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tM P Rk IM A T UR POR COMISSAO ESPECIA] DO EXMO, E REVMO. SR. DOM eee PEDRO DA CUNHA CINTRA, BISPO DE PE- peCkor FREI LAURO OSTERMANN O. F. M, PETRGOPOLIS, 3-3-1952. TODOS OS DIREITOS RESERVADOS aT, Tit. Iv. . Conselhos gerais aos escrupulosos VIL Vil. VIitt. IX. XI. XII, XII. INDICE . Definigéo e natureza dos escru- pulos — Seus sintomas ....... Diferentes espécies de escrtiipulos — Seus objetos ............... Principios dos escriipulos ...... Dos maus efeitos dos escrupulos Remédios particulares — Dire- gao dos escrupulosos .......... Quais s&o os maus escrupulosos Confissdes e comunhao dos es- crupulosos ... . Qualidades que deve ‘ter ° ‘con- fessor dos escrupulosos ........ . Conduta dos confessores dos es- crupulosos, consoante o Padre BOWGOG) casts esa ge dss esses Dialogo entre o diretor e o es~ GLUPWGSO pis -eaae iter petarwenes Cartas de Fénelon sobre os di- versos estados de escrupulosos .. Da paw iwterior v2. O escrupuloso, N&4o; ignoro-o, e desejo vivamente que mo ensineis. O diretor. Tende uma confianga sem li- mites na misericérdia divina pela me- diacio de Nosso Senhor Jesus Cristo, que derramou o seu sangue por vés, que vos procurou como uma ovelha desgarrada através das sarcas e dos espinhos, e que quis expiar pessoalmente os vossos peca- dos para vos dar a paz ¢ a salvacaéo. Poderieis desesperar e perder confianca a vista do que Deus féz por vés dando-vos seu Filho, que se fez a si mesmo vitima por vos? Que ha que n&o obtenhais pela mediag&io de Jesus Cristo? Que ha que nfo acheis n’Ele? Forcga, luz, justi¢a, santidade, con- solacéo, perseveranca; porquanto Jesus 90 Tratado dos Escripulos Cristo € um dom universal em quem estao encerrados todos os outros dons e todos os tesouros da graca. ““Dando-nos seu Filho, diz S. Paulo, Deus nao nos deu todas as coisas com Ele?” (Rom 8, 33). Deu-no-lo para ser o suplemento universal de todas as nossas misérias, de toda a nossa in- dignidade, -E que quereriamos que Deus fizesse a mais para nos inspirar sentimentos de confianga e de amor? Que pode ele acres- centar & admirdvel economia da redengéo, da religiaéo, dos sacramentos, da mediacio da SS. Virgem, de tantos caminhos abertos &@ vossa confianca? O escrupuloso. Mas eu n&o mere¢o se- néo os reptidios e a indignacaéo de Deus; todas as minhas oracgGes sio mas, e Deus n&o pode escutar-me. O diretor. Mas Jesus Cristo, o Filho tni- co do Pai, que intercede por nds, que por nés oferece o prego dos seus méritos, do seu sangue e*dos seus trabalhos, néo me- rece bem ser escutado em nosso favor? Poderiamos crer que tal Pai pudesse re- cusar alguma coisa a tal Filho que Ihe oferece tal preco? Este pensamento n&o seria injurioso tanto ao Pai como ao Filho? O escrupuloso. Os meus pecados passa- dos, que séo tao numerosos, as minhas Tratado dos Escrtipulos at fraquezas presentes e futuras me assus- tam. O diretor. E que sio todos os vossos pe- cados comparados com a misericérdia de Deus e com os merecimentos de Jesus Cristo? Seréo outra coisa a n&o ser como uma gota de 4gua comparada com o Ocea- no? Abri os Livros santos, e vede a gran- de maravilha da misericordia divina para com pecadores tais como David, Zaqueu, Saulo, inimigo declarado de Jesus Cristo, S. Pedro perjuro, Madalena prostituida, o bom ladrao, etc. Que tendes a temer de- pois de tantos exemplos, apés tantos san- tos que reinam no céu, e que, antes da sua conversio, foram mais culpades do que vés? O escrupuloso, Mas esses eram santos, e nao miseraveis como eu, que estou tao longe de me aproximar das virtudes deles! O diretor. Seria um erro crer que os santos néo foram o que vés sois, e que vés n&o podeis ser o que eles s&o. Os san- tos tiveram as mesmas tentacdes, as mes- mas fraquezas, as mesmas dificuldades, as mesmas paixdes, os mesmos