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Projeto

PERGUNTE
E
RESPONDEREMOS
ON-LINE

Apostolado Veritatis Spiendor


com autorizacáo de
Dom Estéváo Tavares Bettencourt, osb
(in memoríam)
APRESENTAQÁO
DA EDigÁO ON-LINE
Diz Sao Pedro que devemos
estar preparados para dar a razáo da
nossa esperanga a todo aquele que no-la
pedir (1 Pedro 3,15).

Esta necessidade de darmos


conta da nossa esperanga e da nossa fé
hoje é mais premente do que outrora,
visto que somos bombardeados por
numerosas correntes filosóficas e
religiosas contrarias á fé católica. Somos
assim incitados a procurar consolidar
nossa crenga católica mediante um
aprofundamento do nosso estudo.

Eis o que neste site Pergunte e


Responderemos propóe aos seus leitores:
aborda questóes da atualidade
controvertidas, elucidando-as do ponto de
vista cristáo a fim de que as dúvidas se
dissipem e a vivencia católica se fortalega
no Brasil e no mundo. Queira Deus
abengoar este trabal no assim como a
equipe de Veritatis Splendor que se
encarrega do respectivo site.

Rio de Janeiro, 30 de julho de 2003.

Pe. Esteváo Bettencourt, OSB

NOTA DO APOSTOLADO VERITATIS SPLENDOR

Celebramos convenio com d. Esteváo Bettencourt e


passamos a disponibilizar nesta área, o excelente e sempre atual
conteúdo da revista teológico - filosófica "Pergunte e
Responderemos", que conta com mais de 40 anos de publicagáo.
A d. Esteváo Bettencourt agradecemos a confiaca
depositada em nosso trabalho, bem como pela generosidade e
zelo pastoral assim demonstrados.
19B1

confront
Sumario

Pág.

"RICO EM MISERICORDIA" • 1

Qual seria
O SENTIDO DA VIDA ? 3

A palavra do Papa :
JOAO RAULO II AOS SACERDOTES 14

"Quando sou fiaco, entáo é que sou lorie" :


E A IGREJA NA RÚSSIA SOVIÉTICA ? 21

lima denominafio protestante :


OS CONGREGACIONALISTAS 29

Por que
NAO COMER CARNE ? 39

LVROS EM ESTANTE 3? capa

COM APHOVACAO ECLESIÁSTICA

NO PRÓXIMO NÚMERO:

Concupiscencia e adulterio do coragáo. — "Amizade e


sexualidade". — "Sexualidade e consagragáo". — Os Bispos
da Alemanha falam sobre a Maconaria. — "Nossa Senhora
aos seus sacerdotes".

«PERGUNTE E RESPONDEREMOS»
Número avulso de qualquer mes 50,00

Assinatura anual 500,00

PEDIMOS AOS NOSSOS ASSINANTES QUE SEM DEMORA

NOS MANDEM O PAGAMENTO REFERENTE A 1981

Diregao e Redacao de Estévao Bettencourt OSE.

ABMINISTRAgAO BEDACAO DE PR
Livrari» Missionária Editora c . postal , B66
Boa México, 111-B (Castelo) CaUCa PostsÜ 2"666
20.031 Bio de Janeiro (BJ) 20.000 Rio de Janeiro (BJ)
Tel.: 224-0059
"RICO EM MISERICORDIA"
O novo ano abre-se ao eco das palavras iniciáis da nova
carta encíclica» de S. Santidade o Papa Joáo Paulo n, divul
gada em dezembro pp.: «Deus, que é rico em misericordia...»

O proposito desta temática é apresentado pelo Pontífice


nos §§ 10-12 do documento :

O mundo de hoje se debate em profunda crise e angustia,


como se tem repetido. Já em 1965 o Concilio do Vaticano II
observava: :

"Em face da atual evolucfio do mundo, cada día sfio mala numerosos
aqueles que pOem a si mesmos, ou sentem com malor aculdade, as ques-
tóes fundamentáis: Que é o homarn? Qual ó o significado do sofrlmento,
do mal e da morte que, apesar de (fio grandes progressos, conllnuam a
existir? Para que servem semelhantes Vitorias pagas por tfio alio proco?"
(ConsL Gaudlum ot Spes n? 10).

Interroga entáo Joáo Paulo II:

"Decorrldos quase qulnze anos após o encerramento do II Concillo do


Vaticano, ter-se-é tornado menos Inquietante este quadro de tensOes e de
ameagas, próprias da nossa época? Parece que nao. Ao contrario, as ten-
sOes e as ameajas que no documento concillar pareclam apenas dellnear-se
e nfio manifesfavam Intelramente todo o perlgo que em si encerravam, no
transcorrer destes anos revelaram-se mals claramente, conflrmaram de varias
maneiras aquele perigo e Já nfio permiten) acalentar as ilusfies de outrora"
(n? 10).

Pois bem. A fina de conter a onda de males sociais de que


vém sofrendo os homens, tém-se apregoado após a segunda
guerra mundial (1939-1945) a justica social e os direitos da
pessoa humana. Nunca se falou tanto de direitos humanos;
a própria Igreja tem procurado mostrar nos mananciais da fé
a fundamentacáo de tal mensagem.

Contudo muitas vezes acontece que os programas inspi


rados pelo conceito de justica na pratica sofrem deformacóes.
O rancor, o odio, a crueldade, o espirito de vinganga exer-
cem-se falsamente em nome da justiga; por vezes, verifica-se
que os homens de hoje ainda sao seguidores da antiga lei do
taliáo: «Olho por olho, dente por dente» (Mt 5,38). Muitas
vezes, em nome de pretensa justisa, aniquila-se o próximo, co-
metem-se morticinios, sufoca-se a liberdade, espezinham-se os

'encíclica vem do grego en kyklool, em circulo. Significa circula/....


no caso: carta circular. ' °
mais elementares direitos humanos... Verifica-se assim quáo
sabio é o adagio: Summum tus, snmma iniuria, que significa:
«Quem quer aplicar a justica ao extremo, pode estar cometendo
extrema injustiga>. Esta afirmacáo nao tira o valor á justica,
mas evidencia que é preciso recorrer a forga mais profunda do
espirito, que é o amor,... e amor sob forma de misericordia.

E que vem a ser propriamente a misericordia ?

É a atitude de quem tem o coracáo (cor, coráis, em latim)


voltado para o mísero ou a miseria; é, pois, a atitude de quem
considera o outro nao só com as categorías do raciocinio e da
lógica, mas também com as do coracáo e do afeto; sabe entrar
dentro do intimo do outro, compreendé-lo e perdoar, se neces-
sário, as dividas que a estrita justica cobraría. É este o valor
que deve, com nova énfase, ser apregoado diante dos novos
quadros de desatino característicos dos nossos dias.

O Senhor Deus é o primeiro a dar-nos o exemplo da mise


ricordia. Tendo o homem dito ao Criador um Nao movido por
auto-suficiencia e soberba, o Senhor nao o abandonou, mas
quis restaúralo na sua amizade. Jesús, Deus feito homem, é
a própria encarnagáo da misericordia divina. Ele revela aos
homens o Pai rico em misericordia; cf. Ef 2, 4.

Ora á Igreja compete continuar a missáo de Jesús Cristo


e apregoar, juntamente com a justica, o amor misericordioso
de Deus. Infelizmente a mentalidade contemporánea, talvez
mais do que a do homem do passado, tende a tirar do coragáo
humano a idéia de misericordia. Com efeito, o enorme desen-
volvimento da ciencia e da técnica dá ao homem grande domi
nio sobre a térra, abre-lhe o horizonte das conquistas, leva-o
a calcular fríamente, incitando-o á procura do lucro crescente.
Ora isto tem deformado a mente do homem, tirando-lhe a pos-
sibilidade de compreender o que seja «abrir máo de...», com-
padecer-se, perdoar, respeitar o irmáo que esteja carente física
ou moralmente... Como se ve, a nogáo de misericordia é afim
& de gratuidade, valor cada vez mais raro «m nossos dias. Nao
resta dúvida, porém, de que a gratuidade ou a nao procura de
lucro há de ser também urna dimensáo da vida sem a qual o
homem deixa de ser gente para tomar-se pega de engrenagem
cega e desumana.

Possa o novo ano beneficiar-se deste pregáo da misericor


dia e possam os homens valorizar devidamente este peregrino
predicado, que preservará a sociedade de maiores violencias e
desatinos!
E.B.

— 2 —
PERGUNTE E RESPONDEREMOS»
Ano XXII — N» 253 — Janeiro da 1981

Qual seria

o sentido da vida?
Em finiese: O Indiferentismo religioso ó fenómeno cada vez mala
alastrado. Por motivos diversos, multas e mullas pessoas julgam que nao
merece atencfio o problema de Deua e da Rellglfio. Todavía é de notar que
o problema de Oeus ó tao vital quanto a questflo do sentido da vida; ele
coincide com as perguntas: Donde vimos? Para onde vamos? Por que
sofremos? Por que morremos?...

Estas Indagac&es, as quals Interpelam todo homem que leve a serlo


a sua vida, tóm recebldo respostas da ciencia e da filosofía... Da ciencia
esperam mullos homens a elucldacfio das suas dúvidaa e o afastamento
dos males que os afllgem; todavía esta esperance é desmentida pelo que
acontece em países de tecnología e organizado social evolufdas como Ó,
por exemplo, a Suócla; nesta o número de suicidios é crescente, porque
o homem se senté so, embora cercado de semelhantes; o vazlo do Indi
viduo nao é preenchldo pelos beneficios da técnica e do conforto. A filo
sofía, ou melhor, as filosofías apresenlam um leque de respostas ao homem,
varias délas materialistas (e frustrativas por este motivo), outras dualistas
(avessas ao corpo e & materia — o que é artificial).

Existe também a resposta filosófica teísta, que ó completada pela


RevelacSo crista. Esta aprésenla a segulnte 6intese:

Existe o Transcendental ou Deus, como existe o polo Norte que atral


a agulha magnética. Sam polo Norte neo se explica a "Inquletacfio" da
agulha.

O homem so existe por um ato de amor gratuito do Criador; esse


amor ó Irreverslvel, porque divino, de modo que o homem o encentra Ina-
balável, mesmo depols das mals graves faltas. A grande vocacáo do homem
ó a de voltar para Deus através das estradas desta vida.

A nossa vida terrestre ó comparávet a urna gestacBo consciente que


nos prepara para a segunda natlvidade ou para o nosso pleno nasclmento.
Se no selo materno a crianca e IrresponsAvel por aua estatura, no decorrer
desta vida o homem 4 autor da eua sorte definitiva.

Esta perspectiva nao desobriga o ser humano de trabalhar fielmente


neste mundo como mediador entre as criaturas Inferiores e o Criador.

— 3 —
4 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 253/1981

O sofrimento é a conseqüéncla da desordem acairelada pelo homem


na obra de Oeus; closo de ser Igual a Deus, vé-se vlllma da sua arro
gancia. Todavía o Redentor assumlu adore a morte do homem o as
transfigurou.

A luz destas verdades, a morte ó consumacfio.

Comentario: Já temos aludido em PR ao fenómeno do


indiferentismo religioso, que em muitos países se substitui ao
ateísmo militante. Nos Estados Unidos, na Escandinávia, no
Japáo contam-se aos milhóes aqueles que, embora nao sejam
hostis á religiáo, se dizem desinteressados do problema reli
gioso.

