigáo minoritaria no mundo científico. Outros continuaráo. Nao
porque sejam melhores, mas pela vontade de ver seus nomes nos ¡or
náis e aparecer na televisáo. Eu reivindico uma lógica da 'náo-descober-
ta', uma ética da 'nao-pesquisa'. Sei que será um 'suicidio profissional',
mas nao faz mal: chegou a hora de dizer em alto e bom tom que nao
existe pesquisa neutra e que só suas aplicagóes sao boas ou ruins. Este
postulado é mentiroso e perigoso. Se me demonstrarem que uma única
vez uma descoberta que correspondía a um desejo nao foi aplicada,
entáo recomegarei...'».

2. A Entrevista

«Folha - Cinco anos após o nascimento de Amandine, o primei-


ro bebé-proveta francés, fecundado 'in vitro' pela equipe do Hospi
tal de Clamart, o senhor anuncia no livro 'Oeuf Transparent' ('Ovo
Transparente', em portugués, da 'Éditions Flammarion') que 'vive
mos o momento da pausa da auto-iimitagáo do pesquisador'. Por
qué?

Jacques Testart - Se prosseguirmos, chegaremos rápidamente a


uma nova situacáo, que nada tem a ver com a primeira funcáo da fecun-
dacáo '¡n vitro1: responder a um diagnóstico e dar um filho a um casal
estéril. Amanhá veremos nascer o bebé 'prét-á-porter' e, dentro de alguns
anos, poderemos oferecer ovos 'á la carie', com sexo determinado, em confor-
midade com normas garantidas. Nossos filhos seráo escolhidos como ca
chorros no canil: cor do pelo, tamanho das patas, forma das orelhas.

Eu nao pretendo, por exemplo, cortar um ovo humano em dois,


retirar uma ou varias células de um óvulo fecundado para determinar
o sexo da enanca a nascer ou para fazer o diagnóstico de uma ano
malía genética.

Prefiro dedicar-me ao aperfeicoamento das técnicas existentes e a


desenvolver, nos animáis, os estudos sobre congelamento dos óvulos.

Folha - Qual é exatamente o perigo?

Testart - A perspectiva do bebé sob medida me inquieta. Uma equi-

492
"EM NOME DA CIENCIA, PAREM..." 13

pe científica multidisciplinar francesa anunciou recentemente a deseo-


berta de urna técnica de diagnóstico do sexo dos embrióes bovinos. É
um primeiro passo para a determinacáo futura do sexo do embriáo hu
mano.

No inicio, esta técnica será proposta como um progresso médico


para as doencas hereditarias ligadas ao sexo. Depois, as pessoas pas-
saráo a se interessar pela fecundacao 'in vitro1 para escolher o sexo dos
seus fiihos e os especialistas seráo tentados a 'fabricar' gémeos. Um dia
saberemos agir sobre o embriáo e assim substituir um gene por outro,
para corrigir tal ou tal malformacáo. Entáo, o termo 'fabricar bebés' per
derá as aspas.

Encontramo-nos diante de urna encruzilhada: seguir adiante signifi


ca satisfazer, a medio prazo, o sonho dos biólogos de fazer homens sob
medida, na mais perfeita lógica hitleriana.

A técnica nos oferecerá 'ovos á la carte'. E no cardápio biogenético


as propostas seráo infinitas: podemos imaginar a fecundacáo do óvulo
pelo óvulo (sem a presenca do espermatozoide), a auto-procriacáo femi-
nina (que permitirá á mulher ter um filho que será sua copia genética), a
gestacáo humana no ventre de um animal, e até, por que nao, a gravidez
masculina.

Folha - Existem na Franga e em outros países efue praticam a


fecundagáo 'in vitro' comités de Ética encarregados de estudareste
tipo de problema. Por que eles nao se manifestam?

Testart - Os comités de Ética, que nao tém poder legal, também se


sentem ultrapassados pelos avancos científicos. Por exemplo, eles aín
da nao se manifestaram sobre o congelamento de embrióes, que se tor-
nou corriqueiro. Quando urna mulher engravida, o que fazer com os em
brióes congelados? Na falta de resposta nos decidimos caso por caso,
de comum acordó com o casal.

Em setembro de 84, a equipe do Hospital Belcere publicou um mé


todo de micro-injecáo de espermatozoide no óvulo. O comité de Ética
respondeu negativamente, dizendo que era prematuro e pedindo novos
estudos em animáis. Resultado: hoje, na Franja, varias equipes aplicam
esta técnica, sem terem aguardado nossas conclusoes.

Assistimos atualmente a urna tal volúpia entre as equipes médicas


que ninguém respeita as regras éticas, ninguém tem tempo para perder
com reflexáo. Por isso proponho urna moratoria ¡mediata das experi
encias».

493
14 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 426/1997

3. Réplica e Tréplica

O Dr. Nelson Donadío, de Sao Paulo, discorda de Jacques Testard,


conforme a FOLHA DE SAO PAULO, número citado:

"Há duas semanas, nasceu o décimo bebé de proveta da Santa Casa


de Sao Paulo, instituicáo pioneira no Brasil na fecundacáo 'in vitro'. A
equipe responsável pelo setor de fecundacáo extra-corpórea da Santa
Casa é dirigida pelo médico Nelson Donadío, 51, diretor do Centro Bioló
gico de Reproducáo Humana da Santa Casa Santa Isabel de Sao Paulo,
e presidente da Sociedade Brasileira de Reproducáo Humana (SBRH).
Apesar de ser freqüentador assíduo do laboratorio em Clamart, e de uti
lizar um procedimento semelhante ao desenvolvido por Testart, Donadío
discorda do médico francés quanto á necessidade de interromper as pes
quisas no campo da fecundacáo extra-corpórea...

O médico brasileira concorda com Testart em que nao existe urna cien
cia neutra. Mas isto, segundo ele, nao é justificativa para interromper as
pesquisas. Senáo, diz o médico, as pesquisas com os átomos teriam de ser
interrompidas, devido ao risco de sua utilizacáo para fins militares. Para
Donadío, as pesquisas sobre fecundacáo extra-corpórea, ao lado de ajudar
a resolver problemas de casáis esteréis, podem auxiliar a desenvolver o
tratamento de doencas imunológicas, genéticas e do cáncer. O homem nao
é táo burro quanto Testart pensa. Santos Dumont suicidou-se porque viu os
avióes sendo utilizados para a guerra. No entanto, como transpor grandes
distancias a cávalo ou a burro?, indaga o médico brasileiro".

Seja observado: os resultados de qualquer pesquisa científica po


dem ser utilizados tanto para o bem como para o mal; nem por isto se pode
querer impedir o pesquisador de estudar; importa apenas controlar a apli-
cacáo dos frutos do seu trabalho na sociedade. No caso presente, o que se
discute, é o próprio objeto da pesquisa científica: urna coisa é o átomo e a
materia irracional (nada tem de transcendente); outra realidade é a materia
reprodutiva do ser humano, pois esta tem algo de transcendental ou possui
urna dignidade que proibe seja equiparada á materia infra-humana. Eis o
que invalida a argumentacáo do Dr. Nelson Donadío.

CARO(A) LEITOR(A), JÁ QUE SE APROXIMA O NATAL, POR QUE


NAO PENSAR EM OFERECER A SEUS AMIGOS UMA ASSINATURA
DE PR, QUE TORNE VOCÉ PRESENTE A CADA UM(A) DELE(A)S
TODOS OS MESES DE 1998? A NOSSA REVISTA PRETENDE SER
UM INFORMATIVO QUE AJUDE A PONDERAR OS PROBLEMAS DE
NOSSOS DÍAS. TODOS PRECISAMOS DE PENSAR PARA MAIS
AMAR O NOSSO IDEAL.

494
Excomunháo?

O CASO DE D. LEFÉBVRE ATUALMENTE

Em sfntese: O Arcebispo D. Marcel Lefébvre ordenou Bispos sem


autorizagáo da Santa Sé aos 30/6/1988, incorrendo, por isto, em
excomunháo. Esta pena atingiu outrossim o Bispo con-consagrante e os
Bispos consagrados. O movimento lefébvriano está sob a marca da
excomunháo, pois é um movimento cismático, que nao se atém as dispo-
sigóes da Santa Sé.
Quanto áspessoas individuáis, para que incorram em excomunháo,
duas condigóes se requerem: 1) adesáo íntima aos principios de D.
Lefébvre, em flagrante oposigáo ao magisterio de Joáo Paulo II; 2) mani-
festagáo patente dessa adesáo mediante participagáo em celebragóes
litúrgicas e outras atividades lefébvrianas.
* * *

O Sr. Bispo Mons. Norbert Brunner, da diocese de Sion (Suíca), ¡n-


terrogou a Santa Sé a respeito da situacáo jurídica daqueles fiéis que
aderem ao cisma provocado por Mons. Marcel Lefébvre. Por estar na
diocese de Sion a Fraternidade Sacerdotal Sao Pió X, com sede em Écone,
freqüentemente Ihe ocorre a pergunta, feita pelos fiéis, a propósito da
situacáo jurídica dos irmáos lefébvrianos.

A Santa Sé mandou estudar precisamente o caso em dois dos seus


órgáos competentes no assunto: a Congregacáo para a Doutrina da Fé e
o Pontificio Conselho para a Interpretacáo dos Textos Legislativos. A res-
posta foi entregue a Mons. Brunner em 31/10/1996 e publicada no Bole-
tim SNOP, da Conferencia dos Bispos da Franca, n91813, de 4/7/1997
p. 23.

A seguir, apresentaremos a súmula de tal resposta, visto que inte-


ressa também ao Brasil, onde existem núcleos de comunidades aderen-
tes ao cisma de Mons. Lefébvre.

Comecemos pelo paño de fundo.

1. Tres Perguntas

É notorio que aos 30/6/1988 D. Marcel Lefébvre, tendo D. Antonio


de Castro Mayer, entáo Bispo de Campos (FU), como con-consagrante,
sagrou alguns Bispos sem autorizacáo da Santa Sé ou mesmo em cons-

495
16 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 426/1997

ciente e flagrante desobediencia ao S. Padre Joáo Paulo II - o que é


considerado falta gravíssima pela Moral católica e pelo Direito Canónico.

Há quem sustente que tal gesto nao acarretou excomunháo para os


Bispos ordenantes e ordenados. Para tanto, apoiam-se em declarac.5es
de Cardeais e canonistas. Já que a situacáo se tornou confusa, Mons.
Brunner dirigiu-se á Santa Sé com tres perguntas:

1) Mons. Lefébvre, Mons. Castro Mayer e os Bispos que eles con-


sagraram, foram excomungados?

2) Os fiéis que pertencem á Fraternidade Sao Pió X e á sua obra


estáo excomungados?

3) A celebragáo da S. Missa segundo o rito Tridentino por parte de


Bispos e sacerdotes da Fraternidade é lícita? Como ficam os fiéis que
déla tomam parte?

Em síntese, eis as respostas da Santa Sé mediante os dois órgáos


atrás mencionados.

2. A Resposta da Santa Sé

Distinguiremos sete pontos:

1) Nao há dúvida, D. Lefébvre, D. Castro Mayer e os Bispos por eles


consagrados incorreram em excomunháo por efeito do canon 1382, que
assim reza:

"O Bispo que, sem mandato pontificio, confere a alguém a consa-


gragáo episcopal e, igualmente, quem dele recebe a consagragáo, incor-
rem em excomunháo latae sententiae, reservada a Sé Apostólica".

Isto quer dizer que o fato mesmo de um Bispo consagrar outro Bispo
sem autorizacao pontificia acarreta a excomunháo para ambos, sem ne-
cessidade de algum processo ou de sentenca condenatoria (latae
sententiae). Tal excomunháo só pode ser absolvida pela Santa Sé. É de
notar, porém, que logo a 19/7/1988 a Congregacáo para os Bispos decla-
rou explicitamente ter sido aplicado o canon 1382 no caso. Mais: aos 2/7/
1988 o Motu proprio Ecclesia De¡ de Joáo Paulo II fez a mesma obser-
vac.áo, acrescentando que tal ato litúrgico era a consumacáo de um cis
ma que vinha lentamente ocorrendo. O cisma, por sua vez, é delito ao
qual está anexa a excomunháo latae sententiae, conforme o canon 1364:

"O apóstata da fé, o herege e o cismático incorrem em excomunháo


latae sententiae, salva a prescrigáo do canon 194 § 1B n9 2".

Este canon 194 § 19 ns 2 reza:

496
O CASO DE D. LEFÉBVRE ATUALMENTE 17

Tica ipso iure destituido de oficios eclesiásticos quem tiver aban


donado publicamente a fé católica ou a comunháo com a Igreja".
2) Em conseqüéncia, o movimento lefébvriano deve ser considera
do cismático.

3) Quanto as pessoas que aderem a tal movimento, só incorrem em


excomunháo latae sententiae, caso se verifiquem as seguintes condi-
cóes:

a) a primeira condicao é de foro íntimo: tais pessoas compartilhem


livre e conscientemente o essencial do cisma, ou seja, o seguimento de
Mons. Lefébvre em formal desobediencia ao Sumo Pontífice e ao magis
terio da Igreja;

b) a segunda condicao é de natureza exterior ou visível: manifestem


sua opcáo cismática por atos visíveis; entre estes, se acha a participacáo
exclusiva ñas funcóes litúrgicas lefébvrianas, sem que tomem parte ñas
funcóes da Igreja Católica. - Note-se que nao incorre em excomunháo
quem participa das funcóes litúrgicas lefébvrianas sem aderir ao espirito
do cisma.