inimigos que vés, e vos tendes as mesmas gracas, 0s mesmos socorros, os mesmos meios, as mesmas esperancas que eles. E’ sé, como eles, terdes plena confianga; tendes s6 que usar dos socorros que vos s&o ofere~ 92 Tratado dos Hscripulos cidos, e chegareis 4 mesma felicidade que eles, O escrupuloso, Longe estou de ousar es- pera-lo: estou sobejamente convencido da imensidade das minhas misérias; para es- perar essa ventura. O diretor. Permiti-me fazer-vos aqui uma observacéo que néo vos sera inutil, espero-o: € que devemos desconfiar dessa desconfianga que parece nascer do senti- mento das nossas misérias, e que muitas vezes n&o passa de uma falsa humildade e de um verdadeiro orgulho. O bom es- pirito produz bons frutos, e o mau espi- rito produz maus frutos; é por ai que se deve fazer o discernimento deles, e é por ai também que se deve distinguir a ver- dadeira da falsa humildade; uma e outra nascem da convicg¢io das nossas misérias e da nossa indignidade; mas os frutos que uma e outra produzem sao bem diferen- tes. A verdadeira humildade vem de Deus, e leva também a Deus. Como ela 6 um dom de Deus, fortalece a alma e da-Ihe um novo vigor, uma prontid&o e uma li- berdade santa para roga-lo e servi-lo: o espirito de Deus néo pode enfraquecer nem desanimar as almas, tornad~-las mais des- confiantes da bondade de Deus, mais pe- Sadas, mais inquietas,.mais covardes na oragao e no cumprimento dos outros deve- a Rr Lid res da religiaio: esses maus frutos nfo po- dem, pois, vir senéo da operacéio do espi- rito maligno. Tomai cuidado nisso, e des- confiai. Santa Teresa dizia as suas reli- giosas: “Guardai-vos de certas humildades acompanhadas de inquietacdes que o de- monio nos pée no espirito; elas causam & alma uma afligao que a confrange, que a agita, que a atormenta, e que lhe é inteira- mente dificil de suportar. Com isso, o de- ménio pretende persuadir-nos de que te- mos humildade, e ao mesmo tempo fazer- nos perder a confianca que devemos ter em Deus... Quando. estiverdes neste es- tado, acrescenta ela, 0 mais que puderdes desviai 0 vosso pensamento da considera~ giao da vossa miséria, e levai-o a consi- derar 0 quanto ¢ grande a misericdrdia de Deus, qual € o amor que ele nos dedica, e o que lhe aprouve sofrer por vés”. Efetivamente, a desconfianca, embora se cubra com as aparéncias da humildade e da conviceéo da miséria, da fraqueza e da, indignidade do homem, é realmente or- gulho. Sen&o, vede: Deus conhece infini- “tamente melhor do que nds as nossas fra- quezas, a nossa malignidade, a nossa in- dignidade; mas, apesar disso, manda-nos esperar na sua misericérdia e nos mere- cimentos de Jesus Cristo; ordena-nos Jancar fora as dtvidas, todos os pensa- 94 Tratado dos Escrtipulos mentos que atacam ou enfraquecem a es- peranca, como os que atacam a fé, a cas- tidade; anima-nos por sua palavra e por suas promessas; e niéo 6 um grande or- gulho n&o lhe obedecermos, nao escutar-~ mos a sua palavra e rejeitarmos as suas consolacées? Ele nos oferece suas gracas, declara-nos que se consideraréa ofendido se dermos ouvido 4s nossas desconfiancas; ameaca-nos se nao esperarmos na sua bon- dade, Ent&o nao é€ orgulho pretender al- guém desculpar-se com o fato de ser demasiado indigno e de haver abusado de mais das suas gracas e da sua paciéncia? O escrupuloso, Mas ent&éo que devo fa- zer? dignai-vos tragar-me o caminho, e eu o seguirei. O diretor. Primeiramente, como ja vos disse, deveis ter uma grande confianga em Deus, visto ser ela a fonte de toda sorte de bens, visto enraizar, nutrir e fortificar as virtudes, amenizar as penas, enfraquecer as tentagdes, duplicar a co- ragem, dar nascimento a todas as boas obras, e ser para a alma como um pa- raiso de béng&o e uma espécie de felici- dade antecipada. Diz o profeta Jeremias: “Feliz o homem que pode sua confianga no Senhor, e