O fenómeno da apostasia em relagáo á religiáo comecou


no séc. XVH[ com o racionalismo dos filósofos franceses (os
enciclopedistas Voltaire, Diderot, D'Alembert), alemáes e in
gleses (iluministas). Já em 1748 escrevia o filósofo materia
lista De La Mettrie: «O mundo nunca será feliz a menos que
seja ateu». A apostasia prolongou-se no sáculo XIX, assumindo
diversas formas: o positivismo de Augusto Comte (t 1857), a
esquerda hegeliana de Feuerbach (f 1872), o socialismo ateu'
militante de Marx e seu precursor Engels (t 1895); o evolucio
nismo materialista de Darwin (t 1882) e Spencer Ct 1903), o
voluntarismo desesperado de Friederich Nietzsche (t 1900) e
Schopenhauer (f 1860). Nietzsche, por exemplo, referindo-se
aos cristáos dizia: «O cristáo é um inútil, um separado, um re
signado, é estranho ao trabalho da térra».

As últimas expressóes do fenómeno no séc. XX sao o pan-


sexualismo de Freud (t 1930), o hedonismo ou o culto do pra-
zer, as ideologías comunista, fascista, nacional-socialista, ra
cista. ..

Hoje em día essas tendencias anta-religiosas tomaram no


va forma, que nao excluí as anteriores, mas se vai alastrando
como sendo mais cómoda, porque nao implica militáncia algu-
ma: a do indiferentismo. — Ora é precisamente esse indiferen
tismo, táo propagado em nossos dias que interessa levar em
conta, procurando aprofundar o seu significado. É o que vamos
fazer ñas páginas que se seguem.

— 4 —
O SENTIDO DA VIDA ?

1. O fenómeno do indiferentismo
Podem-se registrar diversas facetas do Indiferentismo reli
gioso em nossos días.

1) Há os que nao dáo o mínimo de atencáo ao problema


religioso, porque estáo «atolados» no trabalho e ñas obriea.
coes sociais, de tal modo que nao Ihes resta tempo para encarar
a questao religiosa. Sao pessoas que vivem constantemente fora
de si mesmas, vítimas do ritmo frenético da vida, mas que, em
ultima instancia, estáo contentes por nunca se encontraran
consigo mesmas e com a própria consciéncia, porque isto as
podena «assustar» ou levar a urna certa desinstalacáo ou mu-
danga de vida.

2) Outros nunca foram sacudidos pela vida e, conseqüen-


temente, obrigados a sair de certa leviandade rotineira. Talvez
sejam pessoas «vazias» em seu intimo e, por isto, neoessltadas
de encher a vida com coisas que Ihes prometem Ilusoria satis-
facáo: a conquista e o uso do dinheiro que nunca basta, a orna-
mentacáo da casa com mil objetos inúteis, a carreira ameacada
por obstáculos, a moda que tiraniza e obriga a constantes mu*
dancas

3) Outras ainda há que colocaram para si o problema re-


ligoso, ainda que talvez sem grande esforco, mas que julgaram
náo_ dever «perder tempo» com Cristo, pois religiáo seria um
fenómeno ultrapassado ou um acervo de historias e práticas
obscurantistas (embora muitas dessas pessoas tenham sua
crenca no «horóscopo» ou nos porte-bonheur ou nos talismás
ou evitem o n» 13).

. Perguntamo-nos agora:

2. Fó nao é problema ?

Na verdade, o problema de Deus é vital, porque vem a ser


o problema do sentido da vida humana; por Isto também quem
se interroga sobre o significado da sua vida, nao pode deixar de
encarar o problema de Deus com seriedade.

Com efeito. Todo homem, em sua existencia, vé-se obri-


gado a se defrontar com varios desafios imediatos: o da subsis
tencia, por exemplo, que cnvolve alimentacáo, habitacáo, cura
6 cPERGUNTE E RESPONDEREMOS» 253/1981

de doencas. Há, depois, os problemas do trabalho, da profissáo,


da familia, da ddade ou da política..., que constituem um con
junto de serías preocupagóes...

Acontece, porém, que há um problema radical ou funda


mental, que é o do homem; tudo o que o homem faz, deriva o
seu sentido daquilo que o homem é. De fato, pergunta-se: quem
é o homem que trabalha, constrói, luta, sofre e morre? Por que
trabalha e padece? Donde veio? Para onde vai após a morte,
Ou esta p5e fim, a tudo o que ele é e faz? Sao estas as pergun-
tas supremas e decisivas as quais nenhum homem pode fugir.
Aqueles que nao as concebem, arriscam-se a levar urna vida su
perficial e rotineira; somente os seres infra-humanos nao con
cebem as perguntas relativas aos grandes porqués e para qués
da vida.

Se o problema do sentido da vida é «vital», e nao Ihe pode


escapar quem realmente queira viver consciente e profunda
mente, examinemos algumas das respostas mais freqüentemen-
te dadas a tal problema.

3. A resposta da ciencia e da técnica

Há quem julgue que a ciencia poderá responder as gran


des indagagóes do homem e propordonar-lhe paz e felicidade.
Quanto á técnica, que decorre do progresso da ciencia, ela seria
apta a oferecer ao homem comodidade e bem-estar.

Ora, na verdade a ciencia como tal nao chega a colocar as


grandes e supremas interrogagóes do homem; se o fizesse, ela
se tornaría filosofía, salndo da sua algada sem ter métodos
adequados para enfrentar as indagagóes da filosofía. Assim,
por exemplo, a biología, que é a ciencia da vida, procura saber
como a vida teve origem, como se desenvolve e multiplica, mas
ela (como ciencia biológica) nao pergunta por que a vida existe
e qual o sentido do fenómeno da vida, pois tais problemas fo-
gem ao campo de competencia da ciencia biológica. Mais aínda:
a biología só pode estudar os viventes corpóreos materiais; caso
haja viventes nao corpóreos, a biología nao os atinge, ela nao
pode dizer nem mesmo se existem ou nao. Eis por que nao tem
sentido dizer que a alma nao existe, pois nenhum biólogo ou
nenhum médico jamáis a encontrou na ponta do seu bisturí; na
verdade, a alma, como ser espiritual, pertence a outro plano
que nao o da materia; ela nao é materia mais sutil do que os
outros tipos de materia, mas simplesmente nao é materia.

— 6 —
O SENTIDO DA VIDA ?

Alias, urna prova de que a ciencia e a técnica nao satísfa-


zem as aspiragóes mais fundamentáis do homem nem respon-
dem aos interrogativos mais profundos, é a situagáo de países
tecnológicamente evoluidos como os Estados Unidos, a Suécia
e o Japáo. A propósito da vida na Suécia/ a revista espanhola
Cambio 16 publicou interessante crónica com o título «Suecí-
darse> (palavra que funde Suécia e Suicidio). Passamos a
apresentar essas observagóes em traducáo brasileira:
"Vlnle e dols dentro cem mil suecos se sulcldam porque tem casa
e carro próprlos, poucas horas de trabalho por día, riqueza material a
multo tempo llvre, segundo o esludo Gente en crisis, editado pelo Depar
tamento social do Sindicato de Empregados. O número de suicidas ' de
resto, ó duas vezes malor do que o das vitlmas de desastres de automóvel.
Os dados sao sombríos. Entre os motivos que duas mil pessoas en»
contram para malar-se todos os anos, os autores do trabalho pfiem em
prlmelro lugar a solldfio.

Além disto, o Ingresso da mulher no mundo allanado do trabalho


colocou-a em condlgSes de carencia Idénticas ás dos homens. Nos últimos
vlnte anos o índice de suicidios femlnlnos sublu de 100 %, ao pasao que
o de masculinos aumentou de 25%. NSo somonte Isto: as mulheres se
salvam, por ora, em vlrtude da sua relativa falta de eficacia para tirar a
vida a si mesmas, pols sfio tres vezes mals numerosas aa que tentam o
suicidio do que as que morrem.
Leve-se em conta também que 03 (ndlces xifio sfio de toda conflanca.
O pudor e a pouca simpatía das Companhlas de Seguros para com o
suicidio levam a tachar de acldentes automoblllstlcos mullos casos de eul-
cfdlo. Asslm, com a chegada da primavera e o degelo dos lagos, é fre-
qOenle sublrem os números de afogados, os quals na verdade nfio serlam
senfio suicidas, cu|o flm trágico ó encoberto pela mentira Imposta por nor
mas soclals.

lA malor porcentagem de suicidios — revela Gente «n crftl» — ocorre


entre os homen3 de 40 a 85 anos e entre as mulheres de 45 a 60 anos.
Os grupos mals atetados sio os dos alcoóllcos, drogados, enfermos a divor
ciados (nessa ordem). As pessoas ae matam mals ñas grandes cldadas
do que no campo; o (ndlce de suicidas em Estocolrao, por exemplo, *
longo o dobro do de todo o país.
Um exame dos dados estatfstlcos leva os estudiosos a verificar que
o suicidio ó o resultado de um ato refletldo e n&o de um Impulso. Vlnte
por cento dos que se sulcldam delxam cartas de despedida; alta porcenta
gem mata-se depols de ter estado com seu módico ou psiquiatra; os fami
liares nfio parecen) surpreender-se com a declsfio; apenas observam: *£s-
tava multo deprimido*. 'As coisas nfio Ihe lam a contento'.
Atualmente um mtlhfio de suecos vtvem solitarios. O número nfio delxa
de aumentar porque a casa própria delxou de ser um luxo... Em aeus
tempos de lazar, os suecos, ajudados por seus recursos meteríais, torna-
ram-se Individualistas: passelam, patlnam, praticam o esquí ou navegam
solitarios o silenciosos, segundo as conclusOes do estudo, que tambám
afirma: 'O atcoóllco se suicida quando perde o último contato de relaclo-
namento pessoal com os seus semelhantes'.

_ 7 _
8 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS> 253/1981

Visto que aa causas do suicidio estfio multo ligadas és condicGes da


vida na Suócia, parece Imposslvel extlrpá-las. O diario Dagens Nyheter de
Estocolomo lancou urna célica proposta em editorial, sugerlndo o aumento
das horas de trabalho diario ou urna reducáo das comodidades postas á
dlsposIcSo do público... Todavía os observadores mals realistas exprímem
o seu pGssImlsmo: 'Nfio há solucfio, dlzem; será sempre assim: as socie
dades desenvolvidas terfio que acostumar-se ao suicidio e conslderá-lo como
um dos numerosos a Indesejávels efeltos do progresso'".

Estas observagóes sugerem dois comentarios:

1) A solidáo é o grande mal do homem num mundo que


se vai povoando cada vez mais. ó paradoxo! Os individuos se
isolam uns dos outros, embora estejam cercados de gente. £
por qué? Em parte, porque cada qual se deixa absorver por
seu pequeño mundo e seus interesses pessoais ou, também, por
que tem medo de que os outros o perturbem e desinstalem.
Por ironía, esse fechamento cprotetor» e «tutelar» nao acarre-
ta matar felicidade ou paz para a pessoa que se fecha, mas, ao
contrario, dá-lhe a impressáo do vazio e da solidáo, que se
tornam mortais para o homem. Vé-se que este tem que esco-
Iher entre o culto egoísta dos bens manteriais ou o servigo aos
irmáos. Isto nao quer dizer que nao seja possível possuir bens
materiais e sentir-se feliz; mas para tanto é necessário que os
bens materiais nao tornem pesado e gorduroso o coracáo do
homem (adjetivagóes bíblicas), mas, antes, concorram para tor-
ná-lo mais livre e generoso. — Ora urna tal atitude difícilmen
te se consegue se nao se tem urna motivacáo de ordem trans
cendental, ou seja, o amor a Deus como fundamento do amor
ao próximo.