Observe-se, porém, que a participacáo nessas funcóes litúrgicas e


em outras atividades que carecem de comunháo total com a Igreja, cons
tituí motivo de escándalo e divisáo da comunidade eclesial. Por' isto é
condenável.

4) Os diáconos e presbíteros lefébvrianos dáo sinais de aderir ao


cisma nao só visivelmente, mas também intimamente. Por isto preen-
chem as duas condicóes ácima e estáo excomungados.
5) Quanto aos demais fiéis, nao estáo excomungados se apenas
participam ocasionalmente das funcóes lefébvrianas e de atividades do
respectivo movimento, sem professar doutrina e disciplina contrarias ao
magisterio da Igreja. Nem sempre será fácil averiguar a situacáo jurídica
de tais pessoas: cada caso há de ser considerado de per si. Como quer
que seja, é altamente desaconselhado participar de qualquer manifesta-
cao lefébvriana por causa dos perigos de escándalo e divisáo que isso
acarreta.

6) Os Bispos ordenados por D. Lefébvre foram validamente orde


nados.

7) Quanto aos padres ordenados por D. Lefébvre antes do cisma,


quando estava suspensus a divinis (sem uso de ordens), foram tam
bém validamente ordenados. Nao incorreram em excomunháo, mas, con
forme o canon 265, estáo acéfalos e impedidos de realizar qualquer fun-
497
18 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 426/1997

cao sacerdotal até que se incardinem legítimamente em alguma diocese.


Eis o teor do canon 265:

"É necessário que todo clérigo esteja incardinado em alguma Igreja


Particular ou Prelazia pessoal ou em algum Instituto de vida consagrada
ou sociedade que tenha essa faculdade, de modo que nao se admitem,
de forma alguma, clérigos acéfalos ou vagos".

Comenta o Pe. Jesús Hortal:

"Incardinacáo provém do latim in (em) e cardo (gonzo, dobradiga).


Canónicamente, é o ato mediante o qual, querpor disposigáo do Direito,
quer por determinagáo do Superior legítimo, um clérigo fica absoluta e
definitivamente incorporado a uma Igreja particular, a uma Prelazia pes
soal, a um Instituto de vida consagrada ou a uma Sociedade que tenha a
faculdade de incardinar clérigos" (Ver Código de Direito Canónico, Ed.
Loyola).

Estas ponderacóes manifestam o caráter complexo da situacáo dos


fiéis leigos que freqüentam alguma igreja lefébvriana ou com o cisma
simpatizam, mas nao pretendem aderir ao cisma. Fazem algo de iricoe-
rente e desaconselhado, pois isto pode gerar atitudes de infidelidade a
única Igreja que Cristo instituiu e entregou aos Apostólos, prometendo-
Ihes sua ¡nfalível assisténcia até o fim dos tempos (cf. Mt 28,18-20).

Cristo Total. Identificacáo de Jesús com sua Igreja, por Freí


Francisco Battistini. - Ed. Vozes, Petrópolis 1997, 130x210 mm, 285pp.

Frei Francisco Battistini é um benemérito carmelita, que se tem de


dicado a vida pastoral e a redagáo de obras catequéticas, tendo em vista
muitas vezes a apresentagáo da fé aos nao católicos. Reeditou o seu
livro "Cristo Total" após revisáo e atualizagáo do texto, que foi enriqueci
do por citagóes do Catecismo da Igreja Católica. A obra compreende
duas partes: a primeira é um ensaio simples de Cristologia, que muito se
detém sobre a credibilidade do misterio da Encarnagáo e propóe Jesús
como o Salvador por sua Palavra e seu sacrificio. A segunda Parte do
livro trata da Igreja, que o autor, muito acertadamente, apresenta como
inseparável de Jesús Cristo, pois é o Corpo de Cristo, nos dizeres de
Sao Paulo (Cl 1,24). Em linguagem acessível, Frei Battistini procura jus
tificar a fé na Igreja que Cristo fundou e entregou ao Apostólo Pedro
como sendo "a sua lgreja"(Mt 16,18); seja esta amada como a continua-
gáo da humanidade de Cristo, que foi dilacerda, mas era, e é, portadora
dos tesouros da Divindade (Cl 1,19). - O livro é muito oportuno neste
momento em que tanto se focaliza a Igreja nem sempre em seu verda-
deiro aspecto de Sacramento prolongado do Senhor Jesús.

498
No Setor Extraordinario:

OS ESTIGMAS: QUE SAO? POR QUE SAO?

Em síntese: Os estigmas sao chagas que alguns fiéis trazem em


seu corpo, configurándose a Cristo Crucificado. O fenómeno é comple
xo, pois envolve nao só nogóes de Teología e Mística, mas também fato-
res de Psicologia e Medicina; elementos religiosos e reagóes fisiológicas
se conjugam, tornando por vezes o diagnóstico difícil, já que o fenómeno
assume varias facetas. Como quer que seja, dos muitos casos de pesso-
as estigmatizadas que se conhecem, pode-se dizer que varios sao au
ténticamente sobrenaturais ou gragas extraordinarias concedidas pelo
Senhor Deus. Com efeito; vém a ser urna modalidade de participagáo na
Paixáo de Cristo decorrente de intensa devogáo a essa santa Paixáo;
témporfinalidade santificara pessoa estigmatizada pormais íntima uniáó
a Jesús Crucificado como também contribuir para a Redengao do mundo
no sentido das palavras de Sao Paulo em Cl 1,24: "Completo em minha
carneo que falta á Paixáo de Cristo em pro! do seu Corpo, que é a Igreja".
É certo que o fenómeno dos estigmas está associado á meditagáo
da Paixáo dolorosa, pois nao ocorre entre os cristáos orientáis, que mais
se devotam á contemplagao do Cristo que reina através do lenho da Cruz.
* * *

O fenómeno dos estigmas, tal como ocorre, por exemplo, em Frei


Pió de Pietralcina (muito conhecido no Brasil) e outros fiéis, suscita inter-
rogacoes: afinal que tipo de fenómeno é esse? Como se pode explicar?
Que sentido tem?

É a tais indagacóes que seráo dedicadas as páginas seguintes.


1. Estigmas: que sao?

A palavra estigma vem do grego stigma = picada dolorosa. Origina


riamente indicava a marca impressa no gado com ferro quente, em sinal
de apropriacáo por parte do boiadeiro. Passou a designar, em linguagem
crista, as chagas infligidas ao corpo de Nosso Senhor Jesús Cristo por
ocasiáo de sua Paixáo. E, por último, significa as feridas que pessoas
piedosas trazem em sua carne reproduzindo as chagas de Jesús.

Nao há noticia de pessoas estigmatizadas antes do século XIII. O pri-


meiro caso registrado é o de Sao Francisco de Assis, que, aos 14/9/1224,
recebeu em seu corpo os sinais da Paixáo de Jesús. Após esse Santo,
varios outros casos ocorreram na historia da Igreja até nossos dias.

499
20 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 426/1997

Também se observa que os cristáos protestantes apresentam pou-


quíssimos casos de estigmas, ao passo que os ortodoxos orientáis nao o
conhecem em absoluto. A razáo disto é que o fenómeno dos estigmas
está associado á contemplacáo da Paixáo dolorosa de Cristo, devocáo
esta que tomou grande incremento no Ocidente a partir do século XIII por
causa dos relatos dos cruzados e outros peregrinos que, voltando da
Térra Santa, narravam minucias da Paixáo do Senhor como as haviam
observado nos lugares sagrados.
Os estigmas vém a ser um fenómeno que a Psicología, a Medicina e
a Teología tém estudado intensamente, a fim de Ihe dar urna explicacáo
satisfatória, ou seja, sem ceder a um falso misticismo como também sem
cair no naturalismo racionalista. Na verdade, há varios casos de pessoas
estigmatizadas que nao podem ser elucidados todos da mesma maneira.
É o que passamos a verificar.
2. Como explicar?

Procurando sintetizar o que a pesquisa transmite aos estudiosos,


pode-se dizer o seguinte:

É inegável a influencia do psiquismo sobre o corpo humano. O medo


faz empalidecer, dilata as pupilas, provoca suor frió, gaguejar... A vergo-
nha faz enrubescer... Em certos casos ditos "crepusculares" (como os da
consciéncia adormecida, hipnose...) se as imagens se tornam mais vivas
e efetuam um processo psicoplástico: eczemas, dermografia (sinais ou
letras na pele), acné (erupcáo pustulenta resultante de inflamacao), pa-
ralisia de certas funcóes do organismo...

Alguns pesquisadores admitem que urna idéia muito viva e estimada


possa chegar a produzir sinais corpóreos. Assim a sugestáo incutida a
urna pessoa muito sensível pode redundar em marcas no corpo dessa
pessoa correspondentes ao objeto sugerido. Ver a propósito aínda o Apén
dice deste artigo, pp. 506s.

Na base destas verificacoes, pode-se afirmar que a contemplafao


da Paixáo do Senhor em grau muito intenso pode produzir lesoes na pele
do(a) contemplante, lesoes semelhantes áquelas que se encontram no
objeto contemplado. Em tal caso, os estigmas sao a expressáo do grau
de elevacáo do sentimento religioso da pessoa, e evidenciam a que ponto
pode chegar a forca psíquica do individuo. É esta a explicacáo que se dá
a casos de pessoas muito santas que apresentam estigmas: S. Francis
co de Assís, S. Catarina de Sena, S. Gema Galgani, Frei Pió de
Píetralcina... A santidade de vida desses fiéis excluí qualquer processo
fraudulento, qualquer tendencia a fazer teatralidade ou tragedia, provo
car compaixáo... O Senhor Deus concede a tais pessoas a graca de par-
ticíparem corporalmente da Paixáo de Cristo, atendendo assim a um an-

500
OS ESTIGMAS: QUE SAO? POR QUE SAO?

seio das mesmas, desejosas de se configurar ao Senhor Jesús; nessas


pessoas a graca de Deus serve-se da índole particularmente sensível de
sua personalidade para provocar os sinais da Paixáo de Cristo.

Todavía nem todos os casos de estigmas podem ser diagnosticados


com seguranca e clareza.

Há casos em que os estigmas aparecem juntamente com varios sín


tomas doentios e que parecem ter causa na configuracáo mórbida da
pessoa estigmatizada e nao na grapa de Deus. De modo especial salien-
ta-se a histeria; a pessoa histérica assume freqüentemente comporta-
mentos e estilo devida teatrais, exibicionistas, procurando chamar a aten-
cáo dos outros, impressionando-os ou cativando a sua simpatía ou a sua
compaixáo; daí a facilidade com que tais pessoas podem querer parecer
se com Jesús Cristo Crucificado por mitomania ou por um desejo doentio.
Em alguns casos o anseio psicológico da dramatizacáo ou de impressio-
nar os outros pode ter produzido a configuracáo corpórea correspon
dente, sem que se possa dizer que tais pessoas tenham sido especial
mente esquecidas pela grapa de Deus. Nao é necessário que essa
dramatizacáo histérica seja efeito consciente e premeditado da parte da
pessoa estigmatizada; o inconsciente pode levá-la a apresentar a confi
guracáo estigmatizada, de modo que nao se pode dizer que todos os
histéricos sao mentirosos e hipócritas.

Estas dados complexos relacionados com a Psicología e Fisiología


tornam polivalente o fenómeno dos estigmas. Cada caso há de ser con
siderado de per si. Haverá mesmo casos em que nao se poderá definir
com clareza a índole do fenómeno: seria realmente urna graca de Deus
ou resultaría únicamente da natureza mórbida da pessoa em foco? É de
crer que nao raro os dois fatores se conjugam entresi.

Em todo caso, porém, será sempre de grande valia a análise do


contexto em que ocorrem os estigmas como também a consideracao do
teor de vida ou do comportamento geral da pessoa estigmatizada. Se o
exercício das virtudes (amor a Deus e ao próximo, espirito de penitencia,
prática da oracáo) é notorio, pode-se crer que os estigmas sao a respos-
ta do Senhor Deus á piedade do(a) seu(sua) servo(a).

Ainda se deve notar que nem todas as chagas que aparecem no


corpo humano podem ser tidas como estigmas. Geralmente os estigmas
aparecem e desaparecem instantáneamente (podem aparecer, por exem-
plo, na noite de quinta para sexta-feira e desaparecer na noite seguinte,
devendo o mesmo fenómeno reaparecer na semana seguinte). Além dis
to, os estigmas nao sao acompanhados de supuracáo; sao persistentes,
apesar de todos os tratamentos e cuidados médicos que se Ihe dispensem.

Pergunta-se agora:

501
22 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 426/1997

3. Qual o significado religioso dos estigmas?

Antes do mais, é de notar o seguinte: na medida em que sao au


ténticos fenómenos sobrenaturais (questao que deve ser cuidadosamente
investigada), os estigmas nao sao essenciais a urna vida santa; a prática
das virtudes, mesmo em grau heroico, nao leva necessariamente á pro-
ducáo de estigmas.