de quem o Senhor é a espe- ranca!” (Jer 17, 7). ; A confiancga fraca e timida torna a pie- Tratado dos Escrapulos 95 dade trémula e vacilante; é sustada pe- los mais pequenos obstaculos, é retardada pelo menor contratempo, desalentada pe- las mais leves contradi¢des. Ora, uma es~- peranca timida e trémula torna também hesitantes e timidas as oracées que dela nascem, e por conseguinte incapazes de obter muito. Torna a gratidéo menos viva, o amor menos ativo, abre a sua ‘porta as tentacdes, rouba & alma a paz, enche-a do espirito das trevas, fortifica a oposi- cao natural as virtudes cristas, serve aos designios pérfidos do deménio contra nos- sa alma. N&o admitis estas verdades? O escrupuloso,-Admito-as perfeitamente. O diretor. Penetrado de confianga em Deus, deveis ter uma grande confianga no vosso guia espiritual. Deveis abrir-lhe o vosso corac&o, e, uma vez que vos houver- des revelado a ele, ficai convencido de que ele s6 quer o bem e a salvacado de vossa alma; que o lugar onde ele esta, o minis- tério que ele desempenha, o Deus cujo lugar ele ocupa, a responsabilidade que ele assume sobre si, sio garantias bastante poderosas de que ele cumpre o Seu dever Para conosco. Escutai-o em tudo; obede- cei as decisOes dele, 4s suas prescricées, as suas proibicées, aos seus conselhos, co- mo ao proprio Deus. O escrupuloso. Sinto que é esse 0 ca- Tratado minho mais curto; mas como obedecer contra a prépria consciéncia? O diretor. A vossa consciéncia pode en- ganar-vos, e a vossa obediéncia nunca vos enganara. A vossa consciéncia pode ser trevosa; e Jesus Cristo, falando pelo seu ministro, 6 a luz e a Verdade; foi ele quem nos disse que escutassemos aquele que ocupa o seu lugar. E foi ele quem advertiu oO seu ministro de contar com o seu di- reito, dizendo-lhe: Quem vos escuta a mim escuta. O escrupuloso. Sou presa de mil tenta- des, O diretor. Deveis convencer-vos bem de que, se sois tentado, 6 porque o Senhor vos ama, ¢ porque sois agradavel aos olhos« q@’Ele, 6 porque Ele quer purificar-vos ca- da vez mais, aumentar oS vossos mereci- mentos, experimentar a vossa fidelidade, e tornar mais brilhante a vossa coroa. “Deixai correr o vento das tentagées, diz S. Francisco de Sales, e n&o penseis que o cicio das folhas seja o tilintar das ar- mas, Ficai bem persuadido de que todas as tentagdes do inferno n&o poderiam man- char um espirito que n&o gosta delas”. Pensai em que Deus é um pai terno, e que Ele nao permitira a provacgaéo senéo na medida em que ela vos for util. Pensai ainda em que os maiores santos, como 8S. Tratado dos Escripulos 97 Antéo, S. Jerénimo e varios outros, foram mais tentados do que vés, e que sairam vitoriosos; néo vos deixeis abater pelo te- mor; lembrai-vos de que para um pecado mortal 6 preciso que a matéria seja gra- ve, 0 conhecimento pleno e inteiro, a von- tade expressa. Nas tentacdes contra a pu- reza ou contra a fé, néo vos detenhais a produzir com esfor¢o atos dessas virtudes: volvei-vos para Deus por um terno olhar de confianga: invocai a SS. Virgem, téo boa, t&o misericordiosa para conosco; en- tregai-vos a alguma ocupacdo exterior, e ficai em paz, aguardando que Jesus Cristo mande a tempestade e o mar se acal- marem. O escrupuloso. Mas estou sempre distrai- do diante de Deus; n&o posso fazer oracg&o; dai vem que n&o fago nenhum progresso. O diretor. Nao vos perturbeis com isso; quanto mais penosa é a oracdo, tanto mais meritéria. Retiramos dela menos satisfa- cao, 6 verdade; mas é por isso mesmo que ela é mais agradavel a Deus. Lembrai-vos de que Jesus Cristo orou sem consolac&o durante a sua dolorosa agonia. Quanto as distragées, quando n&o vos houverdes prestado a elas consciente e vo- luntariamente, n&o vos detenhais a procu- rar qual Ihes possa ser a causa, nem se de algum modo destes lugar a elas; lan- SO eee eee an dos 