2) O artigo termina chamando a atengáo para o fato de


que a crescente onda de suicidios na Suécia está muito vin
culada ás condigóes de vida da populagáo local. Há quem diga
que doravante as perspectivas da sociedade de consumo incluí-
rao a nota marcante do suicidio. Esta prospectiva é profunda
mente dolorosa. — Deve-se dizer, porém, que progresso da
civilizagáo e suicidio nao sao elementos necessariamente asso-
ciados entre si; o primelro de per si nao implica o segundo. A
associacáo só ocorre se o homem perde a visáo do sentido do
progresso material ou se esquece de que as conquistas mate
riais devem ser o trampolim para a ascensáo ao plano dos bens
definitivos e transcendentais.

Pode-se, pois, concluir que por certo o progresso da ciencia


e da tecnología é insuficiente para proporcionar ao homem as
respostas atinentes ao sentido da vida.

— 8 —
O SENTIDO DA VIDA ?

Examinemos agora as respostas que a filosofía, ou seja, o


uso da razio natural, sem fé, oferece ao homem a respeito das
mesmas questóes.

4. As respostas da Filosofía

A filosofía, sem dúvida, procura ultrapassar as causas


imediatas de cada fenómeno, para descobrir as causas últimas
ou supremas; ela tem por objetivo colocar cada fato e cada
valor no conjunto dos fatos e dos valores em sintese harmonlo-
sa. Todavía acontece que nao há urna filosofía, mas multas
filosofías. Principalmente a partir do sáculo XVI cada pensa-
sador tende a trilhar seu caminho próprio, resultando daí que
muitas vezes os sistemas filosóficos se destroem mutuamente e
chegam a conclusóes contraditórias. Em conseqüéncda, muita
gente, diante das propostas da filosofía, toma urna das duas
atitudes: o relativismo (tanto faz urna como outra) ou o ceti-
cismo (nenhuma atinge a verdade). É o que explica que já se
tenha falado do «escándalo da filosofía». Percorramos rápida
mente as principáis respostas dos filósofos:

1) ¡Materialismo: Há quem diga que só existe materia.


Deus nao existe; quanto ao chamado «espirito», é redutível á
materia. Por conseguinte, nao há vida postuma: o homem vive
e morre como os demais viventes, e, como estes, desaparece no
nada. Por feto o sentido da vida consiste em procurarmos ser
o mais possível felizes com os bens desta térra.

2) Positivismo e nopositivismo. Esta escola ensina que


nao se deve procurar o que fica para além da percep;áo dos
sentidos. Indagar qual seja o significado da vida nao tem pro*
pósito, porque só se pode falar do que se consegue experimentar
e averiguar científicamente. Por conseguinte, nao tem cabi
mento falar de Deus, do espirito, de vida postuma e de voca-
£áo transcendental do homem.

3) Idealismos Os filósofos desta escola afirmam que o ho


mem só conhece as suas próprias idéias. O conhecimento, por-
tanto, nao tem valor objetivo. Mais amplamente, dizem: é o
próprio homem quem cria os seus valores e realiza em absoluta
liberdade a imagem que ele projeta de si mesmo e para si mes-
mo. Tome consciéncia disto, c nao pretenda realizar padrees
objetivos ou atingir metas transcendental porque estas esca-
pam ao seu conhecimento.

— 9 —
10 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 253/1981

4) Panteísmo. Esta corrente de pensamento identifica o


homem com a Divindade. Entre as varias formas que ela assu-
me, urna das mais freqüentes afirma que a Divindade se acha
apoucada ou diminuida dentro do corpo ou da materia, de sorte
que o sentido da vida terrestre consiste em libertar do corpo a
centelha divina que está dentro do homem ou que é o homem
propnamente dito. Esta perspectiva está associada a duas teses
filosóficas:

a) o dualismo, segundo o qual a materia e o mundo visí-


vel sao algo de mau. Os únicos valores sao os do espirito. Este
se acha encarcerado dentro da materia, que impede a sua plena
expansáo. Em conseqüencia, tal escola filosófica nao tem inte-
resse pelo progresso da civilizacáo; antes, vinculam o homem á
materia e ao mundo, quando na verdade todo o afá do homem
deve consistir em desprender-se de qualquer relacionamento
com a materia.

b) o reencamacionacionismo. Se o homem é a própria


Divindade, está claro que ele nao espera de Deus a sua ealva-
gáo, mas a espera de si mesmo. E, se o homem nao consegue
salvar-se ou libertar-se interiormente do apego á materia e aos
bens materiais numa só vida ou encarnacáo, terá que se en
carnar de novo e passar outra vez pela vida terrestre; isto se
repetirá tantas vezes quantas forem necessárias para possibi-
litar ao individuo a sua total purificagáo ou renuncia aos afe-
tos terrenos.

Refletindo sobre as quatro respostas filosóficas que acá-


bam de ser enunciadas, podemos dizerj

As tres primeiras (materialismo, positivismo, idealismo)


cortam qualquer perspectiva de transcendencia, deixando o ho
mem confiado ao regime do visivel, material e transitorio. Por
certo, nao satisfazem á aspiragáo inata que temos para a vida,
e a vida sem fim, nem corresponden! ao testemunho de todos
os povos que, da antigüidade até nossos dias, admitiram a vida
postuma.

A quarta resposta (a panteista-reencarnacionista) supóe,


em grau mais ou menos explícito, o dualismo entre a materia
e o espirito, condenando a materia á rejeicao, como sendo ele
mento aviltante e degradante da centelha divina que é o cerne
do homem. Ora o dualismo é antinatural ou artificial, visto
que o oorpo faz parte integrante da natureza do homem; sem
o corpo, a mente nao adquire idéias nem concebe afetos.

— 10 —
O SENTIDO DA VIDA ?

5) Teísmo. Existe também urna filosofía teísta, isto é


que professa a existencia de Deus e do transcendental. Toda
vía, sendo filosofía ou obra da razáo entregue táo somente ao
seu acume natural, nao consegue penetrar a fundo na realidade
do homem e da vida. Por isto, ela tem sido completada pela
revelagáo que o próprio Deus fez de si ao homem. Assim ee
origina a síntese ou a resposta crista. [

Alias, é de notar que já Platáo (t 347 a. C), embora reco-


nhecessc o valor da razáo para desvendar o misterio do hoinem
(a questáo da imortalidade da alma), julgava que a razáo é
como urna pobre jangada, que nos leva a atravessar o mar da
vida com riscos ou perigos para nos; seria melhor, dizia ele,
fazermos o trajeto com mais seguranga e menos perigo, usan
do mais sólida embarcacáo, ou seja, seguindo urna revelagáo
divina (Fedon c. 35c-d). Ora é precisamente esta mais sólida
embarcacáo que leva os pensadores cristáos a responder com
seguranga as grandes questoes atinentes ao sentido da vida.

Vejamos, pois, as grandes linhas da sintese crista.

5. A síntese cristo
Eis os principáis pontos que compóem a resposta crista.
1) O transcendental (Deus). A sintese crista afirma a
existencia de Deus... Entre as numerosas razóes desta afir
mativa, salientamos as de ordem antropológica. Onde há pola-
rizagáo, existe polo; se a agulha mangnética é inquieta e atraída
por algo invisivel, existe esse invisivel, que é o polo Norte; ele
é real, embora os sentidos nao o vejam mediatamente. Ora o
homem é atraído naturalmente (nao em virtude dos artificios
de alguma cultura ou escola) para a Vida, a Verdade, a Feli-
cidade, o Amor, a Justiga, a Paz... Por conseguinte, estes va
lores que atraem, devem existir; existe, sim, um ser que é a
Plenitude ou o Ser propiciamente dito, e que é, ao mesmo tempo,
a Verdade, o Amor, a Vida, etc. Sem tal Ser, nao se explica o
misterio do homem; este seria urna agulha magnetizada sem
polo Norte — o que é absurdo ou contraditório.

2) O homam. A razáo pela qual o homem e, com ele, o


mundo existem, é, sem dúvida, a bondade de Deus. Este, sendo
o ser absolutamente perfeito, nao tinha necessidade de criar.
Se criou, foi porque quis fazer a criatura participante da sua
vida e felicidade. Diziam os neoplatónicos: «O bem é difusivo

— 11 —
12 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 253/1981

de si». Ora, se Deus é o Sumo Bem, Ele é sumamente difusi


vo de Si. — Há, pois, na raiz da existencia de cada ser hu
mano um ato de benevolencia gratuita ou um ato de amor de
Deus, que quer bem sem compensagáo ou sem interesse egoísta.
Esse ato de amor é irreversível; é Sim urna vez por todas, dado
que Deus nao pode ser Sim e Ná» ou nao se pode contradizer
nem retratar; mesmo que o homem vacile ou se afaste, ele
pode encontrar esse amor inabalável do Criador desde que re-
solva voltar a Este. Esta verdade será útil, mais adiante, para
se ilustrar o sofrimento humano.

O homem criado benévolamente por Deus é chamado a


participar da vida divina para todo o sempre. Ele procede de
Deus (por criacáo) como ser embrionario e retorna para Deus,
através das estradas desta vida.

3) A vida presente é, pois, concedida como um cami-


nhar para a «Casa do Pai» ou para a Plenitude da Vida, da
Verdade, do Amor... Ela pode (e deve) ser comparada a urna
gestacáo; com efeito, o ser humano só nasce plena e definitiva
mente no termo da sua vida terrestre. Entre o nascimento pa
ra a luz do sol e o nascimento para a luz da eternidade, vai-se
formando a personalidade e váo-se desabrochando as virtuali
dades desta; a gestacáo no seio materno (onde a crianca está
oculta e inconsciente) se prolonga no decorrer desta vida ter
restre umbrátil ou claro-escura, só terminando no dia em que
o homem é prpjetado diretamente para a luz sem fim e defini
tiva. Se no seio materno a crianca nao é responsável por sua
formagio ou construcáo, já no decurso da segunda gestacáo
• o homem é, via de regra, responsável pela sua estatura e confi-
guracáo definitiva.