Quando ocorrem e sao genuínos dons de Deus, revestem-se de


duplo significado:

1) Participacáo física da Paixáo de Cristo, correpondente a um


anseio da pessoa piedosa. O Senhor concede a fiéis que se devotam a
reconhecer seu Amor Crucificado, a grapa de trazer em seu corpo os
vestigios da Paixáo de Cristo.

2) Essa participacáo da Paixáo do Senhor tem efeito de santificacao


nao só em favor da pessoa estigmatizada, mas também em favor do
próximo, segundo diz Sao Paulo: "Completo em minha carne o que falta
á Paixáo de Cristo em favor do seu Corpo, que é a Igreja" (Cl 1,24). Na
verdade, ninguém pode acrescentar algum valor á Paixáo de Cristo infi
nitamente meritoria, mas todo cristao pode dar a essa Paixáo a moldura
própria da sua personaüdade, pode estendé-la ao seu respectivo "aquí
e agora" em favor dos irmáos ou numa atitude corredentora. Na Comu-
nháo dos Santos cada qual pode ser útil aos irmáos na medida em que
se configura a Cristo Redentor.

4. Casos Concretos

A guisa de complemento, váo apresentados alguns casos concretos


de estigmatizacáo, tidos como auténticos uns (nao, porém, artigos de fé),
duvidosos outros.

4.1. Casos tidos como auténticos

4.1.1. Sao Francisco de Assis (1181- 1226)

Aos 14 de setembro de 1224, festa da Exaltacáo da Santa Cruz,


enquanto rezava no eremitério do Monte Alverne, Francisco teve a visáo
de um Serafim, sobre o qual brilhava o Crucificado. Quando a imagem
desapareceu, Francisco sentiu "o coracáo arder de amor, enquanto na
sua carne estavam impressos os sinais da Paixáo do Senhor; aparece-
ram ñas suas máos e nos seus pés as marcas dos cravos: além disto,
trazia no costado urna fenda como se tivesse sido atingido por urna lanca;
a túnica e o calcáo do santo se achavam manchados de sangue. É Tomás
de Celano, o biógrafo mais famoso de Francisco, quem o narra (Vita I
Parte II, Cap. II, p. 93). S. Boaventura (t 1274) oferece relato semelhante
em Legenda Maior, cap. XIII, p.2. Testemunhas oculares confirmam o
fato, pois o puderam observar no cadáver do Santo.

502
OS ESTIGMAS: QUE SAO? POR QUE SAO? 23

Imediatamente após o falecimento de Francisco, Freí Elias escreveu


ao Provincial da Franca com grande alegría:

"Anuncio-vos urna grande alegría, ou mesmo um novo milagre. Des


de a origem do mundo, nunca se ouviu contar táo maravilhosa coisa, a
nao ser do Filho de Deus, que é Cristo nosso Deus. Com efeito; muito
antes da sua moríe, o nosso Pai e Irmáo apareceu crucificado, trazendo
. em seu corpo as cinco chagas, que sao realmente os estigmas de Cristo:
as suas máos e os seus pés tinham, por assim dizer, furos devidos a
pregos cravados na carne... ao passo que o seu costado parecía tersido
golpeado por urna langa, deixando as marcas de sangue" (S. Boaventura,
Legenda Maior Lectio tenia).

A noticia dos estigmas de S. Francisco é táo documentada por tés-


temunhas próximas ao fato que os críticos julgam nao os poder por em
dúvida. É, sim, possível discutir a configuracáo desses estigmas, pois os
relatos nem sempre concordam entre si. É razoável, pois, acreditar que
Francisco, ao contemplar assiduamente a Paixáo do Senhor, foi agracia
do com as chagas decorrentes dessa Santa Paixáo.

4.1.2. Santa Catarina de Sena (1347 - 1380)

Parece que nao teve estigmas visíveis, mas chagas internas.

A biografía de Catarina foi escrita por testemunhas fidedignas, como


por exemplo, o Bem-aventurado Raimundo de Cápua, confessor da San
ta e, posteriormente, Mestre Geral da Ordem Dominicana; verdade é que
a admiracáo de Raimundo por Catarina levou o biógrafo a certos exage-
ros, mas julga-se que, em substancia, o que ele refere é fidedigno.

Desde enanca, Catarina foi muito atraída por Jesús; retirava-se numa
gruta para rezar a sos durante horas. Fez-se Irma da Ordem Terceira de
S. Domingos, e teve visoes e éxtases que repercutiam sobre o seu corpo,
o qual se enrijecia e até levitava.

Recebeu estigmas internos, ou seja, as dores dos estigmas. Eis como


o Bem-aventurado Raimundo o descreve na qualidade de testemunha ocular:

Catarina estava na cápela de S. Sixtina em Pisa. Recebeu a S. Co-


munháo e, como relatam as pessoas presentes na cápela, ela estendeu
os bracos e as máos: ficou radiante de luz e caiu por térra, como se
tivesse sido mortalmente ferida. Pouco depois recuperou os sentidos.

Entáo, conta o Bem-aventurado Raimundo, ela chamou seu confes


sor, e em voz baixa Ihe disse: "Saiba, ó Pai, que pela misericordia de
Deus, trago no meü corpo os estigmas de Jesús. Vi o Senhor pregado á
Cruz: das cicatrizes de suas sacratíssimas chagas desceram cinco filetes
de sangue, dirigidos respectivamente ás máos, aos pés e ao coracáo.
Cíente do misterio, exclamei logo: 'Ah, Senhor meu Deus, eu Te peco que
nao aparecam essas cicatrizes na superficie do meu corpo'. Enquanto eu

503
24 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 426/1997

o dizia, antes que os filetes chegassem a mim, a sua cor de sangue se


transformou em cor refulgente, e, sob a forma de luz pura, chegavam aos
cinco pontos do meu corpo, isto é, as máos, aos pés e ao coracáo".

Perguntou-lhe entáo o Bem-aventurado Raimundo: "Nenhum filete


chegou ao lado direito?". Respondeu ela: "Nao, mas sim ao lado esquer-
do, ácima do meu coracáo - aquela luz que saia do lado direito de Jesús,
feriu-me diretamente". Continuou o Bem-aventurado Raimundo: "Sentes
dor nesses cinco pontos?". Ela, após profundo suspiro, respondeu: "É tal
a dor que sinto nesses cinco pontos, especialmente no coracáo, que, se
o Senhor nao fizer outro milagre, nao me parece possível que eu possa
subsistir, escapando da morte dentro de poucos días".

Após a morte de Catarina, o Pe. Prior do Convento da Minerva es-


creveu ao Bem-aventurado Raimundo para dizer-lhe que ele e muitas
outras testemunhas tinham visto as chagas no corpo da Santa por oca-
siáo das suas exequias. Além disto, no pé de Catarina que se conserva
em Veneza, se observa a marca das chagas: o mesmo se dá na máo da
Santa que é guardada no Convento de S. Sixto em Roma.
4.1.3. Santa Verónica Giuliana (1660 - 1727)

Era capuchinha. Foi canonizada por Gregorio XI. Desde crianca,


desejou imitar os mártires, que haviam sofrido por amor de Jesús.

Recebeu os estigmas aos 5 de abril de 1697, no decorrer de longo


éxtase. Essas chagas foram observadas pelo Bispo Mons. Eustachi, de Cittá
di Castello, com quatro outras testemunhas e, mais tarde, por diversas Irmas
Capuchinhas. O Pe. Tassinari, que acompanhou o Sr. Bispo, descreve:

"Mons. Eustachi observou e fez observar a todos nos as chagas das


máos de Irma Verónica; na parte superior destas, havia urna ferida gran
de como o calibre de um prego de tamanho medio ou do diámetro de um
pequeño quattrino florentino: em cima de cada chaga, havia urna tenue
crosta... Quanto á chaga do costado, á esquerda, seria urna ferida do
tamanho do dedo mindinho, larga no meio e pontiaguda ñas duas extre
midades" (Sumario do Processo de Canonizagáo, p. 212).
4.1.4. Santa Gema Galgani (1878 - 1903)

Desde menina, foi muito virtuosa: sofreu vicissitudes de familia. Ex-


perimentou disturbios psiconeuróticos, quando um jovem se enamorou
déla, e quis pedi-la em noivado. As tías com quem ela morava, considera-
vam essa perspectiva com bons olhos, porque o rapaz era serio. Gema,
porém, se recusava; sem saber como evitaría o passo, pedia a Deus que
a ajudasse. Adoeceu gravemente, ficando desengañada. Mas foi curada
imprevistamente após muitas oracóes.

Numa visáo apareceu-lhe Jesús Crucificado. Sentiu profundas do


res. Diz ela: "As chagas de Jesús ficaram gravadas na minha mente de

504
OS ESTIGMAS: QUE SAO? POR QUE SAO? 25

maneira táo viva que jamáis se apagaram". Após a S. Comunháo, certo


dia, recebeu promessa de um grande presente. Avisou o confessor. O
presente consistía nos estigmas, que se formaram nela enquanto con-
templava Jesús com as chagas abertas: destas procediam raios de fogo,
que atingiam os pontos correspondentes do corpo de Gema. Esses es
tigmas se abriam todas as semanas as 20 horas de quinta-feira e perma-
neciam abertos até as 15 horas de sexta-feira, derramando sangue. Uma
vez terminado o fluxo de sangue, as chagas comecavam a se enxugar e
fechar. No dia seguinte ou, ao mais tardar, no domingo, tudo estava fe
chado e, no lugar dos estigmas, se observava uma mancha branca.
4.1.5. Frei Pió de Pietralcina (1887 - 1968)

Foi capuchinho. Durante cinqüenta anos, trouxe os estigmas: alguns


desapareceram pouco antes da sua morte; outros, logo depois do seu
falecimento. - O caso tem sido estudado meticulosamente, pois é relati
vamente recente e sujeito a exames mais rigorosos do que os casos an
teriormente registrados.

Frei Pió era de saúde fraca, mas homem de grande bondade e virtu-
de; a todos inspirava simpatía e confianca; as vezes passava quinze ou
dezesseis horas por dia confessando e atendendo ao povo.

O primeiro especialista que examinou os estigmas de Frei Pío, foi o


Prof. Bignami. Deu ordem para que se enfaixassem as feridas na presen-
9a de duas testemunhas e se lacrasse a bandagem. Durante oito dias
sucessivos, todas as manhas eram trocadas as faixas. No oitavo dia, fo-
ram retiradas definitivamente as ataduras; o Pe. Pió celebrou entáo a S.
Missa, verificando-se entáo que de suas máos jorrava tanto sangue que as
testemunhas foram obrigadas a fornecer-lhe lencos para que as enxugas-
se. Alias, dia por dia, as chagas, ao serem descobertas, emitiam sangue.
O Dr. Andrea Cardone, médico da familia de Frei Pió desde 1910,
afirma que encontrou em ambas as máos do padre perfuracóes do diá
metro de 1,5 cm; atravessavam a palma da máo táo profundamente que
esta se tornava transparente para a luz.

Muitos médicos examinaram as chagas de Frei Pió, sem poder ave


riguar algum indicio de embuste, hipocrisia ou mentira. É o que leva a
crer que se trata de auténtico fenómeno suscitado pela graca de Deus.
4.2. Casos duvidosos e falsos

Sao muitos os casos de duvidosos e falsos estigmas. Relacionare


mos apenas tres deles.

4.2.1. Santa Clara de Montefalco (1268 - 1308)

Dizem que nao teve propriamente estigmas, mas trazia em seu cor
po os instrumentos da Paixáo do Senhor, encontrados ai em autopsia
depois da morte.

505
26 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 426/1997

No día após os funerais fez-se a autopsia e diz-se que no coracáo


da santa foram encontrados os cravos, a langa, o flagelo, um crucifixo de
carne e ñervos.... Tal resultado, porém, é contestado, pois a autopsia foi
realizada por urna Irma na presenca de outras Religiosas, que nada sabi-
am de anatomía.

Cré-se que interpretaram a estrutura interna do coracáo como se


fossem os instrumentos da Paixáo. Interpretado imaginosa, favorecida
pela fantasía e a afetividade.

4.2.2. Margarida de Cittá di Castello (1248 - 1291)


Algo de semelhante se relata a propósito desta Irma: objetos de pie-
dade e tres pérolas teráo sido encontrados em seu coracáo - o que
carece de documentacáo adequada.

4.2.3. Paulo Diebel

Em 1928 na cidade de Paris foi descoberto o senhor alemáo Paulo


Diebel.

Dizia que podía produzir á vontade lágrimas de sangue e estigmas.

Observado atentamente pelo Dr. Osty, foi desmascarado. O médico


virou as pálpebras de Diebel e verificou que estavam cheias de pontadas
de alfinete e, por isto, sangravam. Quanto aos estigmas, eram falsifica
dos com o sangue de Diebel retirado de urna chaga de suas pernas.