2S COD ULS ¢ai-vos nos bracgos de Jesus Cristo, e con- vertel em merecimentos 6 que é uma fon- te de apreensées. Fazei uso frequente das oracées jacule- torias; estes dardos inflamados tém a vir- tude de elevar depressa o coracéio para Deus, e de abrir o coracio de Deus as nossas necessidades. Elas s&o curtas, fa- ceis, podem ser feitas em toda parte e em todo tempo e sem direc6es, visto que mui- taS vezes € sO uma palavra. Nao vos entregueis a mortificacdes ex- cessivas. S. Jerénimo nos ensina que, quando o deménio n&o consegue desviar uma alma do amor do bem, trata de im- peli-la a mortificacdes de um rigor exces- sivo, a fim de que ela fique esmagada por elas, ¢ assim perca o vigor necessario ao seu adiantamento espiritual. Varias almas piedosas caem nesta armadilha; e eis ai por que S. Francisco de Sales, que soube guardar um meio termo tao sensato entre o relaxamento e o rigorismo, e cujos con- selhos fazem autoridade, disse: “Concito- vos a conservardes cuidadosamente a vos- sa salde, pois Deus exige de vés esse cui- dado, e a poupardes vossas for¢as para empregd-las Melhor no seu servicgo; de feito, 6 melhor conservar mais forgas cor- porais: do que é preciso, do que arruina- las mais do que é preciso; porquanto po- Tratado dos Escrapulos . 99 de-se sempre enfraquecé-las quando se quiser, mas nem sempre se pode repara- Jas quando se quer’. Concedei-vos, pois, os cuidados necessirios para poderdes servir melhor a Deus. N&o debiliteis de- masiadamente 0 vosso espirito pelo jejum: _porquanto n&o farieis com isso senao tor- na-lo mais fraco e, assim, mais exposto aos ataques do inimigo. O escrupuloso. © que mais afligao me causa 6 aproximar-me do tribunal sagrado. O diretor. Esse tribunal que temeis 6, no entanto, o tribunal da misericérdia, e n&o -deverieis aproximar-vos dele senao com confianga e serenidade. Aquele que ocupa o lugar de Jesus Cristo tem ordem de receber-vos, de perdoar-vos, de conso- lar-vos, de misturar suas lagrimas 4s vos- sas, de vos abrir enfim as portas do céu. Ah! nao fagais desse sacramento de amor e de remissio um sacramento de tortura e de angustias; ah! que quer o Senhor sen&o quebrar os nossos grilhées, restituir & nossa alma a sua liberdade, a sua paz, a@ sua doce alegria, para com nova cora- gem trilharmos os caminhos da salvagaéo? E’ preciso arrepender-se dos préprios pe- cados, mas n&o se perturbar com eles; é preciso ser humilhado, mas nao desespe- rado. Depois da confissio, conservai-vos, pois, calmo, e gozai do fruto do sacra~ 100 . ____Tratado dos Es mento; nao deis acesso a mil temores so~ bre a validade do sacramento, sobre 0 vos- SO exame, sobre a vossa contric&io; a ver- dadeira contricao 6 obra do amor, e 0 amor age na calma: reinem, pois, no vosso coragéo o amor e a confianca. Agradecei a Deus, prometei-lhe emendar-vos. Espe- rai que, por sua graca, cumprireis as vos- Sas resdlucdes, e, ainda que devésseis re- cair cem vezes, n&o cesseis de prometer e de esperar. Se Deus nfo vos da o senti- mento da vossa contrig&éo, 6 para provar o mérito da obediéncia, que deve bastar para vos tranquilizar sobre a vossa recon- ciliagéo perfeita. Diz S. Francisco de Sales: “Grande poder é diante de Deus o poder querer, e vos tendes a contri¢éo pelo sim- ples fato de desejardes té-la. Nao a sen- tis? N&o importa! o foge que esté sob a cinza n&o se vé, n&o se sente; e, no en- tanto, esse fogo existe. Crede, pois, com humildade, obedecei com coragem, e tereis uma dupla recompensa”’. O escrupuloso. Hu bem teria necessidade dos vossos conselhos, pois tremo sempre, e estou sempre prestes a abandonar a co- munhao. O diretor. S. Francisco de Sales diz que ha duas espécies de pessoas que devern co- mungar com frequéncia: os perfeitos, pa- ra se unirem mais intimamente 4 fonte de

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