4) Se realcamos o caráter provisorio e passageiro desta


vida (o que, alias, é evidente á própria experiencia), nao que
remos dizer que o ser humano se possa considerar descompro-
missado em relagáo <a realidade deste mundo. É mediante o
exercício da sua missáo de mediador ou de sacerdote entre o
mundo material e Deus que o homem se realiza ou desabrocha
as suas virtualidades e atinge a plenitude da sua estatura. O
Criador entregou ao homem o mundo ainda embrionario para
que este continué a obra do Criador. Tal é o sentido do traba-
Iho humano; é digno e nobre, ainda que bragal e servil. O
homem nao há de trabalhar segundo seus caprichos, mas
procurará construir um murdo melhor, mais oonsentáneo com
os designios de Deus, que sio de amor, justica e fraternidade;

- 12 - -"'*
O SENTIDO DA VIDA ? 13

trabalhar contra este plano, ou seja, a servlco do egoísmo e do


odio é desfigurar o trabalho e tomá-lo obra satánica, da qual
só podem resultar dissabores e amarguras para o trabalhador.
5) O sofrimento há de ser considerado neste contexto de
otimismo. Resulta da desordem introduzida pelo homem na
obra do Criador, por abuso do livre arbitrio. Ele quls ser < co
mo Deus» (Gn 3,5) ou auto-suficiente.
É natural, pois, que, tendo desejado assumir por sobarba
urna posicáo que nao Ihe compete, o homem sinta as conse
qüéncias da desordem acarretada. Todavía o sofrimento, em-
bora suscite sempre interrogacóes ao homem, nao é simples-
mente um enigma indecifrável; o próprio Deus se dignou de
assumir a sorte dolorosa e mortal do homem, a fim de trans
figurar tal reaiidade; assim o homem sofre justamente, mas oom
a esperanga, ou mesmo a certeza, de que tal sofrimento, asso-
ciado ao de Cristo, é passagem para a ressurreiQáo e a gloria.
Em sintese: o sofrimento é explicado pelo Cristianismo como
consecuencia do pecado, mas é transfigurado pela presenta da
misericordia do Senhor, que faz da dor um instrumento de pu-
rificacáo e santificacáo. É esta, entre todas as explicares dadas
ao sofrimento, a mais plausível. A que recorre ao dualismo,
admitindo um Principio Subsistente do Mal, é antifilosófica
(pois o mal é sempre urna carencia e nunca um ser positivo).
A última atitude da filosofía perante a dor é a da angustia e
do desespero, de que dá testemunho o existencíalismo ateu; o
homem ve a vida como algo de absurdo, e tira as conseqüéncias
dessa perspectiva. Ao invés, a visáo crista, embora reconhega o
que tem de horrendo o sofrimento, sabe integrá'lo numa síntese
de otimismo.
6) Após quanto foi dito, a morte aparece como consuma-
Cáo, e nao como ruptura da vida. É o término da gestacáo e a
segunda ou definitiva natividade do ser humano. O cristáo olha
para ela nao como para algo de meramente negativo, mas como
algo que o ajuda a avaliar cada um dos bens que Ihe ocorre;
cada um destes só tem sentido se contribuí para que o cristáo
se encontre.mais livre e mais consciente, com o Bem Infinito
no fim da sua peregrinacáo terrestre.
Eis em poucos tópicos a resposta crista & questáo do sen
tido da vida humana. É harmoniosa; todavía a sua veracidade
só se comprova plenamente pela experiencia ou pela vivencia
concreta e fiel da mesma.

Para confeccionar esle artigo, em parta nos valemos do editorial da


revista "La Clvllta Cattollca" rfl 3038, de 15/01/1977, pp. 105-114.

— 13 —
A patarra do Papa:

joao paulo II aos sacerdotes

6m slnlese: A hornilla de Joño Paulo II aos sacerdotes em 2/07/ao


pos em relevo os seguintes traeos do sacerdocio ; Ies em ¿/07/B0

1) O sacerdote nfio ó um funcionarlo da comunldade


ízzlz&íxp • "MIl • £
BOr

2) Por Isto o ministerio do sacerdote é de índole essenclalmenh*


religiosa ou espiritual^ Se qulser ser fiel a si mesmo, jamáis £H IdeSl-
r^^f..0*0"1 uS. lun«?8es *» um médico, de um asslstente social ou de um
slndcallsta. Hoja em día exlstem proflsslonais formados para exercer tais
dSSáSLJÜ
delxará aberta Padre.a8 aS8rlr>
urna lacuna pondonadesocledade.
Importante lad0 ° seu
polsministerio
o homem reSlosS
dei Me
wn BraJn. " C°m° Pfi0> de áflUa e da ar' informe XTa Wemer
3) Já que a mlssfio do padre é tfio Importante e necessárta na
'oreja e na sociedade pluralista de nossos días, Impfie-se o zeto pelas
vocacaes facerdotals Destas depende o futuro religioso do B?asíl Embora
experimente™ dificultades para propor o Ideal sacerdotal aos JovenTcon-
temporáneos, ó preciso que os ministros nfio esmorecam; nim Mguem
S«?fl'i rñSnd° f'aciltór|o o« Pleiteando a extlnSfio do ceHbato sK
£££;.£ 5 Lm at?lr i"fls »oca5°88 Pa« o sacerdocio. Na verdade. a Ju-
ventude de hoja nao delxa de experimentar atrasSo pelos grandes Ideáis
que arduamente se conquistan; a experiencia enslna que, nos país» i
S°a, lSS5L™¡f",Id0?1 * vMda oCOm
precisamente al prospera mals desacrlíícl°
número vocacñese omsacerdotals
meloa m^

Oomentátío: Aos 2 de julho de 1980, o S. Padre Joáo


Paulo H procedeu á ordenagáo sacerdotal de mais de setenta
diáconos, aos quais propós em homilía as grandes linhas do sa-
cerdódo. As palavras de S. Santidad© visaram a avivar nos jo-
vens levitas a consciéncia do giande dom que estavam para re-
ceber; ao mesmo tempo, seniram de meditacáo a todo o povo
JOAO PAULO II AOS SACERDOTES 15

de Deus, em cuja perspectiva a imagem do sacerdote as vezes


se pode confundir com a de outros agentes ou profissionals da
vida contemporánea.

Dada a utilidade de tal alocucáo, passamos a resuml-la;


após o qué, lhe proporemos breve comentario.

I. O SACERDOCIO

«Quem sou eu? Que se requer de mam? Qual a minha ldén-


tídade?», eis perguntas que afloram á mente do sacerdote nu-
ma fase de choques e contrachoques da historia da humanidade.

A resposta a tais indagagóes nao há de ser procurada ñas


ciencias do comportamento humano nem ñas estatisticas socio-
-religiosas, mas, sim, em Cristo e na fé. É o Divino Mestre que
elucida «quem somos nos, como ele quer que sejamos, qual é,
diante dele, a nossa verdadeira identidade».

Tres sao os aspectos do sacerdote que vem ao caso propor


á guisa de resposta imediata.

1. Chamados...

«Urna primelra resposta nos é dada imediatamente: somos


chamados. A historia do nosso sacerdocio comeca por um cha-
momento divino, como aoonteceu com os Apostólos».

«Somos chamados por Cristo, por Deus. O que quer dizer:


somos amados por Cristo, amados por Deus», independente-
mente de classe social (cf. ICor 1,27) e de entusiasmos super-
ficiais (cf. Mt 8,19-22).

A vocagáo ao sacerdocio implica um convite a participar,


de modo todo especial, da amizade do Senhor Jesús: «Já nao
vos chamo servos, porque o servo nao sabe o que faz o seu
Senhor. Eu vos chamo amigos, porque vos dei a conhecer tudo
o que ouvi de meu Pai» (Jo 15,15).

«O chamamento ao sacerdocio... provocou a grande e


irrevogável opcáo da nossa vida e, portanto, a página mais bela
na historia da nossa experiencia humana. Nossa felieidade qon-
siste em nao a depreciar jamáis!»

— 15 —
Ifi <PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 253/1981

2. Consagrados...

A sagrada ordenagáo une o sacerdote a Cristo com vínculo


original, inefável, irreversível: torna-o consagrado.

Isto quer dizer que a missáo do sacerdote nao é de ordem


meramente jurídica. Com outras palavras: nao consiste num
servigo prestado á comunidade por delegagáo da comunidade e
revogável pela mesma comunidade ou servido a que possa re
nunciar livremente o «funcionario» da comunidade. Ao contra
rio, o sacerdote passa por real e intima transformacáo medi
ante um sinete divino ou caráter, que o habilita a agir in per
sona Christi (fazendo as vezes de Cristo); o sacerdote toma-se
assim instrumento vivo da agáo de Cristo.

Etn conseqüéncia, o sacerdote se acha num estado de ex


clusiva propriedade do Senhor. Nele nada há de que possa
dispor como se nao fosse sacerdote; mesmo quando realiza
agóes que, por sua natureza, sao de ordem temporal, o sacer
dote é sempre ministro de Deus. Nele tudo, mesmo o profano,
deve tornar-se 'sacerdotalizado', como em Jesús Cristo, que
sempre foi sacerdote, em todas as manifestacóes da sua vida.

«Jesús nos identifica de tal modo consigo que a nossa per-


sonalidade como que desaparece diante da sua, já que é Ele
quem age por meio de nos. É, sim, o próprio Jesús quem con
sagra o pao e o vinho em seu corpo e sangue; é Ele quem per-
doa os pecados; É Ele quem fala quando o sacerdote, exercen-
do o seu ministerio em nome e no espirito da Igreja, anuncia a
Palavra de Deus».

Assim a expressáo «o sacerdote é um outro Cristo» nao é


simples metáfora, mas, sim, maravilhosa, surpreendente e con
soladora realidade.

3. Enviados...

O sacerdote nao é sacerdote para si, mas para a Igreja e


para o mundo a ser salvo. Donde se segué que ele é um apos
tólo ou um enviado K

Dedicado total e irrevogavelmente ao servico da comuni


dade, o sacerdote cumpre sempre dupla fungáo: revestindo a

1A palavra apostólo vem o-> grego apostato, enviar.

— 16 —
JOAO PAULO II AOS SACERDOTES

pessoa de Cristo Mediador, ele é o dispensador dos misterios de


Deus junto ao povo, e junto a Deus é o representante do
povo em todos os seus componentes: criancas, jovens, familias,
trabalhadores, pobres, doentes..., adversarios; ele oferece as
súplicas, a alegría e a expiagáo do povo (cf. 2Cor 5,21). «Somos
embaucadores de Cristo» (2Cor 5,20).

Destes traaos fundamentáis do perfil do sacerdote seguem-


•se algumas conseqüéncias práticas.

4. Conseqüéncias práticas

Distinga-se a agáo do sacerdote no mundo eclesial e a agio


no mundo secular.

4.1. No mundo eclesial

A doutrina do sacerdocio dos fiéis, desenvolvida pelo Con


cilio do Vaticano II, redundou em vasta florescencia de minis
terios confiados aos leigos e merecedores de todo encoraja-
mentó.

Todavía isto «nao diminuí a importancia e a necessidade


do ministerio sacerdotal, nem pode justificar menor empenho
pelas vocagóes eclesiásticas. Menos ainda pode justificar a ten
tativa de transferir para a comunidade o poder que Cristo
conferiu exclusivamente aos ministros sagrados. O papel do sa
cerdote permanece insubstituivel. «Devenios, sim, solicitar de
todos os modos a colaboragáo dos leigos. Mas, na economía da
redencáo, existem tarefas e funedes — como o oferecimento do
sacrificio Eucarístico, o perdáo dos pecados, o oficio do magis
terio — que Cristo quis ligar essenciaimente ao sacerdocio, e
ñas quais ninguém, sem ter recebido a ordem sagrada, nos po-
derá substituir. Sem o ministerio sacerdotal, a vitalidade reli
giosa corre o risco de se cortar de suas fontes, a comunidade
crista o de desagregar-se, e a Igreja o de secularizar-se».

«É verdade que a graga de Deus pode agir de igual modo,


especialmente onde existe a impossibilidade de ter o ministro de
Deus, e onde nao há culpa no fato de nao o ter. É necessário,
porém, nao esquecer que o caminho normal e seguro dos betns
da redengáo passa através dos meios instituidos por Cristo e
ñas formas estabelecidas por Ele» (n' 6).

— 17 —
18 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 253/1981

Daqui se oompreende também a importancia do problema


das vocagóes, ao qual o sacerdote há de consagrar as primeiras
e mais desveladas preocupacóes do seu ministerio. Dele depen
de o futuro religioso da patria brasileira. As dificuldades no
cultivo das vocagóes nao devem levar ao desanimo:

«Também a juventude do nosso tempo senté poderosamen


te a atracáo para as alturas, para as coisas arduas, para os
grandes ideáis. Nao vos iludáis julgando que a perspectiva
de um sacerdocio menos austero ñas suas exigencias de sacrifi
cio e de renuncia — como, por exemplo, na disciplina do celi
bato eclesiático — possa aumentar o número daqueles que pre-
tendem comprometer-se no seguimento do Cristo. Pelo con
trario. É, antes, urna mentalidade de fé vigorosa e consciente
que falta e se faz necessário criar em nossas comunidades. Ali
onde o sacrificio cotidiano mantém despertó o ideal evangélico
e eleva a alto nivel o amor a Deus, as vocacóes continuam a
ser numerosas. Confirma-o a situagáo religiosa do mundo. Os
países onde a Igreja é perseguida sao, paradoxalmente, aqueles
em que as vocacóes fiorescem miáis, algumas vezes até em abun
dancia» (n» 6).