APÉNDICE
Dizíamos que o psíquico exerce influencia sobre o físico do indivi
duo humano. Com outras palavras: todo fato psíquico (um pensamento,
um desejo íntimo e oculto...) provoca um movimento do corpo humano. A
fim de mais o evidenciar, sejam, a seguir, citados mais alguns significati
vos exemplos:

1) Digamos que alguém quer atravessar um riacho passando por


urna passarela frágil ou um tronco de árvore. Se essa passarela tem
corrimáo, a pessoa passa fácilmente sem utilizar o corrimáo. Todavía, se
nao há corrimáo, a pessoa perde o equilibrio e cai nagua. Por que cai, se,
no primeiro caso, passou bem sem se servir do corrimáo? Eis a resposta: se
nao há corrimáo, a pessoa naturalmente senté inseguranca e concebe o
medo de cair nagua; ora esse medo (sentimento íntimo) repercute no
físico, provocando desequilibrio e a queda da pessoa. No caso de haver
corrimáo, o passageiro se senté mais garantido e seguro; ora esse sen
timento de garantía faz que tenha firmeza ñas pernas para nao cair nagua.

2) Tracemos um círculo sobre urna folha de papel, com urna grande


cruz no centro do círculo. Depois tomemos um fio a prumo ou um péndulo
e mantenhamo-lo suspenso sobre o círculo. Feito isto, fechemos os olhos
e ponhamo-nos a pensar no círculo, com a máo imóvel sustentando o

506
OS ESTIGMAS: QUE SAO? POR QUE SAO? 27

péndulo colocado sobre o círculo.... Dentro em pouco veremos que o


péndulo comecará a girar sobre o círculo, pois a ¡magem do círculo
entretida em nossa mente provocará o automatismo corpóreo ou a circu-
lacáo visível; a energía da mente se traduz dessa maneira perceptível. -
Algo de análogo ocorre se, em vez de pensar no círculo, pensamos na
cruz tragada dentro do círculo: o péndulo fará o movimento de cruz, por
que a imagem mental repercutirá no físico do individuo.

3) Urna pessoa histérica passeia de noite, de um lado para o outro,


em sua casa; tem urna vela acesa na máo. Ouviu dizer que nessa casa
há fantasmas noturnos, barulhos misteriosos e coisas semelhantes. Póe-
se entáo a pensar: "Se a vela se apagar, ficarei na escuridáo. Que medo
horrível!". E eis que, estranhamente, no mesmo instante, a pessoa apa
ga a vela. Como? Por qué? - Porque a imagem da vela que se apaga
passou da mente para a corporeidade dessa pessoa, provocando a rea-
lizacáo concreta do ato vislumbrado mentalmente.

Observam os estudiosos que tal fato nao ocorre com qualquer indi
viduo; supóe-se urna personalidade histérica ou, ao menos, alguém de
fantasía muíto viva e vibrante, dotada de fraco senso crítico.

4) Coloquemos urna pessoa no centro de um espelho cóncavo. A


certa distancia coloquemos outro individuo no centro de outro espelho
cóncavo. Este segundo individuo poderá sentir o que o primeiro pensa,
se as cordas vocais do primeiro estiverem exatamente no centro do es
pelho cóncavo. O fenómeno se explica pelo fato de que as cordas vocais
se movem, mesmo que imperceptivelmente, pronunciando as palavras
que a pessoa pensa. O som levíssimo assim emitido pela pessoa do pri
meiro espelho chega até o outro individuo porque os espeihos cóncavos
aumentam o volume do som.

Deve-se observar que estes fenómenos de automatismo ou de re-


flexo do psíquico sobre o físico explicam fatos aparentemente misterio
sos e, por isto, atribuidos a espíritos do além. Tal é o caso, entre outros,
da chamada "escrita automática" ou psicografia. - Eis o que se dá com o
psicógrafo: ele se sugestiona, consciente ou inconscientemente, no sen
tido de que está para receber o espirito de urna pessoa "desencarnada";
nao raro o psicógrafo conhece esse espirito "desencarnado" (pode ser
um grande escritor ou um grande vulto do passado...). No momento em
que o psicógrafo julga que está baixando o espirito com sua mensagem,
a máo do psicógrafo póe-se a escrever automáticamente, como se esti-
vesse sendo guiada pelo espirito do além... Escreve aquilo que o seu
inconsciente conhece a respeito do desencarnado; freqüentemente ele
toma conhecimento do "desencarnádo" lendo inconscientemente, no in
consciente de quem o consulta, as noticias que Ihe sao assim oferecidas.
A mensagem pode ser muito bela e confortadora, mas ela certamente
nao provém do além; ela sai do inconsciente do psicógrafo sugestionado.

507
Aínda no Plano do Extraordinario:

TRANSE E ÉXTASE: QUE SAO?

Em síntese: O éxtase é um estado de contemplagáo de Deus táo


intensa que as outras fungóes da alma humana se retraem ou atenuam.
A consciéncia se encontra em superconcentragáo, pois a verdade se Ihe
torna mais luminosa e o bem mais atraente do que de costume. A pessoa
extática fica imóvel, perde quase totalmente a sensibilidade, adquire uma
expressáo de felicidade e bem-estar. Nao pode o éxtase ser provocado;
é muitas vezes a consumagáo de uma vida ascética ou austera, empe-
nhada em mortificar as paixóes desregradas.
A santidade nao está necessariamente ligada a éxtases. Estes vém a
ser uma graga especial, um antegozo da bem-aventuranga celeste, que
nao pode ser descrito em linguagem humana (tí 2Cor 12,2-4; 1 Cor 2,9).
Quanto ao transe, é um estado psicológico de apagamento total ou
parcial do consciente, que dá lugar ao aparecimento de manifestagóes
próprías do inconsciente; é um procedimento humano, e nao uma graga
mística.
* * *

O transe é fenómeno assaz comum ñas sessóes espiritas e umban-


distas. O éxtase tem semelhanca com o transe e ocorre na Igreja Católi
ca. Daí a conveniencia de se caracterizar claramente um e outro fenóme
no para se evitar o sincretismo religioso. Comecaremos por examinar

1. O Transe

O transe é um estado psicofisiológico particular, semelhante ao sonó,


em que se tem um total ou parcial apagamento do consciente e o apare
cimento de manifestagóes próprias do inconsciente. O eletroencefalo-
grama, porém, continua tendo características próprias do estado de vigilia.
Distinguem-se transe mediúnico e transe hipnótico.

1) O transe mediúnico é induzido ou por auto-sugestáo (o médium


ou o Pai-de-Santo julga receber um espirito que o domina) ou por estí
mulos rítmicos monótonos (batuque, refráo de uma cantilena...), esgota-
mento físico, tensáo emotiva, estado de expectativa...

Com outras palavras: a auto-sugestáo é aquela sugestáo que o in


dividuo realiza sobre si mesmo. A pessoa eré em algo que nao existe ou eré
num objeto real ou num acontecimento real, atribuindo-lhe, porém, particu
laridades irreais ou ficticias. Essa crenca nao decorre de raciocinio; carece

508
TRANSE E ÉXTASE: QUE SAO? 29

de senso crítico; é freqüentemente acompanhada de dissociacáo da cons-


ciéncia, de modo que o individuo, privado de sua lucidez habitual, exerce
funcóes instintivas, automáticas,... que nao exerceria em caso de lucidez.

A auto-sugestáo ocorre com freqüéncia entre povos primitivos ou


em enancas, em pessoas mentalmente retardadas como também pode
acontecer em pessoas normáis e sadias como conseqüéncia de cansa-
50, fortes emocSes, depressao nervosa, distracóes...

O transe derivado de auto-sugestáo geralmente supóe concentra-


gao ou preparacáo psicológica mais ou menos Ionga. Ás vezes depende
de predisposicáo hereditaria.

2) O transe hipnótico é geralmente devido á sugestáo induzida


por um hipnotizador.

Tanto o transe mediúnico como o hipnótico tém efeitos comuns:

- quem volta do transe para a normalidade, nao se recorda do que


disse ou fez durante o transe; nao se lembra do que "o espirito Ihe inspi-
rou ou disse";

- o corpo em transe torna-se insensível;

- registra-se, durante o transe, aumento das pulsacóes (entre 70 e


120 ás vezes), diminuicao do ritmo respiratorio (pode chegar a 12 por
minuto), esfriamento das máos e dos pés;

- ao despertar do transe, a pessoa pode sentir náuseas e vertigem.


Experimenta cansaco.

Passemos agora á análise de

2. O Éxtase
2.1. Que é o Éxtase?
A palavra éxtase vem do grego ex-stasis = estar tora de si.

Significa, na linguagem teológica católica, o arrebatamento do espi


rito frente a algo de extraordinario, que Ihe absorve a atencáo. É a expe
riencia de estar em contato espiritual com um ser transcendente ou com
o próprio Deus.

O éxtase místico é caracterizado por imobilidade quase absoluta,


pelo enfraquecimentó ou pela perda total da sensibilidade, pela diminui-
cáo das funcóes vegetativas (respiracáo, circulacáo...), por urna expres-
sáo de profunda felicidade (fisionomía extática), por um sentimento de
bem-estar ou, raramente, por sentimento de dor. O éxtase pode ser acom-
panhado de arrebatamento ou levitacáo. Nao acarreta perda de memoria.

509
30 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 426/1997

Em poucas palavras, o éxtase místico consiste na intensificacáo de


urna determinada funcáo, com atenuacáo de outras funcóes: o amor a
Deus se torna táo intenso que o espirito Ihe aplica todo ou quase todo o
seu dinamismo e se retrai de outras funcóes. A consciéncia se encontra
num estado de superconcentracáo, pois a verdade se torna mais lumino
sa e o bem mais atraente do que de costume. Tal estado de alma impele
a pessoa ao exercício da caridade e da bondade.

O Papa Bento XIV (1740 -1758) se dedicou especialmente ao estu-


do dos fenómenos místicos ou resultantes de mais íntimo contato com
Deus. Deixou a famosa obra De Servorum Dei Beatificatione (Sobre a
Beatificado dos Servos de Deus), na qual estipula os seguintes sinais
para que se possa ter o éxtase como genuino fenómeno místico:

a) nao preceda nenhuma enfermidade nem alguma outra causa


meramente natural que o possa ter produzido;

b) nao se reproduza com periodicidade fixa;

c) nao ofusque nem obscureca o intelecto;

d) nao provoque o esquecimento de coisas passadas e, em particu


lar, das coisas ditas e ouvidas durante o éxtase. O esquecimento, no
caso, é tido como prova de éxtase nao auténtico.

Na verdade, pode haver um éxtase doentio, derivado de disturbios


afetivos, conflitos íntimos, frustracóes, abuso do álcool, emprego de dro
gas, epilepsia... É acompanhado de alucinacóes, delirios, fantasía (= so-
nho de olhos abertos)...

Em certos casos, principalmente quando se trata de pessoas religio


sas, mas psicópatas, torna-se difícil distinguir o éxtase auténtico do doentio.
O Dr. Janet descreve o seguinte fenómeno ocorrido com a Sra. Madeleine:

Madeleine colocava as máos juntas sobre o peito ou abría os bracos


como se estivesse crucificada ou se deixava ficar tranquilamente como
que adormecida. O importante é que ela nao reagia aos estímulos corri-
queiros; nao obedecía, nao respondía e nao se acordava quando provo
cada; nao somente estava enfraquecida em sua capacidade de replicar,
mas a perderá por completo. Apenas urna excecáo se registrava, a sa
ber: quando o médico Ihe dava ordens, todas as funcóes psicológicas
internas se avivavam e desenvolviam bem; depois que acordava ou mes-
mo quando se atenuava o éxtase, Madeleine ficava recolhida. Ela podia
narrar ou escrever tudo o que havia pensado e as alegrías que experi
mentara, como também o que acontecerá em torno déla... Certa vez o
médico tocou-lhe um dos dedos, pós-lhe um objeto na máo, disse-lhe
dois números e pediu-lhe que os somasse, murmurou-lhe no ouvido urna

510
TRANSE E ÉXTASE: QUE SAO?

sílaba sem significado. Quase sempre, ao despertar, ela contava ao Dr.


Janet o que ele Ihe havia dito.

Tal caso nao é de éxtase, mas de transe hipnótico, embora com


aparéncias religiosas, pois Madeleine obedecía automáticamente as or-
dens do médico, que fazia as vezes de hipnotizador.

Nao se pode excluir, porém, que pessoas neuróticas, mas sincera


mente piedosas, tenham auténticos éxtases místicos. Para distinguir e
caracterizar o éxtase no caso, é preciso levar em conta nao somente a
conduta geral do individuo extático, mas também, e principalmente, o
objeto que absorve tal pessoa e a poe em estado de concentracáo, como
também o comportamento da mesma após o éxtase.

2.2. Significado do Éxtase


Pergunta-se agora: Qual o valor e qual o significado do auténtico
éxtase místico?

- O éxtase místico nao é um fenómeno necessário nem mesmo nos


elevados graus de santidade. O extraordinario fica sendo sempre urna
excecáo. Como quer que seja, quando Deus permite o éxtase, permite a
exteriorizacáo do profundo amor da criatura ao Senhor; Este se revela
mais nítidamente á pessoa fiel, permitindo que ela se deixe absolver de
maneira mais radical pela contemplacáo da santidade e da perfeigáo di
vinas. Como se compreende, nao se trata da visáo de Deus face-a-face
(reservada para o céu), mas de um olhar da mente mais penetrante so
bre o Infinito de Deus. Quem é agraciado com tal olhar, nao consegue
descrever com precisáo o que viu durante o éxtase, pois a linguagem
humana é inadequada para relatara experiencia de Deus mais aprofundada.
Alguns Santos gozaram de tal privilegio contemplativo (assim Sao Paulo, S.
Agostinho, Sta. Catarina de Sena, a Bem-aventurada Ángela de Foligno...);
referiram-se a tal graca, afirmando que nao Ihes era possívei exprimir o que
haviam experimentado naqueles momentos extáticos ou momentos de ultra-
passamento do humano para usufruir, mais de perto, da presenca de Deus.

Sao Paulo, por exemplo, afirma que foi elevado místicamente até "o
terceiro céu" (2Cor 12,2-4) e se refere aos tragos característicos desse
enlevo: aparente separacáo de corpo e alma', arrebatamento ao paraí-

1 Efe o texto paulino:


"Mencionare! as visdes e revelacóes do Senhor. Conhego um homem em Cristo
que, há quatorze anos, foi arrebatado ao terceiro céu - se em seu corpo, nao sei; se
tora do corpo, nao sei; Deus o sabe! E sei que esse homem - se no corpo ou fora do
corpo, nao sei; Deus o sabe! - foi arrebatado até o paraíso e ouviu palavras inefáveis,
que nao é lícito ao homem repetir".
É de notar que a alma nao se pode separar do corpo sem que este morra, pois a alma
é o principio vital sem o qual o corpo nao tem vida. A alma nao vagueia fora do corpo.

511
32 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 426/1997

so, palavras ¡ndizíveis ou irrepetíveis, mas frisa bem que só na outra


vida será dado ao homem gozar daquilo que os olhos jamáis viram e os
ouvidos jamáis ouviram (cf. 1 Cor 2,9).

S. Agostinho (t 430), por sua vez, relata o "éxtase de Ostia", que


Ihe foi dado experimentar juntamente com sua máe Santa Ménica pouco
antes que esta falecesse. O texto é um tanto longo, mas altamente signi
ficativo:

«Pouco antes de morrer - nao sabíamos entáo que a sua morte


fosse ¡mínente -, encontrávamo-nos os dois a sos, apoiados numajane-
la que dava para um jardim interior da casa onde morávamos. Era em
Ostia. Agora que pensó nisso, vejo nesse encontró a máo de Deus. Ali
estávamos, longe das pessoas, ela e eu, depois de urna viagem longa e
fatigante, repondo as forgas para iniciar a travessia para a África.
Comegamos a conversar tranquilamente, esquecendo-nos das coi
sas passadas e pensando somente no porvir. Perguntávamo-nos como
seria a vida eterna dos santos, da qual o Apostólo diz que nem olho
algum viu, nem ouvido algum ouviu, nem passou pelo coragáo do homem
o que será. Voltávamos o nosso coragáo para a ¡mensa catarata da fon-
te da vida que está em Deus, para que, inundados pela sua agua, pu-
déssemos entender alguma coisa de urna realidade táo grande. Conclu
ímos que o maiorprazer dos sentidos nao pode nem merece ser compa
rado com o que deve ser a felicidade eterna.

Cada vez mais entusiasmados, percorremos gradualmente todos os


seres criados, até ascendermos ao céu, donde o sol e a lúa enviam os
seus raios á térra. E aínda nos elevamos mais: talando das obras de Deus
e admirando-as, chegamos até as nossas próprias almas; passamos além,
e continuamos a subir, até chegarmos a essa regiáo da abundancia sem
fim, onde Deus apascenta eternamente Israel com opastio da sua Verdade.
Ali a vida é essa Sabedoria pela qual todas as coisas sao, tanto as que
foram como as que serio; sem que ela própria se faga a si mesma, pois é
como sempre foi e sempre será; é até melhor dizer que nela nao há foi nem
será, mas somente é; porque é eterna, e foi e será nao sao eternos.

Enquanto assim falávamos e suspirávamos pela Sabedoria, quase


chegamos a alcangá-la, num ímpeto do nosso coragáo. Mas logo depois,
melancólicamente, deixamos esses dons do Espirito e voltamos ao váo
ruido das palavras de cada día -palavras que comegam e que terminam,
e que em nada se assemelham á Palavra de Deus, Senhor nosso, que é
em si mesmo, que nunca envelhece, antes rejuvenesce todas as coisas.

Dizíamos: suponhamos que haja alguém em quem emudega o dése-


jo da carne, bem como as muitas fantasías e imagens da térra, da agua e

512
TRANSE E ÉXTASE: QUE SAO? 33

do ar; em quem se calem os céus, e a própria alma silencie e suba para


além de si mesma, esquecida de si; em quem emudegam os sonhos e as
invengdes da imaginagáo; em quem, por último, se calem completamente
todas as vozes, todos os gestos, tudo o que, para suceder, precisa do
tempo - pois todas essas coisas dizem a quem as escuta: 'Nao nos fize-
mos a nos mesmas, fez-nos Aquele que permanece eternamente'.

Se, depois de tudo isto, todas as coisas se calassem e escutassem


Aquele que as fez, e só Ele falasse - nao através délas, mas diretamen-
te, de modo que a sua palavra fosse pronunciada, nao através de vozes
humanas, nem de anjos, nem de tronos, nem de enigmas que é preciso
interpretar, mas por Ele próprio... Se, como agora, espiritualmente eleva
dos e com o pensamento posto na Sabedoria eterna, esta contemplagáo
perdurasse, e cessassem todas as visóes que nao se referissem a Deus,
e somente a dEle nos atraísse, absorvesse e abismasse na alegría mais
íntima, de maneira que a vida fosse sempre como esse momento de visáo
total pelo qual suspiramos: nao seria isto aquele entra no gozo do teu
Senhor?

Falamos de tudo isso, embora nao com estas palavras nem do mes-
mo modo. E á medida que falávamos, todas as coisas deste mundo nos
pareciam sem importancia. E minha máe disse-me entáo:

- 'Quanto a mim, meu filho, já nao desejo nada desta vida. Nád te-
nho nada a fazeraqui, nem seipara que continuo vivendo;já nao espero
nada deste mundo. Havia urna coisa pela qual desejava viver um pouco
mais, e era ver-te cristáo e católico antes de morrer. Deus já mo conce-
deu, mais do que esperava, poisjá te vejo afastado das pobres satisfagdes
mundanas e servindo a Deus. Que fago aquiainda?'» (Confissdes I. IX).

Observe-se ainda que, conforme os místicos, o éxtase sobrevém


sem que o individuo o espere e tente provocar. Pode ser de breve dura-
cáo, como também pode durar um pouco mais; como quer que seja, é
sempre algo de passageiro. É o termo consumado a que pode levar urna
vida de ascese e purificacáo; o asceta é alguém que escolhe deliberada
mente um género de vida austera, apto a dominar e amortecer as pai-
xóes desregradas mediante o exercício de vontade enérgica sustentada
pela graca de Deus.

Em suma, o éxtase é urna graca especial, que nao caracteriza ne-


cessariamente a santidade. O que define esta última, é o ardente amor a
Deus, que leva á contemplagáo e á experiencia do Senhor, sem que tal
estado íntimo se traduza obrigatoriamente em efeitos corporais.

513
Que será?

"OUQO VOZES DO ALÉM QUE ME ATORMENTAN!..."

Em síntese: Os demonios e espirites desencamados nao tém cor-


po nem boca para falar; por conseguinte as vozes aterradoras nao vém
da parte deles, como julgam muitas pessoas angustiadas, e tanto mais
angustiadas quanto mais procuram afastar os "espíritos maus". O demo
nio existe, sim, mas nao é o autor de todos os fenómenos extraordinarios
que ocorrem ao homem. As vozes atribuidas aos demonios e maus espí
ritus sao portanto fenómenos meramente subjetivos ou alucinagóes.

Alucinagáo é a percepgáo do que nao existe; é urna falsa percep-


gáo. Está associada ao estado de ánimo do individuo ou ao consumo de
drogas. O cansago, o tedio, a exaustáo física e psíquica podem produzir
alucinagóes visuais, auditivas, olfativas, gustativas e tácteis, de acordó
com as preocupagóes ou aspiragóes do individuo. Há alucinagóes cons
cientes e outras semiconscientes. A pessoa que nao tem nogáo de estar
vendo o irreal, já se acha predisposta a um estado patológico.

Há pessoas que dizem ouvir vozes do além, que as atormentam.


Julgam tratar-se de demonios ou de espíritos desencarnados que ¡nfes-
tam a vida dos mortais na térra. E pedem socorro! Mandaram celebrar
Missas, fizeram novenas, trezenas... para se livrarde tais agressóes, mas
nada conseguiram; ao contrario, quanto mais rezaram, tanto mais se sen-
tem perseguidas. Daí a pergunta: que será? Como explicar o fato?

Proporemos ao quesito urna resposta negativa, á qual se seguirá


outra, de índole positiva.

1. A Resposta Negativa

As vozes que atormentam, nao podem provir de espíritos desen


carnados nem de demonios, pois estes nao tém corpo nem boca para
falar: nao podem articular sons. Tais vozes, como diremos a seguir, sao
projecoes subjetivas do inconsciente da pessoa "ouvinte"; nada tém de
transubjetivo. - Se, porém, a pessoa eré que se trata de maus espíritos e
pede a Deus que a livre dos mesmos, ela se estará mais e mais persua-
dindo de que é infestada por maus espíritos e estará mais sujeita a pro-
jetar ou imaginar tais vozes a Ihe falar. O que tal pessoa deve pedir a
Deus, é paz, saúde, bom ánimo, nao, porém, a expulsáo de espíritos
maus (que nao sao a causa do fenómeno).

514
"OUgO VOZES DO ALÉM QUE ME ATORMENTAM..." 35

Verdade é que na vida de Santa Joana d'Arc e de outros Santos se


diz que ouviram vozes do além. Notemos, porém: eram vozes
recontó dadoras e amigas, nao hostis. Deus pode, em casos muito espe
ciáis, permitir que alguém faga a experiencia subjetiva de vozes frater-
nais, a fim de estimular e levar a pessoa em foco á prática do bem. Isto,
porém, é raro. O fenómeno há de ser cuidadosamente examinado, para
que nao se confunda expressáo do psiquismo humano com intervencáo
do além.

Positivamente talando, o caso analisado é o de alucinacáo auditiva.


Vejamos, pois, o que se entende por alucinacáo.

2. Alucinacáo: que é?

2.1. Significado e modalidades

Alucinacáo é urna percepcáo sem objeto ou meramente subjetiva.


É urna falsa percepcáo ou aínda é urna projegáo da fantasía, que repre
senta como existente o que nao existe.

A pessoa alucinada pode estar fortemente convencida de que está


realmente percebendo como existente o que nao existe, ou o que é ape
nas fruto da sua imaginacáo.

Se a alucinacáo desenvolve um enredo prolongado, chama-se deli


rio.

Todos os sentidos podem ser sujeitos de alucinacáo: existem aluci-


nacoes visuais, auditivas, olfativas, gustativas e tácteis... As alucinacóes
podem ser simples, como rumores, assovios, vozes aterradoras ou
consoladoras, toque de sirene, barulho de carros que passam, de gente
que desfila...

O conteúdo das alucinacóes depende muito do estado de ánimo do


individuo, ou seja, liga-se as idéias, aos desejos, as preocupacóes da
pessoa alucinada; por isto tanto podem servir para o reconforto como
para o apavoramento.

Quando a alucinacáo é provocada por substancias tóxicas, é possí-


vel identificar o tóxico através do tipo de alucinacáo, pois o álcool, a co
caína, a morfina, a mescalina produzem imagens específicas, que reve-
lam o tipo do tóxico originante.

Eis um exemplo de alucinacáo provocada pelo opio:

Um fumante de opio imaginou estar dormindo; de repente ter-se-á


acordado. Apalpando em torno de si na escuridáo da noite, sentiu algo
de frío e duro: era um cadáver. Sem se amedrantar, tomou o morto em

515
36 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 426/1997

seus bracos e o levou para o quarto vizinho; fechou a porta, trancou-a á


chave e voltou a deitar-se em sua cama. Mal havia adormecido, ouviu um
rumor que o despertou. A porta se abriu e o cadáver tornou a entrar no
quarto, cambaleando como se por tras da carne Ihe faltasse a ossatura.
Dirigiu-se para a cama do parceiro deitado e, sem dizer palavra, se esten-
deu com todo o seu peso sobre o infeliz vidente: este sentiu passar pelo
seu rosto a barba e os cábelos do morto como também o seu hálito cadavé
rico. Ver F. Salis-Seewis, Visioni e allucinazioni. Preto 18922, p. 111.

Este é um exemplo de alucinacáo visual e táctil.

2.2. Alucinacoes conscientes e inconscientes

Nao é raro que a pessoa alucinada se torne consciente da inconsis


tencia de sua percepcáo ou, ao menos, duvide daquilo que ela percebe.

Silvio Pellico (1789 - 1854) foi um patriota italiano que passou dez
anos (1820 - 1830) num cárcere da fortaleza austríaca de Spielberg;
sofreu horrivelmente, como ele mesmo descreve na obra Le Míe Prigioni
(1832). Desgastado pelo cansaco e o tedio, teve também alucinacoes
conscientes, que relata nos seguintes termos:

"Parecia-me, embora estivesse acordado, que ora ouvia gemidos no


meu cárcere, ora ouvia risadas contidas. Desde a infancia, nunca acredi-
tei em bruxas e duendes, mas na prisáo aqueles gemidos e aquetas risa
das me apavoravam; eu nao sabia como os explicar, de modo que eu era
levado a perguntar se nao estava sendo infestado por potencias malig
nas desconhecidas. Muitas vezes acendi, tremendo, a lamparina e gritei
indagando se nao havia alguém debaixo da cama a cagoar de mim.