4.2. No mundo secular

O ministerio sacerdotal se exerce atualmente numa socle-


dade secularizada, que tende a eclipsar o sagrado. Em tal am
biente, o sacerdote é o sinal e instrumento do mundo invisivel.

O padre há de viver no mundo entre os homens, mas como


portador de realidade transcendental, de que ele é sinal.

«A forga do sinal nao está no conformismo, mas na dis-


tingáo. A luz é diversa das trevas para poder iluminar o cami-
nho de quem anda no escuro. O sal é diverso da comida para
dar-lhe o sabor. O fogo é diverso do gelo para aquecer os mem-
bros enrijecidos pelo frío. Cristo nos chama luz e sal da térra.
Num mundo dissipado e confuso como o nosso, a forga do sinal
esta exatamente em ser diferente. Ele deve destacar-se tanto
mais quanto a agao apostólica exige maior insergáo na massa
humana.

A este propósito, quem nao percebe que urna certa absor


gao da mentalidade do mundo, a freqüentagáo de ambientes
dissipantes, como também o abandono do modo externo de

— 1.8 —
JOAO PAULO II AOS SACERDOTES 19

apresentar-se, distintivo dos sacerdotes, podem diminuir a sen-


sibilidade do próprio valor de sinal? ' ■

Quando se perdem de vista estes horizontes luminosos, a


figura do padre se obscurece, sua identidade entra em crise,
seus deveres peculiares nao se justificam mais e se contradlzem,
se enfraquece a sua razáo de ser» (n» 7). i

Talvez, porém, diga alguém: «o padre é sinal pelo fajo de


ser o homem-para-os-outros». Na verdade, o ser-para-ós-oütros
nao é especifico do sacerdote.mas é tarefa de todo cristáo. O
padre é homem-para-os-outros em funcáo da sua peculiar ma-
neira de ser homem-pararDeus. O padre é para os outros na
medida em que se dedica a libertar as almas da escravidáo do
pecado e levá-las a Deus; ora isto só é possivel se, antes do mais,
o padre é o hometn-para-Deus.

Fique, pois, bem claro que o servido sacerdotal é essendal-


mente espiritual. Que isto seja hoje acentuado contra as mul
tiformes tendencias a secularizar o servico do padre, reduzin-
do-o a urna funcáo meramente filantrópica. O seu servico nao
é o do médico, do assistente social, do político ou do sindicalis
ta. Em certos casos, talvez, o padre poderá prestar, embora de
maneira supletiva, estes servicos e, no passado, os prestou de
forma egregia. Mas hoje eles sao realizados adequadamente por
outros membros da sociedade, enquanto o nosso servico se es
pecifica sempre mais claramente como um servico espiritual. É
na área das almas, das suas relacóes com Deus, e de seu rela-
cionamento interior com os seus semelhantes que o sacerdote
tem urna funcáo essencial a desempenhar. É aqui que se deve
realizar a sua assisténcia aos homens do nosso tempo. Certa-
mente, sempre que as circunstancias o exijam, ele nao se exi
mirá de prestar também urna assisténcia material, mediante as
obras de caridade e a defesa da Justina. Mas é, em defintivo,
um servico secundario, que nao deve jamáis fazer perder de
vista o servico principal, que é o de ajudar as almas a descobrir
o Pai, abrír-se para Ele e amá-lo sobre todas as coisas.
«Somente assim é que o sacerdote jamáis poderá sentir-se
um inútil, um falido, ainda quando fosse constrangido a renun
ciar a qualquer atividade exterior. O santo Sacrificio da Missa,
a oracáo, a penitencia, o melhor, antes, o essencial do seu sa
cerdocio permanecería integro, como o foi para Jesús nos trin-
ta anos de sua vida oculta. A Deus seria dada ainda urna glo
ria imensa. A Igreja e o mundo nao ficariam privados de au
téntico servico espiritual» (n« 7).

— 19 —
20 cPERGUNTE E RESPONDEREMOS» 253/1981

II. REFLETINDO...
A homilía de Joáo Paulo n nada diz de novo (nem o podía
dizer) ao propor o perfil do sacerdote. Retoma a mais genuína
doutrina da Igreja a propósito. O que, porém, a valoriza enor
memente, é o fato de Joáo Paulo n repetir a constante e insubs-
tituível teología do sacerdocio frente a modelos recentes que
podem descaracterizar ou «laicizar» a figura do padre.
Merecem especial relevo os seguintes tragos da alocucáo:
1) O sacerdote náo^é um funcionario da comunidade, de
legado por esta para exercer as suas fungóes e suscetível de
ser deposto ou de renunciar como qualquer funcionario.
O sacerdote é, sün, urna pessoa de quem Cristo toma posse
pelo caráter sacramental, habiütando-o a realizar as fundes
que Cristo Sacerdote exerce; nao é o padre por suas virtudes
que age, mas é Cristo quem através dele age, quando se dá a
consagracáo eucarística, a remissáo dos pecados, a pregagáo da
Palavra de Deus...

2) Por isto o ministerio do sacerdote é de índole essen-


dalmente religiosa ou espiritual. Se quiser ser fiel a si mesmo,
jamáis poderá identificar-se com as fungóes de um médico, de
um assistente social ou de um sindicalista. Hoje em dia existem
profissionais formados para exercer tais tarefas; se o padre as
assumir, pondo de lado o ministerio religioso, deixará aberta
urna lactina importante na sociedade, pois o homem de hoje
precisa de Deus, como de pao, de agua e de ar, conforme dizia
Wemer von Braun. «O papel do sacerdote permanece insubsti-
tuível... Sem o ministerio sacerdotal, a vitalidade religiosa
corre o risco de se cortar de suas fontes, a comunidade crista o
de desagregar-se e a Igreja o de secularizar-se».
3) Já que a tnüssáo do padre é táo importante e necessá-
ña na Igreja e na sociedade pluralista de nossos dias, impóe-se
o zelo pelas vocacóes sacerdotais. Destas depende o futuro reli
gioso do Brasil. Embora experimenten! dificuldades para pro
por o ideal sacerdotal aos jovens contemporáneos, é preciso que
os ministros nao esmorecam; nem julguem que, recorrendo ao
facilitado ou pleiteando a extincáo do celibato sacerdotal, po-
deriam atrair mais vocacóes para o sacerdocio. Na verdade, a
juventude de hoje nao deixa de experimentar atragáo pelos
grandes ideáis, que arduamente se conquistam; a experiencia
ensina que, nos países em qae a missáo sacerdotal é vivida com
mais sacrificio em meio a maiores riscos, precisamente ai pros
pera o número de vocagóeá sacerdotais.

— 20 —
"Quando sou fraoo, entáo ó que sou forte":

e a igreja na rússia soviética?

Em Píntese: Os crlstfios na Rússia estío sujeltos a cruel parseguIcSo,


que, segundo o Estado soviético, nao existe, porque a Conslltulcflo assegura
a liberdade de creídas (como assegura a llberdade de nSo crer e de mover
propaganda antl-rellglosa). A resistencia dos fiéis russos a essa dolórosa
sltuacfio lem sido notavel, ao mesmo lempo que é enlraqueclda por corto»
fatoies próprlos da realldade da Igreja russa: 1) a espiritualidad? russa
é multo marcada pelo tema da "luga do mundo", que leva a se desligar,
em grau malor ou menor, das realidades temporals; 2) a fraca Instruyo
religiosa dos fiéis russos suscita urna pledade mals voltada para o mara-
vllhoso (Icones e Igrejas que se restauram por si mesmaa, por exemplo)
do que propiamente para as verdades centráis da fó; 3) certa tendencia
á subservléncla dos clérigos e dos liéis em relacfio ao Estado, resultando
disto Insuficiente resistencia a Injuncfies do Governo soviético; 4) corto
nacionalismo religioso, que se exprime no eslavofllismo e que desvia da
verdadelra realldade o olhar dos fiéis russos; o Ocldente estarla, mals urna
vez, acabrunhando a Rússia, pelo tato de ter "Inventado" o comunismo.

Apesar das dlficuldades que enfrenta, a tempera religiosa dos cría


teos russos ó forte, manifestando bem o trabalho da graca, que frutltlca
precisamente apesar e através da precarladade dos melos humanos de
resistencia.

Comentario: Muito se tem escrito sobre a Igreja na Rús


sia Soviética. Em vista do interesse que o tema desperta, pro*
remos abaixo algumas noticias que levaráo em oonta precisa
mente a evolucáo da situagáo da Religiáo naquele país.

Ao falar de Igreja na U.R.S.S., teremos em vista prin


cipalmente a chamada «Igreja Ortodoxa», que se separou de
Roma em conseqüéncia do cisma bizantino (1054). Após o cis
ma, a Igreja Ortodoxa Russa viveu sob certa dependencia dos
czares, herdeiros da mentalidade cesaropapista dos Imperado
res bizantinos. Este fato explica que até nossos dias as autori
dades religiosas russas sejam, de certo modo, propensas a co
laborar com o Estado soviético, como se dirá ñas páginas se-
guintes.

Quanto ao catolicismo na Rússia, sofre outrossim severas


restribes. Acontece, porém, que os católicos constituem urna
minoría religiosa na U.R.S.S., minoría que tenta desenvolver

— 21 —
22 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 253/1981

a sua vida dentro das condigóes que a situacáo política do país


lhe oferece.

1. Situaccío atud: traeos característicos

O panorama da Igreja Russa atualmente apresenta Cace


tas contrastantes:

1) Trata-se de comunidades dotadas de grande vitalida-


de em meio a circunstancias de extrema pobreza material e
inseguranca permanente.

2) A Igreja na Rússia sofreu a mais violenta perseguigáo


da historia recente; está sufocada pelas autoridades governa-
mentais. Tem as suas atividades reduzidas exclusivamente ao
culto sagrado. — Nao obstante, a perseguigáo religiosa oficial
mente nao existe na Rússia. A sufocacáo da Igreja é efetuada
eob a cobertura da separacáo da Igreja e do Estado e em
nome da Constituicáo do país. Ora, dado que esta Constituicáo
é a expressáo de urna «democracia modelar», nenhum cidadáo
tem o direito de denunciar as contradicóes da mesma, pois isto
seria um delito. Com outras palavras: na U.R.S.S. oficial
mente nao existe perseguigáo religiosa nem a pode haver!

2. Apostaste forcada das massas

Esta apostasia é o resultado de mais de sessenta anos de


regime soviético. A perseguicáo religiosa conheceu fases diver
sas, ora mais violentas, ora mais brandas. Com efeito, de 1917
a 1941 (inicio da guerra contra a Alemanha), a pressáo foi
muito dura. Durante a guerra e depois, até 1954 houve um
renascimento religioso; o Estado deixou de importunar os fiéis,
pois precisava de promover a uniáo nacional. Mas, sob o go-
verno de Krouchtchev, deu-se novo endurecimiento ideológico.
Em nossos dias, a perseguigáo parece menos aguda, mas ela nao
cessa, consütuindo mesmo urna característica da vida soviética.