Sentado a mesa de leitura, parecia-me que alguém me estava pu-


xando pela roupa ou que estavam empuñando um livro de modo a fazé-
lo cair no chao ou aínda parecia-me que um individuo atrás de mim esta
va soprando no fogo da lamparina para apagá-lo. Entáo eu me levantava
e pulava, olhava em torno de mim, circulava desconfiado pelo recinto e
perguntava a mim mesmo se eu tinha enlouquecido ou se estava com a
mente lúcida" (Le Míe Prigioni, Torino SEI 1943, pp. 132s).

É de notar que Silvio Pellico nao estava adormecido no caso, mas


em vigilia sofría veemente alucinacáo devida ao desgaste físico e psíquico.

Interessantes sao também as alucinacóes de espelho, que po-


dem ser reconhecidas como tais pelos videntes. Em tal caso, o alucinado
vé a si mesmo como se fosse outra pessoa. Alias, já o filósofo Aristóteles
(t 322 a.C.) referia o episodio de um homem que, ao sair a passeio, via
diante de si a sua própria imagem. Eis dois outros episodios dignos de
nota:

516
"OUgO VOZES DO ALÉM QUE ME ATORMENTAM..." 37

O poeta alemáo Johann Wolfgang von Goethe (1749 - 1832) refere


que, enquanto certa vez andava a cávalo levando na cabeca tristes pen-
samentos, teve a visáo de outro cavaleiro que Ihe vinha ao encontró e,
coisa ¡mpossível, aquele estranho era ele mesmo. Entáo Goethe sacudiu
a cabeca para dissipartal imagem, mas ¡mediatamente viu que essa mesma
imagem, em vez de desaparecer, se Ihe aproximava mais aínda. - Ao
contar o fato mais tarde, Goethe reconheceu que nao se tratava de algo
posto tora dele, visto pelos olhos do seu corpo, mas sim de urna imagem
mental; cf. Aus meinem Leben. Dichtung und Wahrheit, 1808.

Coisa semelhante aconteceu a Guy de Maupassant (1850 - 1893),


romancista francés. Era genial, mas tinha momentos de patología mental.
Um día, quando se achava sentado á mesa de trabalho, num quarto si
lencioso em que nao havia pessoa estranha, Maupassant ouviu a porta
abrir-se e virou-se para ela angustiado. Qual nao foi a sua surpresa ao
ver a copia dele mesmo! Esse personagem sentou-se diante de
Maupassant e Ihe ditou, a quanto parece, tudo o que ele devia dizer. Cf.
A. Munthe, citado por J. Lhermitte, Les hallucinations. Clinique et
Physio-pathologie, 1951.

Aínda outros episodios desse tipo se encontram na literatura res


pectiva.

Verdade é que muitas vezes as pessoas alucinadas nao se dáo con-


ta ¡mediatamente da inconsistencia de suas percepcóes; difícilmente acre-
ditam em quem Ihes chama a atencáo para as conclusóes da moderna
ciencia parapsicológica. Associando idéias, fazemos agora mencáo de

2.3. Alucinagóes coletivas

Em períodos de intenso sofrimento ou de exaltacáo de ánimos em


grupos fanáticos, podem ocorrer alucinacoes coletivas ou epidemias
alucinatórias. Exemplo típico é o seguinte:

Certa vez, numa nave inglesa um marujo viu urna prancha de madei-
ra flutuar sobre as aguas do mar. Imaginou logo que fosse o fantasma de
um companheiro morto e jogado ao mar havia poucos dias. Pós-se entáo
a descrever com vivacidade o que vira, de modo que os colegas de tripu-
lacáo acudiram para ver o fantasma descrito. Eis, porém, que, quando se
aproximaran! da tábua flutuante, perderam qualquer ilusáo a respeito,
pois perceberam que nada de extraordinario havia ai.

Pode-se crer que na Idade Media, quando os homens viam bruxas


ou "mulheres infestadas pelo demonio", havia alucinacáo coletiva.

Após a segunda guerra mundial (1939 - 1945), violenta como foi,


deíxando enormes estragos materiais e moráis, foram freqüentes os ca-

517
38 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 426/1997

sos de alucinacáo coletiva. As pessoas traumatizadas viam coisas


alvissareiras, que respondiam aos seus anseios; melhor dizendo:... pro-
jetavam, como se estivessem vendo, mensagens de consolo e reconstru-
cáo... Tornou-se famoso o caso de Marta de Bolsena (Italia), que dizia ter
visóes de Nossa Senhora em determinada gruta; as suas narrativas en-
contraram crédito em cerca de trinta pessoas, que julgavam, também
elas, ter visóes e, quando o imaginavam, entravam em éxtase: esse éxta-
se podía ocorrer quando caminhavam pelas estradas; entáo ¡am, como
se fossem sonámbulas, para a gruta das aparicóes. O seu semblante
ficava tenso, apavorado; nao pronunciavam frases completas, mas ex-
clamacóes. Agitavam-se violentamente, batendo com o rosto por térra,
sacudiam os bracos emitiam sons estranhos.... O fenómeno foi observa
do por psicólogos e profissionais especializados, que chegaram á sus-
peita de que os fatos eram, ao menos em parte, dirigidos e comandados
como peca teatral. Como quer que seja, a sugestáo ou a persuasáo sub
jetiva de que havia aparicóes era capaz de provocar toda urna encena-
cáo e profundos transtornos psicológicos ñas pessoas afetadas.

Estas observacóes estáo longe de significar que todas as narrativas


de aparicáo sejam falsas; apenas contribuem para recomendar cautela e
prudencia diante de casos portentosos.

Os especialistas, em seu diagnóstico e sua experiencia, acreditam


que as alucinacoes permanentes e resistentes a qualquer terapia ou
psicoterapia sao síntomas de estado mental doentio. Com efeito; as pes
soas sadias, cedo ou tarde, se dáo conta do caráter subjetivo das suas
alucinares. Quem nao se torna consciente disto, vive num estado de
delirio continuo e anormal. A causa desse estado pode ser urna doenca
nervosa, como a histeria, a epilepsia, a encefalite crónica, o uso de dro
gas e o recurso a narcóticos.

Também se observa que as alucinares provém muitas vezes de


forte sugestionamento ou de grande expectativa, que deixa os ánimos
excitados; essa expectativa gera a imagem ou o som que a pessoa espe
ra. Urna pessoa alucinada pode contagiar outras, dando origem a aluci
nacáo coletiva.

Estes dados de psicología e parapsicología sao úteis para a explica-


cáo dos fenómenos espiritas de materizalizacáo dos espíritos, aparicóes
de defuntos, visáo extracorpórea (alma "que sai do corpo" e tudo vé " lá
de cima"), etc.

518
Colegio Fundamentalista:

"CHAMADA DA MEIA-NOITE'

Em síntese: A córtente "Chamada da Meia-Noite" é de índole pro


testante, desligada de qualquer denominacáo do protestantismo. Pode
ser definida como "fundamentalista", isto é, como intérprete literal do tex
to bíblico, rejeitando os subsidios verídicos que a ciencia contemporánea
oferece para mais profunda compreensáo do texto sagrado. Conseqüen-
temente fenómenos extraordinarios (como os OVNIs) e os desvíos doutri-
nários (seitas e correntes tidas como heterodoxas) sao atribuidos aos
anjos maus ou demonios. Esta mentalidade se traduz numa colecáo de
livros intitulados "Os Fatos sobre..." da autoría de John Ankerberg e John
Weldon, que tratam de criagáo e evolugáo, OVNIs, Anjos, Espíritos-Gui-
as, Nova Era, Jesús o Messias, Movimento da Fé... livros dos quais as
páginas seguintes comentam os tópicos principáis.

Existe urna corrente protestante intitulada "Chamada da Meia-Noi


te", desligada de qualquer outra corrente do protestantismo, que se iden
tifica nos seguintes termos:

" 'Mas, á meia-noite, ouviu-se um grito: Eis o noivo! Sai ao


seu encontró' (Mt 25,6).

A 'Obra Missionária Chamada da Meia-Noite' é urna missáo sem fins


lucrativos, que eré em toda a Biblia como infalível e eterna Palavra de
Deus (2 Pe 1,21). Sua tarefa é alcangar todo o mundo com a mensagem
de salvacáo em Jesús Cristo e aprofundar os crístáos no conhecimento
da Palavra de Deus, preparando-os para a volta do Senhor».

Essa Sociedade publicou sete livros que exprimem o pensamento


fundamentalista respectivo: a Biblia é interpretada ao pé da letra em qual
quer de suas páginas, sem consideracáo dos géneros literarios que a
compóem. A presenca do demonio é denunciada em diversos fenóme
nos da vida contemporánea, de modo que o leitor se pode sentir pressi-
onado pelos anjos maus nao somente quando se Ihe fala de ecología,
discos voadores, evolucáo das especies..., mas também quando se faz
urna pregacáo bíblica nao condizente com as interpretares fundamen-
talistas da "Chamada da Meia-Noite".

Ñas páginas subseqüentes passaremos em revista os principáis tó


picos da colecáo "Chamada da Meia-Noite", que tem por autores John
Ankerberg e John Weldon. - A respeito de Fundamentalismo, ver PR

519
40 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 426/1997

421/1997, pp. 276-283. O presente artigo oferece espécimens concre


tos dessa corre nte.

1. Os Discos Voadores

1. Para os dois autores em pauta, o fenómeno dos discos voadores


é inegável. Citam numerosos testemunhos da existencia dessa realidade
misteriosa. Tais testemunhos permitem classificar os tatos em sete cate
gorías de crescente densidade:

VD (VisÓes Distantes): observacáo de luzes estranhas no céu;

Cl-I (Contatos Imediatos de 19 Grau): visáo de um disco voador (OVNI,


Objeto Voador Nao Identificado) com ou sem tripulantes a 150 m mais ou
menos;

Cl-ll (Contatos Imediatos de 29 Grau): os OVNIs deixam efeitos físi


cos no ambiente (marcas de aterrissagem, galhos quebrados...);

CI-III (Contatos Imediatos de 3g Grau): os OVNIs aparecem com tri


pulantes bem próximos ou mesmo em térra;

CI-IV (Contatos Imediatos de 4S Grau): os tripulantes dos OVNIs pra-


ticam supostos seqüestros, levando á torga para bordo pessoas com as
quais realizam experiencias de comunicacáo ou coisas semelhantes;

Cl-V (Contatos Imediatos de 5S Grau): é o caso das pessoas que


afirmam estar em contato pessoal com entidades espaciáis mediante meios
ocultos;

CI-VI (Contatos Imediatos de 6S Grau): ocorrem quando há ferimentos


ou mortes resultantes de um encontró pessoal com OVNIs.

2. Após expor esses conceitos correntes, J. Ankerberg e J. Weldon


propóem sua tese: afirmam que nao se trata de ¡ntervencóes do além
nem de ilusóes óticas, mas de auténticos fenómenos provocados pelos
demonios. Julgam poder argumentar assim, com a Biblia ñas máos:

"Varias passagens da Escritura podem dizer alguma coisa a respei-


to do fenómeno OVNI. Por exemplo, a Biblia ensina que nos últimos tem-
pos Satanás vira sobre o mundo com 'todo poder e sinais e prodigios da
mentira' e que Deus permitirá grandes sinais do céu (2Ts2,9s; Le21,11).
Um fenómeno como OVNIs satánicos pode ser entao esperado á medida
que a nossa era chega ao fim. Efésios 2,2 se refere a Satanás quando
fala do 'principe da potestade do ar'" (p. 71).

3. E por que os demonios produzem tal fenómeno?

A resposta se acha ás p. 58s do livro:

«Milhares de individuos estáo desejosos de entrar em contato com


urna civilizagáo vastamente superior do espago, na esperanga de que ela

520
"CHAMADA DA MEIA-NOITE"

possa resolver os problemas do mundo e terminar a guerra, a pobreza e


tudo o mais de que ninguém gosta. Inclusive, alguns de nossos políticos
e estadistas tém esse anseio. Assim nao é surpresa que os demonios, cujo
principal objetivo é o engaño espiritual (afastar as pessoas de Deus), se
aproveitem dessa esperanga e busquem perverté-la. Considere o seguinte:

Urna das principáis influencias culturáis dos OVNIs é destruir a fé na


Biblia. Os fenómenos OVNI defendem o mito da evolugáo naturalista... e
a idéia de que o homem pode se aperfeigoar finalmente a si mesmo,
separado de Deus. Para muitos, a crenga nos OVNIs substituiu a fé pes-
soal em Deus, urna vez que as entidades OVNI os encorajam a olhar
para os céus (ou para os alienígenas) a fim de obter sua salvagáo indivi
dual e coletiva. Os encontros com OVNIs também promovem o ocultismo
e expandem o seu territorio sob um disfarce novo e inesperado.