A Constituicáo Soviética proclama a «liberdade de consci-


éncia» de cada cidadáo. Mas em termos paradoxais...: qual-
quer propaganda religiosa é considerada um delito, ao passo que
a propaganda anti-religiosa ou atéia é permitida como sendo
científica. Isto quer dizer que o ensino religioso as criancas
é ilegitimo, só se admitindo a catequese que opaiea máe de

— 22 —
A IGREJA NA U.R.S.S. . 23
■ (

familia queiram dar aos filhos. Toda cerimdnia religiosa ou


assembléia de oragáo fora dos lugares de culto ofidais é tida
como propaganda religiosa e, por isto, proibida como sendo um
delito. :

Para abrir um lugar de culto, urna «associacáo religiosa»


deve ¿presentar um requerimento a Comissáo de Assuntos Re
ligiosos do Comité Executivo (Ispolkom) do soviete local. O pe
dido deve ser assinado por vinte pessoas, no mínimo;1 que te-
nham dezoito anos ou mais. É levado por diversas..instancias
até o Conselho dos Ministros da República, o qual dey$ sübme»
ter a solicitacáo ao Conselho de Ministros da U.R.SÍ.S. Donde
se vé que a fundagáo de urna igreja numa aldeia minúscula se
torna problema de Conselhos e Ministros na Rússia!

Além disto, é preciso notar as represalias e sancóes a que


estáo sujeitos os cristáos praticantes, como, por exemplo, os
pais que mandam batizar seus filhos, ou as criancas que na
escola professam a fé. Sabe-se, de resto, que um jovem nao
inscrito no Komsomol tem dificuldades para entrar na Univer-
sidade (ora os membros do Komsomol fazem explícita profis-
sáo de ateísmo).

Além disto, a missáo da Igreja é truncada na U.R.S.S.


Com efeito, a Igreja se vé constrangida por lei a limitar euas
atividades á vida litúrgica; a assisténcia caritativa e promo
cional lhe é proibida, assim como a pregacáo da mensagem
crista. Para alimentar o clima de hostilidade, o Estado Soviéti
co ensina aos jovens ñas escolas que há «incompatibilidade»
entre a ciencia e a religiáo; um crente nao poderia ser um den
tista, e vice-versa.

Em tais condigóes, a vida da fé na U.R.S.S. parece re


servada a pessoas de rara fibra e energía. É o que explica a
apostasia das massas na U.R.S.S.

3. Renovasen religiosa

A destrulcáo sistemática dos valores classicos da fé na


U.R.S.S. nao impede um renascimento religioso que ultrapas-
sa as fronteiras da Igreja na U.R.S.S. Esse ressurgimento é
sustentado por pessoas dos mais diversos tipos de formacáo, de
origer.i social e de idade.

Como se explica esse renascimento?

— 23 —
24 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS> 253/1981

Varios sao os seus fatores. Assim, por exemplo:

— A populagáo russa parece estar sentindo alergia aos


discursos oficiáis dos seus govemantes, nao apenas por serem
monótonos, mas tambán por serem insuportavelmente menti
rosos. Sim ;o oratoria oficial do Partido afirma que a Revolu-
cáo fez recuar o mal de modo definitivo e instaurou o bem em
termos científicos. Ora a experiencia demonstra o contrario.
Assim muitas pessoas decepcionadas se questionam, procurando
saber se a solucáo nao estaría do lado dos valores clássicos do
Evangelho denegridos pelo comunismo.

— A própria propaganda atéia se apresenta por vezes de


maneira táo grosseira que se volta contra os seus próprios au
tores. Em conseqüéncia, o senso de Deus, em vez de ser apaga
do pela propaganda anti-religiosa, é táo somente purificado e
até reforcado em varios cidadáos.

— Outro elemento estranho é o seguinte:exaltando o pa


trimonio cultural russo, os intelectuais póem em relevo a arte
religiosa (especialmente a dos icones), pois o passado cultural
russo, documentado por seus monumentos, é quase exclusiva
mente religioso. «Nunca visite! tantas igrejas quantas na nossa
estada em Moscou>, disse um turista. Ora a qualidade dessa
arte religiosa desmente os slogans do Governo referentes á reli-
giáo como opio do povo e k esterilidade da Igreja. Também a
clássica literatura russa se presta a idénticas observacóes em
virtude dos seus numerosos temas cristáos. Ora as riquezas
culturáis do passado patentelam o mundo religioso e o seu alto
nivel de outrora.

Segundo as declaracóes oficiáis, as igrejas sao freqüenta-


tadas apenas por velhinhos, últimos sobreviventes de uma épo
ca ultrapassada, apos os quais as igrejas ficaráo vazias. Na rea-
lidade, porém, as igrejas, em vez de se ir esvaziando, continuam
por vezes cheias ñas grandes cidades. Isto quer dizer que os
velhinhos sao substituidos por outros velhinhos & medida que a
idade da aposentadoria se aproxima e os cidadáos se véem li-
vres dos encargos sociais da vida soviética (a participacáo
de reunióes, encontros, etc.). Mas nao sao os anciáos que
caracterizam a vida da Igreja russa; ao contrario, numerosas
sao as conversóes de adultos, de modo que se pode dizer que os
balizados de adultos constituem uma característica da Igreja
russa contemporánea. Nao ha estatísticas a respeito, como sa
compreende, mas o fenómeno é registrado até mesmo pela im-

— 24 —
A IGREJA NA U.R.S.S. 25

prensa soviética. Entre as riquezas que os neo-convertidos tra-


zem á Igreja, está o caráter ecuménico da sua fé. Este tato é
novo num país que, no século passado, criou a teología «eslavó-
fila», para estabelecsr a superioridade mística da Igreja russa
sobre qualquer outra forma de vida crista. Tal ecumenismo,
porém, nada tem que ver com relativismo doutrinal, pois ele
nasce dentro da perseguicáo; as suas raizes se acham na parti-
lha das provagóes e da cruz; em particular, frente ao catoli
cismo a abertura é extraordinaria, como se fosse obvia a ne-
cessidade de reunir católicos e ortodoxos. ■

Vejamos agora urna faceta da Igreja russa derivada preci


samente do fato de ter que subsistir sob urna ideología atedia.

4. A lgre¡a como antüdedogia


Além de sofrer perseguicáo sangrenta, a Igreja russa teve
de enfrentar urna provagáo ainda mais terrível: o confronto
com a ideologia. Por «ideologia» vai aqui entendido um sistema
misto de ciencia e de «religiáo» ou «mística», que psrfazem um
regime absolutista. Isto quer dizer que a ideologia nao pode
deixar de questionar a verdadeira fé.
Eis como se desenrolaram os acontecimentos desde o co-
mego da Revolugáo Russa:

Em 1922 deu-se um cisma na Igreja da U.R.S.S., pois


alguns eclesiásticos e fiéis resolveram criar ca Igreja viva», sub-
serviente ao governo soviético. Diziam que os objetivos da
fé crista e da revoluQáo coincidiam entre si ou devíam cón-
fundir-se. Pouco depois, em 1923, o sucesso deste empreendi-
mento parecía completo, pois a maioria dos clérigos e dos leigos
passara para a Igreja progressista; todavía tal éxito foi efé-
mero, pois, desmascarada a manobra política do Estado, a si-
tuacáo voltaria a favorecer a Igreja auténtica.

Está dolorosa aventura deixou na consciéncia religiosa


russa um trauma profundo, que teve ao menos um efeito salu-
tar: doravante um cristáo russo saberla que a colaboragáo da
fé crista com a ideologia é impossível. Sabe que a ideología,
quando se aproxima da fé, só pode gerar urna nova corrupcáo
da fé. Esta imunizagáo contra o progressismo ideológico é um
dos tragos distintivos da Igreja Russa contemporánea.

Mas nem por isto a atitude a tomar diante do governo so


viético é clara e definida para os cristáos russos. Com efeito; a
lealdade ao poder estabelecido sempre foi urna atitude esponta-

— 25 —
26 <PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 253/1981

neamente crista. Mais aínda: a situacáo, para os cristáos, se


agrava pelo fato de que o Estado Soviético é intencionalmente
ambiguo. Sim; o regime afirma, de um lado, a sua marca anti-
•religiosa, e, de outro lado, a sua «tolerancia» modelar. Esta
dialética é bem característica de um discurso de ideología: sabe
envolver sutilmente os seus ouvintes. Por isto na U. R. S. S.
quem ponha em dúvida a tolerancia do Govemo c denuncie as
contradigóes deste, comete um delito contra o Estado.
Assim o cidadáo soviético está envolvido na mentira.
Para viver em liberdade (relativa), o cidadáo russo tem que
dizer que nao há perseguigáo religiosa nem pode haver (pois
ela seria contraria á Constituicáo). Compreende-se, pois, que
Soljenitsyn, logo que expulso da U.R.S.S., tenham langado o
programa: «Nao mais mentir» como sendo o meio, por excelen
cia, para combater o sistema ideológico.

Na realidade, o Estado quer aniquilar a Igreja; a destruicáo


da vida religiosa fica sendo o objetivo intencionado pelas auto
ridades governamentais. Ao mesmo tempo, porém, o regime
afirma seguir urna legalidade superior e desenvolver tolerancia
moderada. Tais condigóes recordam a carta secreta de Lenin
sobre as questóes religiosas, de 10/12/1922: ai diz o autor que
a destruicáo da Igreja deve sempre assumir as aparéncias de
legalidade e jamáis ser empreendida por motivos confessada-
mente anti-religiosos. Em conseqüéncia, verifica-se que milha-
res de fiéis estáo deudos em cárceres e campos de concentragáo
por causa de sua fé. Oficialmente, porém, nenhum deles co
meten delito religioso: trata-se táo somente de «parásitas», «ca-
luniadores do regime», gente punida por «atividade nociva á
saúde dos ddadáos», ou por «recusa de participar ñas ativi-
dades sociais»... Os cristáos assim estáo diante de urna perse-
guicáo que «nao existe», mas que faz mais vítimas do que
qualquer outra no passado. Denunciar tal situagáo é um absurdo
eos olhos do regime soviético, pois o Estado marxista detém o
monopolio da verdade (política e moral) e o monopolio dos
meios de informacáo e educacáo. É o que torna o combate táo
duro para os cristáos.

5. Inaptktoes para a Iota


A índole dos cristáos russos torna-lhes especialmente di
fícil a luta contra o regime ateu militante. A persistencia do
regime soviético por mais de sessenta anos, a regressáo cultu
ral gerada pela pseudo-ciéncaa dominante, o isolamento a que
é relegada a Igreja russa, cerceada em suas atividades de re-

— 26 —
. A IGREJA NA U.R.S.S. 27

flexáo e docencia... enfraquecem ainda mais a resistencia ao


regime vigente. Enunciaremos fontes de difículdades resultan
tes das condicóes a que se acham submeüdos os fiéis da
U.R.S.S. :

1) A piedade russa é fortemente marcada pela tenden


cia a fugir do mundo, que o monaquisino e o espirito místico
comunicaram aos cristáos orientáis em geral. A fuga e a. de
sestima do mundo foram acentuadas pela decepgáo que os cris
táos russos sofreram: tendo confiado na promessa socialista
de transformar o mundo, o homem soviético (e, com ele, o
cristáo soviético) corre o risco de desesperar, por completo,
das instituicóes deste mundo.
2) A pouca instrugáo religiosa do povo russo, que nao
pode ser devidamente catequizado, contribuí para que inultos
cristáos assumam atitudcs um tanto supersticiosas, que enfra
quecem a fé. Com efeito; a crendice e a fácil credulldade ten-
dem a substituir a auténtica crenca; os fiéis se deixam impres-
sionar pelos relatos de cúpulas de igrejas que por si mesmaa
recuperam a sua douracáo, ou... de icones que se restaurara
a sos...
3) Durante toda a sua historia, a Igreja russa foi pro
pensa a submeter-se ao Estado. Os teólogos russos, alias, ten-
taram justificar esse conluio, elaborando a teoría da «sinfonía
dos poderes» (os ocidentais fizeram o mesmo através da teoría
das duas espadas). Gragas a tal teoría, os czares russos acaba-
ram por fazer da Igreja russa um Departamento da adminis-
tracáo do Imperio. É precisamente esta atitude da Igreja dis
posta a se deixar reger pelo Estado que lhe torna difícil resistir;
ao regime comunista. -•<£*
Numa tentativa de reagir contra a subserviéncia vigente,"
algumas comunidades religiosas russas nao querem deixar-se
registrar pelo Estado; vivem na clandestinidade ilegal a fim de
salvaguardar maior liberdade de acto. Tal é o caso principal
mente das comunidades batistas; alguns grupos ortodoxos tam-
bém seguem este alvitre, embora de maneira menos radical que
os batistas.
O Estado soviético faz questáo de exigir do clero ortodoxo
alguns compromissos que o tornam suspeito aos olhos dos fiéis;
os cristáos ortodoxos nao raro perdem a confíanga em seus
pastores por causa disso. O regime comunista, alias, é hábil em
explorar a «docilidade» dos clérigos russos.
4) Um falso nacionalismo religioso também prejudica os
cristáos russos. Com efeito, ao lado de louvável tendencia

— 27 —
28 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS> 253/1981

ecuménica, registra-se na Igreja russa urna outra, que tende a


acusar o «Ocidente apodrecido» de ser o culpado de toda a tra
gedia comunista, pois o Ocidente inventou o marxismo e, por
tante, acabrunha a Rússia urna vez mais. Este nacionalismo
tem expressdes também nos escritos eslavófilos que contribui-
ram e contribuem para impedir, da parte dos cristáos russos,
um juízo sereno sobre a situagáo real do seu país e da sua
Igreja.
Apesar de marcada por tais dificuldades no combate ao
ateísmo, a Igreja russa vai sobrevivendo e mesmo vai acom-
panhando o ressurgimento religioso que ocorre no país. Isto
concorre para por mais urna vez em evidencia os dizeres de
Sao Paulo: «Quando sou fraco, entáo é que sou forte» (2Cor
12,10). A provacáo da Igreja russa revela, pois, o grande mis
terio da graga de Deus aos olhos de quem a sabe considerar.

6.. Concluscto
Nao se pode deixar de dedicar admiracáo aos cristáos
russos que sustentam horrenda perseguicáo, cruel e, ao mesmo
tempo, mascarada. A situagáo de tais fiéis maltratados vem a
ser urna interpelacáo para todos os demais cristáos. Com efeito,
os irmáos da U.R.S.S. poderiam observar aos demais cris
táos: «Enquanto a perseguigáo nos acabrunha, desfrutáis da
plena liberdade de viver a vossa fé. Que fazeis dessa liber-
dade?>
Os cristáos ocidentais poderiam examinar-se a respeito da
sua inercia ou indiferenga frente á sorte dos irmáos persegui
dos na U.R.S.S. Perdem-se, por vezes, em problemas secun
darios, que fazem esquecer os grandes desafios da realidade.
Mediante a oragáo e um testemunho de fé vivida e coerente
até o extremo, podem os cristáos ocidentais contribuir, na pre
senta de Deus, para minorar o penoso sofrimento dos irmáos
na U.R.S.S. Outros recursos para mostrar solidariedade a
tais irmáos sao ainda viáveis. A propósito, sugerimos <as pessoas
interessadas escrevam para qualquer dos seguintes enderegos:
Foyer Oriental Chrétien
Avenue de la Couronne, 206
B — 1050 — BRUXELLES — BÉLGICA
«Russia Cristiana»
Via Martinego, 16
MILANO — ITALIA
A propósito, ve|a-se o artigo de Francote Rouleau S. J.: La grande
épreuve de l'egtlse Ruase, in: Eludes, mal 1979, tome 3S0/5, pp. 685-698.
Urna danominacáo protestante:

os congregacionalistas

Em ttntsse: O Congregaclonallstno ó urna denomlnacfio protestante


dissidenle do cisma angllcano realizado em 1S34. '

Julgando que a atitude de Henrlque VIII, reí da Inglaterra, nfio era su-
llcientemante radical, mas conservava numerosos elementos do Papismo, os
puritanos Ingleses comecaram a apregoar urna Igreja Independente do Pa
pado, do episcopado, do presbiterio, do reí...; essa Igreja constarla de
pequeños grupos autónomos, que escolr.erlam. ordenarlam e deporlam os
seus ministros ou pastores; tais "congregacOes" eslarlam vinculadas entre
si por lacos de amlzade e de apolo mutuo, mas carecerlam de autorldade
centrallzadora.

A prlmelra congregacSo asslm entendida (ol fundada na Inglaterra


em 1592 por Greenwood e Barrowe; todavía esses dols cheles foram con*
denados á morte em vlrtude do seu espirito separatista. Mals tarde, outra
congregacio fol constituida em Scrooby (Inglaterra); obrlgada a ealr do
país, fol para a Holanda e finalmente para os Estados Unidos; o navio
"Mayflower", levando os Pllgilm Fathera, desembarcou em Piymouth em
1620. Na "Nova Inglaterra", os congregacionalistas se expandlram, gozando
da tolerancia e até do favor do Estado.

Todavía foram minados por separacoes e divisóos em vlrtude de


motivos doutrlnárlos, notando-so principalmente o cisma dos Unitarios em
1833, que negavam a Dlvlndade de Cristo e e SS. Trindade... O liberalismo
doutrlnário nfio pode deixar de estar assoclado ao principio protestante do
"llvre exame da Biblia", máxime ñas comunidades congregacionalistas, onde
o liberalismo ó professado com énfase especial.

Tem-se registrado entre os ccwigregaclonallstas certa tendencia a su


perar o forte Individualismo mediante a constltulcfio de unlOes e federacSes
de comunidades locáis. Todavía mesmo essa tendencia encontra resistencia
por parte dos membros mals puritanos. Numéricamente talando, o Congre-
gacionalismo é pouco representativo no bloco protestante: 3.000.000 de
erantes aproximadamente.

Comentario: Atendendo a solicitacáo de leitores, a nossa


revista tem procurado expor o quadro geral do protestantismo
(cf. PR 190/1975, pp. 441-462), assim como as características
de algumas de suas denominacóes principáis. Assim em PR

— 29 —
30 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 253/1981

2/1958 e 143/1971, foi abordado o luteranismo; em


PR 187/1975, a problemática anglicana; em PR 20 e 21/1959, o
calvinismo (e o presbiterianismo); em PR 178/1974, a origem e
a teología dos batistas; em PR 182/1975, o adventismo; em
PR 67/1963, os mórmons; em PR 201/1977, a Ciencia Crista*
em PR 157/1973, as Testemunhas de Jeová. Neste número, con
tinuaremos a serie considerando o Congregacionalismo, que teve
nos sáculos XVI e XVII origem na Inglaterra e se expandiu nos
Estados Unidos e em outros países, inclusive no Brasi.

1. Rmdo de cena: o puritanismo

Em 1534 o rei Henrique Vm da Inglaterra arrogou a si a


autoridade suprema da Igreja na Inglaterra. Todavia resistiu a
todos os esforoos de se introduzirem no seu reino as idéias lu
teranas ou calvinistas, que se alastravam no continente europeu.

Durante o reinado de seu sucessor, o menino Eduardo VI


(1547-1553), tanto o Luteranismo como o Calvinismo conseguí-
ram penetrar na Inglaterra.

Sob a rainha María a Católica (1553-1558), deu-se a res-


tauragáo (efémera) do Catolicismo no reino. Em conseqüéncia,
muitos clérigos e leigos que haviam aderido ao protestantismo
fugiram para a Holanda, a Franga, a Alemanha e a Suiga.

A rainha Elizabeth I (1558-1608), durante o seu longo go-


verno, restabeleceu o protestantismo no país, de modo que fora-
gidos e exilados puderam voltar a este. Todavia Elizabeth, em-
bora fosse reformista enérgica, parecía conservadora demais aos
olhos dos que regressavam profundamente imbuidos de idéias
calvinistas e luteranas; mantinha a hierarquia episcopal, assim
como antigos ritos e cerimdnias usuais no Catolicismo.

Os fugitivos que haviam voltado, julgavam que as reformas


da rainha Elizabeth nao iam suficientemente longe; até mesmo o
Segundo Livro de Oragao (Seoond Pírayerbook) de Eduardo VI
lhes pareda «puro Papismo». Por isto resolveram empenhar-se
para «purificar» tanto as crengas como as práticas da Igreja
anglicana de Elizabeth. Dai o nome de «puritanismo» dado a tal
facgáo.

Muitos puritanos ficaram na Igreja anglicana, onde procura-


ram, por meio de lenta e constante influencia, abolir «a detes-

- 30 —
OS CONGREGACIONAUSTAS _31

tável influencia do Papismo». Constituirán! a Low Church ou


Baixa Igreja dentro do Anglicanismo (ou EpiscopaliBmo), ao
passo que os anglicanos mais tradicionais constitucm a fflgh
Church ou Alta Igreja. Outros, porém, ainda mais radicáis,
resolyeram abandonar a Igreja Anglicana e proclamar a inde
pendencia em relacáo a qualquer das comunidades eclesiais exis--
tentes: o povo de Deus deveria formar pequeños grupos espon
táneamente vinculados entre si pela sua própria «Alianga» para
servir a Deus; escolheriam os seus funcionarios e ordenariam os
membros mais dignos para o ministerio pela imposigáo das m&os
da cornunidade ou congregacáo. Desaparecería o conceito de
Igreja universal para ceder ao de congregacáo local e inde-
pendente.

Os puritanos foram cultivando urna mentalidade cada vez


mais caracterizada. Faziam da Biblia o seu código de fé, de Mo
ral, de vida litúrgica, de atividades sociais e políticas... Pro-
fessavam a crenga na predestinagáo em sentido calvinista'.

O puritano considerava-se predestinado para a gloria; sua


féconfianca dava-lhe garantía disto; ele via na sua fidelidade a
Palavra e as «ordenagñes» de Deus o sinal da sua escolha para
a vida eterna. Como os profetas, condenava a vaidade e a levi-
andade do mundo. Levava vida severa, observando com pontua-
lidade e exatidáo todas as suas obrigagóes religiosas, moráis, cí
vicas e profissionais; foi o cultivo religioso dos deveres de estado
que assegurou prosperidade económica aos homens de negocios e
aos profissionais puritanos (ingleses, holandeses e norte-ameri
canos, principalmente). '*

Sidney Dark póe em relevo a mentalidade sombría, tris-


tonha e severa do puritanismo no seguinte trecho:

"A principal ocupecfio do puritano era a de Impedir oa outros do


fazerem aqullo que ele mesmo nao tlnha desojado fazer. Para ele, com um
passaporte para o céu no bolso, podía ser conveniente e correto evitar
todos os prazeres mundanos e passar o seu tempo naqullo que, para os
nfio regenerados, podía parecer urna rara preparacfio para a eterna bem-
•aventuranca. Mas ele nao se contentava com condenar-se a al mesmo a
urna horrlvel tristeza; persistentemente se esforcava por tmpor a sua som
bría prétlca a oulros que nfio compartllhavam a sua fé fantástica...
Macaulty escreveu: 'O puritano odlava a caca-ao-urso, nfio porque ela
flzesse solrer o urso, mas porque dava prazer aos espectadores'" (Tho
pastlng of the purltan, p. 9).