Para outros ainda, o fenómeno OVNI torna a Biblia anacrónica e des-


trói a sua autoridade, relegando-a a um nivel de literatura terrena bastante
primitiva. Os fenómenos OVNI tendem a depreciar o lugar da humanidade
no Universo, de sua altura bíblica para algo muito inferior. O homem nao é
mais a coroa da criacáo de Deus e aquele porquem Cristo morreu. Em vez
disso, é urna especie de criatura infinitamente inferior- urna especie inferior
entre provavelmente bilhóes de especies mais avangadas no Universo.

Muitos teoristas extraterrenos colocam entáo o homem como um


ponto infinitamente pequeño num Universo infinitamente vasto, cuja úni
ca e legítima esperanga de sobrevivencia é entrar em contato com urna
forma de vida muito mais evoluída. Mas o resultado final é diminuir o valor
do homem, a idéia dele ter sido feito á imagem de Deus, e a importancia
do fato de que o próprio Deus se tornou homem pela encarnagáo. Isso
tende também a depreciar o conceito da expiagáo e redengáo crista de
um modo complexo demais para ser discutido aquí».

4. Que diz a fé católica a respeito?

Na verdade, a fé católica julga que a questáo dos discos voadores e


de habitantes em outros planetas é estritamente da aleada da ciencia.
Toca aos pesquisadores investigar a índole dos fenómenos apontados:
seráo movidos por causas extra-terrestres ou nao? A fé aceitará qual-
quer conclusáo comprovada: em qualquer hipótese, os possfveis seres
extra-terrestres sao criaturas do mesmo e único Deus que conhecemos;
a visáo da fé crista nao sofrerá alteracao. - Quanto á explicacao por
recurso aos demonios, é totalmente gratuita, para nao dizer:... absurda.
Os demonios ou anjos maus nao tém corpo: nao se vé nem como nem
por que produziriam os fenómenos OVNIs. As alegacóes de Ankerberg e
Weldon sao despropositadas. O reconhecimento de seres extra-terres
tres nao desvia o cristáo da verdadeira fé, mas, ao contrario, revela nova
faceta da infinita Sabedoria de Deus.

521
42 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 426/1997

2. Criacáo ou Evolucáo?

1. No Nvro "Os fatos sobre Criacáo e Evolucáo...", J. Ankerberg e J.


Weldon se mostram radicalmente contrarios á evolucáo das especies.
Argumentam alegando que

a) a teoría evolucionista é materialista; torna o homem "produto de


forcas impessoais da materia, do acaso e do tempo" (p. 7);

b) o evolucionismo é "responsável pela visáo agnóstica e cética do


século vinte... Trata-se de urna teoría que mudou literalmente o mundo"
(P- 9);
c) há dentistas que afirmam ser "a criacáo especial a melhor teoría"
(p. 53);
d) a Biblia ensina a criacáo direta das especies: Gn 1, 27.31; SI
148,5; Mt 19,4s; Rm 5,12-14; 1Cor 15,21s,

Em conclusáo, afirmam os autores:

"As teorías que tentam harmonizar criacáo e evoiucáo entre si, por
mais bem intencionadas que sejam, estáo prestando um desservico. Por
exempio, se a evolugáo for verdadeira, Moisés estava certamente errado
quando escreveu o relato da cñagáo de Génesis. Assim sendo, a fim de
acomodar a evolugáo, as teorías de harmonizagáo geralmente impóem
urna interpretagáo figurada ou náo-literal sobre Génesis 1-2. No entanto,
mais do que urna dúzia de outros livros bíblicos também interpretam
Génesis de forma literal. Eles sao igualmente implicados em erro por in
terpretar falsamente o livro de Génesis" (p. 69).

Os autores do livro em foco censuram especialmente Darwin e o


darwinismo como erróneos: seriam destruidores da fé,... nao somente da
fé em Deus Criador, mas também da fé em Jesús Cristo Redentor, pois
esvaziam os conceitos de Adáo e Eva e pecado original; ver pp. 58s. Os
regimes totalitarios do nacional-socialismo e do comunismo se terao ins
pirado ñas teorías do evolucionismo das especies.

2. Que diz a fé católica a propósito?

A propósito notamos que os dois autores se equivocam quando iden-


tificam evolucionismo e materialismo. Na verdade, o evolucionismo é
conciliável com a visáo religiosa (nao materialista) da origem das especi
es. Com efeito; deve-se dizer que a materia primitiva nao é eterna, mas
teve origem, e origem por um ato criador do Senhor Deus; Este Ihe terá
dado as leis da sua evolucáo, de modo que esta seguiu seu curso regido
pela Sabedoria divina; a evolucáo nao é meramente mecánica e cega
(como propunha Darwin), mas finalista ou teleológica (dirigida para de
terminado fim previsto pelo Criador). Quando a materia atingiu o grau de
organizacáo e perfeicáo necessárias para que haja vida humana, Deus

522
"CHAMADA DA MEIA-NOITE" 43

terá criado a alma humana espiritual a ser infundida no corpo do primata,


dando origem ao primeiro homem. Assim se combinam entre si criacáo e
evolucáo. O fato da evolucáo parece evidente, mas nao depSe em abso
luto contra a existencia e a providencia de Deus Criador.

3. Os Espfritos-Guias

John Ankerberg e John Weldon abordam também "Os Fatos sobre os


Espíritos-Guias. Como evitar a Seducáo do Mundo dos Espíritos e dos Po
deres Demoníacos". Manifestam ai também a mentalidade fundamentalista.

1. Comecam por aludir á canalizacio, técnica que vem assim expli


cada:

«Canalizagáo é um termo da Nova Era para exprimir a possessáo


demoníaca. Ela ocorre quando seres humanos entregam voluntariamen
te suas mentes e corpos aos seres espirituais. Esses espíritos entram e
controlam as pessoas, usando-as para transmitir ensinamentos espiritu
ais ou outras informagóes. Quando os espíritos falam pela boca das pes
soas, isso é chamado canalizagáo» (p. 11).

2. O canalizador seria um médium poderoso, capaz de captar men-


sagens muito especiáis. Eis o que nos dizem os dois autores:

«O aval dado a canalizagáo por famosos astros de cinema e televi-


sáo está tornando essa prática socialmente aceitável. Exemplos de as
tros que tém esse tipo de influencia sao Shiriey Mac Laine, Linda Evans
(do seriado Dinastía), Michel York (do filme Romeu e Julieta) e outros.

A atriz Sharon Gless, que faz o papel de Cagney no seriado de TV


Cagney e Lacey, ganhou o premio Emmy em 1987 pelo seu desempenho
na serie. Em seu discurso de agradecimento, ela disse a dezenas de
milhares de pessoas que seu sucesso era devido a Lazarís, urna entida-
de espiritual que fala através do médium Jach Pursel.

A popularidade da canalizagáo pode ser também vista através de


novos centros de retiro de workshops em todo o país. Nesses lugares,
as pessoas aprendem a abrir suas mentes e corpos aos espíritos, a fim
de também se tomarem canalizadoras. Nos centros de retiro de workshops
sao ministradas aulas ao vivo pelos próprios espíritos, motivando os alu-
nos a iniciarem grupos de estudo, centros de pesquisas e revistas
dedicadas únicamente ao estudo ou desenvolvimento da canalizagáo»
(pp. 12s).

3. Os espíritos se manifestam através dos canalizadores, tomam


nomes diversos: dizem ser espíritos de pessoas falecidas ou seres extra-
terrestres (marcianos ou venusianos), deuses de culturas antigás ou
modernas, Jesús Cristo, anjos... ou ainda apresentam-se como o Incons
ciente Coletivo, o Insconsciente Criativo, o Eu Superior, a alma Transcen-

523
44 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 426/1997

dente, a Mente Universal ou também o Espirito Santo. Dizem ser tais


para desviar os homens e mulhers da verdade. Na realidade, nao sao
senáo demonios:

«Certoft conceitos da psicología moderna estáo se tornando um im


portante instrumento para camuflar as coisas demoníacas e expandir a
sua influencia na sociedade sob outro nome. Prova disso é que virtual-
mente todo poder oculto ou manifestagáo espirita tem sido explicado psi
cológica ou parapsicologicamente, ou endossado humanísticamente como
oí; novos poderes da mente. Uma vez que a psicología redefine esses
espiritos como o potencial oculto da mente humana, o alvo da terapia
passa a ser o de obter sucesso em fazer uso desses novos poderes.
Essa abordagem concorda com os propósitos estabelecidos por muitos
dos espiritos que dizem que o seu alvo é capacitar as pessoas a entra-
rem em contato com a sua própria intuigáo, seu Eu superior, sua subper-
sonalidade criativa ou seu potencial divino, a fim de que no futuro todos
se tornem um canal para algo. Em esséncia, os espiritos querem que o
homem considere a atividade deles como nada mais que as operagóes
normáis da mente humana. O que eles dnsejam é invisibilidade» (p. 33).

«A primeira incidencia histórica da canalizagáo foi registrada na Bi


blia em Génesis capítulo 3. Lá nojardim do Éden, o diabo usou a serpen-
te como um canal pura engañar Eva (Gn 3,1-5; 2Cor 11,3; Ap 12,9). Atra-
vés da canalizagáo, o diabo levou o homem a duvidar de Deus, com gra
ves conseqüéncias. Significativamente, há razóes importantes para crer
que a realidade básica da canalizagáo sugerida aquí jamáis se alterou no
que se refere: (1) á origenr¡ (o diabo ou demonio); (2) ao seu resultado
(ilusáo espiritual que destró> a confianga em Deus); (3) as suas conseqü
éncias Quizo divino; Gn 3,13-19; Dt 18,9-13). A canalizagáo é, pois, con
donada pela Biblia como uma prática maligna diante de Deus. Ela é rejei-
tada por ser uma forma de espiritismo que envolve contato com demonios
e a divulgagáo dos seus falsos ensinamentos.

A Biblia ensina igualmente que 'nos últimos tempos, alguns


apostatarao da fé, por obedecerem a espiritos engañadores e a ensinos
de demonio:;' (1 Tm 4,1). Os ensinamentos espiritas deturpam a nature-
za de Deus, mentem sobre Cristo e distorcem o caminho da salvagáo. Os
que confiam ñas doutrinas espiritas enirontam o juízo da morte. Sob a
autoridade do próprio Cristo, descubrimos que o inferno é um lugar real
(Mt 25,46; Le 16,19-31). Os dtwónios que asseguram aos homens que o
pecado nao é real e o inferno nao existí. promovem a ruina eterna dos
que confiam neles» (pp. 42s).

4. Que diz a re:;peito a fé católica?

A fé católica afirma qun os fenómenos mediúnicos sao meras mani-


festacoes do psiquismo humano; o inconsciente e a sugefstáo funcionam

524
"CHAMADA DA MEIA-NOITE" 45

amplamente ñas sessóes espiritas, umbandistas e congéneres, revelan


do um raio de acao muito mais largo do que habitualmente se pensa. Por
conseguinte, nem espíhtos "desencarnados" {como dizem os espiritas)
nem os demonios (como dizem os fundamentalistas) atuam no espiritis
mo e ñas reunióes mediúnicas. A parapsicología explica o que possa
haver de maravilhoso ou portentoso nessas sessóes, dispensando qual-
quer elucidacáo "mística".

4. Anjos

Outro llvro de J. Ankerberg e J. Weldon refere-se aos anjos: "Quem


sao eles. Donde vém e o que fazem hoje" (subtítulo do livro).

1. Os autores atrlbuem estranhos predicados aos anjos:

«Os anjos... sao incrivelmente poderosos, e possuem grande inteli


gencia e sabedoria. Utilizam-se das mesmas medidas que os homens
(Apocalipse 21,17) e podem comer tanto comida humana quanto comida
angelical (Génesis 19,3; Salmo 78,23-25).

Os anjos tém, aparentemente, corpos espirituais. Embora nunca se


casem (Lucas 20,35.36), isso nao implica, necessariamente, que náopos-
suam sexo».

A expressáo "Anjo do Senhor", ocorrente em Gn 22,11s; Ex 3,2; 2 Rs


19,35, segundo Ankerberg e Weldon, refere-se ao Senhor Jesús Cristo
(P- 23).
2. Existem anjos maus, decaídos, chamados "demonios". Os dois
autores em foco atribuem-lhes papel importante na historia das seitas
contemporáneas: "A maioria das pessoas se surpreenderia ao saber que
literalmente muitas das seitas contemporáneas e das novas religióes fo-
ram instituidas e/ou sao nutridas por meio de contato angelical" (p. 40).
Assim os mórmons, as Testemunhas de Jeová, a Igreja da Nova Jerusa-
lém, a antroposofia de Rudolph Steiner, o Método Silva de Controle Men
tal, a Irmandade da Auto-Realizacao, fundada por Paramaghansa
Yoganda; cf. pp. 40s. Mals: á p. 51 lé-se o seguinte:

«Qual a parcela do ocultismo nao infiltrada por anjos caídos? Astro-


logia e as demais formas de adivinhagáo, magia cerimonial, exercício da
mediunidade e sessóes espiritas, bruxaria e satanismo, desenvolvimento
mediúnico, xamanismo - tudo isso está literalmente infestado de anjos
caídos e de seus engaños. Como afirma a Harper's Encyclopedia of
Mystical and Paranormal Experience (Enciclopedia Harper de Experien
cias Místicas e Paranormais), na Nova Era, no ocultismo e ñas crengas
religiosas, os anjos fizeram urna reaparigáo cheia de popularidade. Eles
sao retratados nos aspectos cármicos da astrologia, sao incorporados,
meditase neles, e afirmase que existem no reino dos espíritos. Invo-

525
46 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 426/1997

cam-se hostes angelicais nos rituais de magia e em varios tipos de magia


e bruxaria. A concepgao popular afirma que existem anjos benevolentes
que sao diferentes de demonios.

Sem dúvida, esse é um dos objetivos primordiais dos demonios que


imitam anjos piedosos - confundir as pessoas quanto ao campo de ope-
ragáo deles. Se as pessoas puderem ser convencidas de que o reino do
ocultismo é o próprio dominio das manifestacóes angelicais, elas estaráo
muito mais inclinadas a experimentá-lo. E, além do mais, se ninguém sabe
o que um anjo é de fato, qualquer espirito que reivindicar ser um anjo
soará convincente. Por isso mesmo, um número muito grande de pesso
as que hoje contactam anjos estáo lenta, porém decisivamente, sendo
levadas diretamente ao dominio das trevas» (p. 51).

ñeferindo-se á Igreja Católica, os autores comentam as aparicóes


atribuidas a María SSma., especialmente as de Medjugorje, e afirmam
que "a teología e os ensinamentos do catolicismo sao antibíblicos" (p. 55).

Á p. 62 está escrito: "Os OVNIs só podem ser explicados recorrendo


á demonologia".

3. Que dizer a respeito?

Os autores, mais urna vez, se deixam levar pelo fundamentalismo ou


por estreiteza de pensamento, atribuindo a anjos maus ou demonios tudo
o que Ihes parece erróneo: ínstituicóes, movimentos espiritas, livros... Os
anjos maus estariam iludindo os homens com todo tipo de farsas e arma-
dilhas.

Ora a fé católica professa a existencia do demonio; sabe, porém,


que o que Ihe interessa é o pecado. S. Agostinho afirma que o demonio é
um cao amarrado, que pode latir muito, mas só morde a quem se Ihe
chega perto. As limitacoes intelectuais e moráis do homem sao suficien
tes para explicar a variedade de crencas e teorías aberrantes do mundo
contemporáneo como também explicam muitos dos desvíos moráis de
nossos tempos; nao é necessário admitir o demonio a atuar em tudo o
que se desvirtúa ou perverte.

Em suma, é lamentável encontrar em autores de certa cultura geral,


como sao os dois escritores em foco, urna obsessáo tal que estreita os
horizontes e impede de compreender a realidade de maneira mais tran
quila e objetiva, menos apavorada e apavorante. O espirito proselitista e
sectario se reflete bem no fim de cada livro da serie, quando o leitor é
convidado a procurar "urna Igreja que honre a Jesús ou a escrever para
a Editora 'Chamada da Meia-Noite'". A fé nao rejeita os subsidios da ci
encia moderna que possam dilatar seu horizonte de maneira comprova-
damente certeira; ela nada tem a temer das conclusóes devidamente
demonstradas do pensamento moderno.

526
LIVROS EM ESTANTE

Novo Testamento. Tradugáo Oficial da Conferencia Nacional dos Bispos


do Brasil. Ed. Paulinas e Loyola, Sao Paulo 1997.
No final do volume lé-se a seguinte nota: "Esta tradugáo está abena a
aprimoramento. Poristo ficaremos gratos a pessoas que enviarem suas obser-
vagoes". Cientes deste convite, propomos, a seguir, algumas ponderagóes que
merecen) atengáo.
Logo no inicio do livro encontrase urna Jabela Cronológica ("Linha do Tem-
po"), onde se lé: "Mais ou menos 6 a. C, Nascimento de Jesús. Jesús em
Nazaré". -Alguns leitores tém entendido erróneamente estas palavras como se
os editores quisessem dizer que Jesús nasceu em Nazaré. Em vista desta
experiencia, sería desejável urna explicitagáo: "Nascimento de Jesús em Belém.
Jesús vaipara Nazaré".
Em Mt 19,12 a palavra "eunucos"é traduzida por "incapazes de casamen
to". - Ora tal versículo costuma ser aplicado, na literatura ascética e nos docu
mentos oficiáis da Igreja, aos que abracara o celibato. Estes nao sao incapa
zes de se casar. Daí ser preferível guardar a palavra "eunuco" no texto e, em
nota de rodapé, explicá-la.
Em Mt 12,28, em vez do binomio "corpo e alma", como pede o contexto,
foi utilizado o binomio "corpo e vida"- o que nao tem sentido. Nao se vé porque
evitar a palavra "alma"; alias, ela aparece em Ap 6,8 ("Vi debaixo do altar as
almas dos que tinham sido imolados").
Em Mt25,1, o título posto pelos tradutores reza: "As dez virgens". O texto,
porém, traduzparthénoipor'pvens", evitando a palavra "virgens". Náohárazáo
para isto, de mais a mais que "virgem"aparece em 1Cor 7,25.34.36.
EmF11,1 lé-se:"... com seus bispos e diáconos". O leitor moderno poderá
datdeduzirque na comunidade de Filipos havia muitos bispos no sentido atual
da palavra - o que seria falso. Daí ser melhor guardar a palavra "epíscopos"
como faz a Biblia de Jerusalém, e explicar o seu sentido em rodapé.
Em Jo 1,3s a poniuagáo nao é a melhor. As mais recentes tradugóes
trazem: "Judo foi feito por Ele, e sem Ele nada foi feito. O que foi feito, nele era
vida". Talé o modo de entendernos primeiros séculos (muito consentáneo com
o paralelismo das frases da língua hebraica); somente no século IV foi modifi
cada apontuagáopara evitaros mal-entendidos que o arianismo efetuava na
base deste versículo.
Em Jo 1,21s também a leitura nao é a mais consentánea com os antigos
intérpretes, que liam: "A todos os que O acolheram, aos que créem em seu nome,
deu o poder de se tomarem filhos de Deus, Ele que nao nasceu do sangue nem do
ímpeto da carne nem do desejo do homem". É Jesús quem dá o poder de nos
tomarmos filhos de Deus, no caso, Jesús que nasceu virginalmente.
Porfim, dado que tal tradugáo se destina ao grande público, é de lamentar
que seja acompanhada de táo poucas notas explicativas em rodapé. A finalida-
de da edigáo exigiría mais copiosas e significativas notas de pé de página.

527
48 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 426/1997

A Águia e a Galinha, por Leonardo Boff. - Ed. Vozes, Petrópolis 1977,


160x230mm, 206pp.

O autor parte de urna lenda de Gana (África Ocidental), segundo a qual


urna águia foi criada num galinheiro, como asgalinhas. Assumiu, pois, o modo
de viver das galinhas; era, em aparéncia, urna galinha, mas galinha dentro da
qual havia urna águia. Só a muito custo, por obra de um naturalista, é que a
águia passou a voarpara as alturas, emancipándose dos limites do galinheiro e
tornándose o que ela realmente era. - Assim, diz Leonardo Boff, cada ser
humano hospeda dentro de si urna águia; sentese portador de um projeto de
vida que atinge o Infinito. Quer romper os limites apenados do seu viver cotidi
ano. Há, porém, movimentos políticos e sociais que pretendem reduzirapes-
soa humana a simples galinha, confinando-a aos limites do galinheiro.

O autor se preocupa com a questáo de dar asas á águia, fazendo-a ganhar


altura, integrando, porém, o que é válido na galinha. Sáopalavras de L. Boff:

"O grande desafio atual é criar condigóes para que emerja o arquetipo da
águia. Poderes mundiais tém interesse em mantero ser humano na situagao de
galinha. Querem apagar de sua consciéncia a vocagáo de águia. Por isto a
grande maioria da humanidade é homogeneizada nos gostos, ñas idéias, no
consumo, nos valores, conforme um só tipo de cultura (ocidental), de música
(rock), de comida (fast food), de Ifngua (inglés), de modo de produgáo (mercado
capitalista), de desenvolvimento (material).

Recusamos ser somente galinhas. Queremos ser também águias, que


ganham altura e que projetam visóes para além do galinheiro. Acolhemos
prazerosamente nossas rafzes (galinha) mas nao á custa da copa (águia), que
mediante suas folhas entra em contato com o sol, a chuva, o are o universo
inteiro... As águias nao desprezam a térra, senáopara voarnos céus, medindo-
se com os picos das montanhas e com os ventos mais fortes" (pp. 175s).

Aqui está urna tese que L. Boff vem propugnando nos seus últimos pro-
nunciamentos de maneira um tanto exagerada e radical. Éde inspiragáo reta e
crista, na medida em que apregoa reconhecera dignidade humana e superar um
ceño conformismo ou comodismo covarde, que impede o ser humano de che-
garao heroísmo ou, em linguagem crista, á santidade. - Todavía a linguagem do
livro é assaz ambigua, recorrendo a jogos de palavras, metáforas poéticas,
antíteses, que podem impressionar o leitor, mas nao tém grande conteúdo sig
nificativo. Exemplo típico dessa ambigüidade sao as páginas 161s: o autor re-
jeita o panteísmo, mas acrescenta: "A Suprema Realidade pode ser comparada
a um ilimitado mar-oceano de ser, de vida e de amor. Nos somos apenas ondas
deste mar-oceano. A onda é e nao é o mar", (p. 162).

Em suma, nao se véem erros de fé na obra, mas idéias bonitas expressas


de maneira um tanto vaga e figurada.

Estéváo Bettencourt O.S.B.

528
PUBLICACÓES MONÁSTICAS

SAO BENTO, O ETERNO NO TEMPO, D. Lourengo de Almeida Prado, O.S.B. Ed.


"LUMEN CHRISTI", 1994, 289 págs R$ 15,00.
(A coletánea que forma este volume, representa até pela volta freqüente aos mesmos
textos e as mesmas reflexóes, pensamentos ou meditacóes de um beneditino que ficou
mais conhecido como educador, sem nunca deixar de querer ser, antes de tudo, um
discípulo do Patriarca de Monte Cassino).

SALTERIO MEU MINHA ALEGRÍA, os 150 Salmos pelas Monjas beneditinas de Santa
Maria - SP. Salterio ilustrado para criancas e adultos com alma de crianca... 23 edicáo.
1994, Formato: 21,5 x 16cm R$ 11,50.

ESCRITOS MONÁSTICOS - SAO JERÓNIMO: Vida do Bem-aventurado Paulo, primei-


ro eremita. Vida de S. Maleo, escravo e monge. Vida de S. Hilario. Carta XXIII a Eustáquia.
Traducáo: D. Abade Timoteo Amoroso Anastácio, OSB. Revisáo Mosteiro Maria Máe de
Cristo. Impressáo: Mosteiro da Santa Cruz. 1996. 148 págs RS 11,00.

A ESCOLHA DE DEUS, comentario sobre a Regra de Sao Bento, por Dom Basilio Penido,
OSB. 2a edicáo revista- 1997. 215 págs R$ 15,00.

A PROCURA DE DEUS, segundo a Regra de Sao Bento. Esther de Waal


Traduzido do original inglés pelas monjas do Mosteiro do Encontró, Curitiba/PR.
CIMBRA - 1994. 115 págs R$ 16,50.
Apresentado pelo Dr. Roberto Runcie, arcebispo anglicano de Cantuária, pelo Cardeal
Basil Hume, OSB, arcebispo de Westminster e de D. Paulo Rocha, OSB, abade de Sao
Bento da Bahía.

A REGRA DE SAO BENTO, 3a edicáo em latim-portugués, com anotacóes por Dom


Joáo Evangelista Enout OSB. A Regra que Sao bento escreveu no século VI continua
viva em todos os mosteiros do nosso tempo, aos quais nao faltam vocacóes para mon-
ges e monjas. 210 págs R$ 11,50.

PERSPECTIVAS DA REGRA DE SAO BENTO, Irma Aquinata Bóckmann OSB.


Comentario sobre o Prólogo e os capítulos 53, 58, 72, 73 da Regra Beneditina -
Traducáo do alemáo por D. Mateus Rocha OSB.
A autora é professora no Pontificio Ateneu de Santo Anselmo em Roma (Monte
Aventino). Tem divulgado suas pesquisas nao só na Alemanha, Italia, Franca, Portugal,
Espanha, como também nos Estados Unidos, Brasil, Tanzania, Coréia e Filipinas, por
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SAO BENTO - transformou-o em exemplo vivo, em mestre e em legislador de um estado
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trajetória de um viver humano renascido do sangue redentor de Cristo. - Assim, o discípulo
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te a Escritura? - 3. Somente a fé? Nao as obras? - 4. A SS. Trindade, Fórmula
paga? - 5. O primado de Pedro - 6. Eucaristía: Sacrificio e Sacramento. - 7. A
Confissáo dos pecados - 8. O Purgatorio - 9. As indulgencias - 10. María,
Virgem e Máe - 11. Jesús teve irmáos? - 12. O Culto aos Santos - 13. E as
imagens sagradas? - 14. Alterado o Decálogo? - 15. Sábado ou Domingo? -
16. 666 (Ap. 13,18) - 17. Vocé sabe quando? - 18. Seita e Espirito Sectario -
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