1Dese]oso de exaltar a transcendencia e a soberanía de Deus, Cal-


vino aflrmava que Deus, ao criar, predestina os homens nfio somonte para
a gloria, mas também para a condenacfio eterna.

— 31 —
32 «PEKGUNTE E RESPONDEREMOS» 253/1981

2. Origens do Congregacionalismo

1. O primeiro a redigir por escrito as teses da indepen


dencia referentes á Igreja foi Robert Browne, clérigo anglicano
que nascera em 1550. Por Influencia de refugiados holandeses,
comecou a se convencer de que o reino do céu na térra consta
táo somente das poucas pessoas que, devotadas á Palavra de
Deus, vivem santamente. Essa gente sincera e boa deveria ig
norar qualquer comunidade eclesial e fundar a sua pequeña so-
ciedade independente de qualquer sínodo e autoridade visível.
Nessa sotíedade todos gozariam dos mesmos direitos; con-
tudo alguns deveriam ser nomeados ministros da palavra e do
culto pela congregacáo. As congregagóes locáis deveriam ser
absolutamente independentes em relacáo a qualquer autoridade
religiosa ou civil; seria oportuno, porém, que estivessem relacio
nadas entre si a fim de se prestarem auxilio mutuo.

. Em 1580 Robert Browne comegou a pregar tais idéias, que


encontraran! notável aceitacáo; os seus discípulos obrigavam-se
por um pacto a guardar as leis de Deus sob a chefia de Cristo e
a recusar a companhia de pessoas más; todos seriam iguais e
livres na interpretacáo da Biblia sob a inspiragáo do Espirito
Santo: dentro desse clima de individualismo, cada um devia con-
siderar-se rei, sacerdote e profeta!

Todavía o governo de EÜzabeth nao tolerava dissidéncia


alguma; por conseguinte, Browne foi preso. Pouco depois liber
tado, nao se sentía á vontade na Inglaterra; por isto emigrou
para Middelberg (Holanda), onde fundou urna communidade se
gundo o seu modo de ver. Contado Browne nao conseguiu man-
ter a unidade dessa Congregacáo, que foi sendo minada por dis-
sensóes internas. Em 1584, dirigiu-se para a Escocia, onde os
presbiterianos (adeptos da autoridade dos presbíteros na Igreja)
o aprisionaran!. Ao ser liberto, voltou para a Inglaterra; renun-
ciou ás suas idéias e retomou em 1591 o seu cargo de clérigo na
Igreja Anglicana; passou os 42 restantes anos de sua vida como
reitor de urna paróquia anglicana. Morreu em 1633.

2. As idéias reformadoras de Robert Browne haviam de


continuar a fermentar na Inglaterra entre os puritanos. Muitos
destes ficavam na Inglaterra anglicana por desaprovarem o cis
ma; outros nela permaneciam por timidez, temendo as penali
dades impostas por Elizabeth para forgar a uniformidade reli
giosa no país. Os mais radicáis declaravam que o Papado, o Epis-

^^ *>*4 ^^
OS CONGREGACIONALISTAS : 33

copado e o Presbiterado eram apenas tres formas de urna só e


grande apostasia; insistiam em que a verdadeira Igreja consta de
grupos pequeños e autónomos de gente santa. Em 1592, John
Greenwood e Henry Barrowe fuñdaram a primeira congregado
desse tipo em Londres, sendo Francis Johnson entáo eleito mi
nistro da mesma. Mas em 1593 Greenwood e Barrowe foram
executados e Fr. Johnson banido do reino por todo o resto da
vida. Ficavam, porém, cerca de vinte mil separatistas em varios
pontos da Inglaterra, reunidos em pequeñas congregacóes. Estes,
apesar de perseguidos, tendiam a se multiplicar.

3. Sob o governo de Jaime I (1603-1625), que continuava


a política religiosa de Elizabeth, fundou-se urna congregacáo de
independentes em Scrooby (condado de Nottingham Shire); ai
Brewster era o «Mais-velho Governaníe» e Robinson o «Minis
tro». Em 1608 esse grupo foi forcado a deixar o país, retirando-
-se para Amsterdam e, depois, para Leydon na Holanda; vivía
segundo os principios congregacionais. Após doze anos de per
manencia na Holanda, esses exilados sentiam o peso da luta eco
nómica e a necessidade de emigrar novamente. Nao podendo
voltar para a Inglaterra (onde seriam punidos como rebeldes
contra a Igreja do Estado), volveram-se para os Estados Unidos
da América.

Brewster acompanhou um grupo de 102 emigrantes (PU-


grim Fathers), que partiram da Holanda no Miayflower e che-
garam a Plymouth na costa americana aos 20 de dezembro de
1620. Imediatamente fuñdaram a sua colonia sob a direcáo de
Brewster; sentiam-se á vontade para praticar o seu Cristianis
mo sem a autoridade do Papa, do episcopado anglicano ou do
regime presbiteriano.

Visto que a perseguicáo prosseguia na Inglaterra sob Car


los I, chegaram á Nova Inglaterra (Estados Unidos da Amé
rica) mais 22.000 emigrantes entre 1620 e 1640; eram presbi
terianos independentes e puritanos. A tolerancia religiosa na
colonia levou a certa uniáo dos grupos presbiterianos e congre-
gacionalistas, respectivamente de Massachussetts e Plymouth.
O resultado dessa aproximagáo foi o estabelecimento sólido do
chamado «sistema congregacional» ou «sistema da Nova In
glaterra»; assim o termo «congregacional» comec.ou a ser usado
oficialmente nos Estados Unidos, passando da! para a Ingla
terra, onde designou certos grupos independentes: segundo esss
sistema, cada congregacáo devia manter a sua autonomía, re-
jeitando Papa, bispos, presbíteros e rei; o grupo escolheria en-
34 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 253/1981

tre os seus membros os respectivos ministros; as diversas con-


gregacóes poderiam associar-se amistosamente com as suas co
munidades vizinhas.

A nova clgreja Congregadonal» tornou-se a Igreja estatal


de Massachussetts e, posteriormente, de parte da Nova Ingla
terra, gozando do amparo legal e financeiro do Estado. — É
curioso que os independentes, tendo rejeitado a Igreja estatal
da Inglaterra, tenham constituido urna Igreja estatal na Nova
Inglaterra. As conseqüéndas deste fato nao foram felizes. Os
ministros congregacionais passaram a influir na política local,
assumindo atitudes severas e intolerantes; de perseguidos na
Inglaterra, tornaram-se perseguidores nos Estados Unidos.

Willard L. Sperry, congregacionalista e deáo da Escola de


Teología da Universidade de Harvard, escreve:

"Depols de haver defendido as suas próprlas llberdades religiosas,


eles delxaram de conceder aos outros a tolerancia que eles mesmos havtam
procurado, sem a conseguir, na Inglaterra. Havendo-se constituido em
Igreja, eles foram desviados; tornaram-se cheles entre eles urna senhora
famosa e algo psicopática chamada Anne Hutchlnson, e aquele cavalhelro
de mentalidade ultra-independente, Roger Willlams. Esses exilados vieram
a ser os fundadores de Rhode Island. Os batistas em geral sofreram Interdi-
cOes Jurídicas, se nfio expulsfio. Nfio havla lugar para os católicos roma
nos. Em particular, os quakers receberam o tratamento mals cruel,...
quatro quakers foram entercados na comuna de Bostón" (Religión In
América, pp. 33s; texto transcrito do opúsculo Os congregaclonaltstas de
L Rumble, pp. I7s, na colecéo "Vozes em Defesa da Fe" n? 15, Petró-
polls 1959).

O Oongregacíonalismo manteve-se predominante nos Es


tados Unidos até meados do sáculo XIX. A separacáo entre a
Igreja e o Estado em Massachussetts deu-se em 1833, em con-
seqüéncia de urna cisáo entre os congregacionais; enquanto uns
continuavam a professar a fé na divindade de Cristo e na SS.
Trindade, outros puseramse a negar estes dois artigos; os con-
gregacionalistas ortodoxos recusavam-se a pagar tributos para
sustentar congregagóes ñas quais a Divindade de Cristo era
abertamente negada. Nos Estados Unidos passou a haver urna
«Primeira Igreja Unitaria Congregacionab e urna «Segunda
Igreja Unitaria Congregadonal». Isto enfraqueceu notavelmen-
te o congregadonalismo, que todavia ainda teve forga sufici
ente nos Estados Unidos para exercer influencia na promulga-
Cáo da «lei seca» (experiencia de proibicao), expressáo típica
do espirito puritano.

— 34
OS CONGREGACIONAUSTAS 35

No mesmo ano de 1833, formou-se na Grá-Bretanha a


«Uniáo Congregadonalista da Inglaterra e do País de Gales».
Nos Estados Unidos deu-se em 1957 a uniáo das «Congrega-
tional Christian Churches> e da «Evangelical and Reformed
Church» com o nome de «United Church of Christ».

Em 1891, fundou-se o «International Congregatlonal Coun-


cil>, que já realizou varios Congressos Mundiais.

Assim, mesmo entre os congregacionalistas, de Índole táp


independente, registra-se a tendencia para a unidade dentro
do protestantismo; tal tendencia, porém, luta sempre com o
obstáculo do individualismo que está na raiz da mentalidadé
protestante.

Na prática, nenhuma Igreja local é reconhecida como con-


gregacional se nao é recebida na comunháo das Congregacóes
do seu distrito. Nem pode algum ministro congregacional exer-
cer as suas fungóes sem a aprovagáo da «Associacáo> clerical
á qual os ministros devem pertencer.

Examinemos agora sumariamente a

3. Teología congregacionalista

Distinguiremos tres pontos: 1) organizado da Igreja; 2)


ministerios ou servico na Igreja; 3) demais artigos da fé.

3.1. Organizado ecleslal

Como dito, a tese originaria dos puritanos outorgava total


independencia a cada congregacáo local. Todavía a falta de
coordenacáo e de autoridade entre as diversas comunidades
congregacionalistas havia de expor o Congregadonalismo a ar
bitrariedades em materia de fé e de costumes; o radonalismo
e as deturpagóes careceriam de dique ou da resisténda que a
sólida comunháo das Congregacóes lhes poderla, opor; prova
disto é o fato deque algumas comunidades passaram para o
Unitarismo, negando a SS. Trindade e a Dlvindade de Cristo.

Por isto os congregacionalistas, no decorrer dos sáculos,


foram atenuando os seus principios de liberalismo e individua»

— 35 —
36 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 253/1981

lismo, realizando unióes ou federacdes de comunidades, como


foi atrás dito; essa vinculacáo.intercomunitária tornase-ia pe-
nhor de certa unidade de atitudes entre os congregacionalistas.
Todavía a tendencia a confederar congregacóes encontra re
sistencia nos membros mais puritanos ou fundamentalistas da
Igreja congregacional. Muito significativo é o testemunho do
Sr. Ralph P. Ooleman Jr. em carta á revista Time de 4/10/1948;
escrevendo sobre o Concilio Mundial das Igrejas (organizagáo
crista nao católica), que pouco antes se reunirá em Amsterdam,
dizia:

"O principal objetivo do Concillo parece ser urna lgre|a Protestante


Unida. Mas acaso urna Igreja Protestante Unida nfio está em auténtica an-
tltese com a pedra angular do Protestantismo, que permite a Interpretado
Individual da Biblia em lugar da Interpretado proposta pela Igreja? Urna
Igreja Protestante Unida nfio representarla urna especie de catolicismo pro
testante, algo que sujeltaria e subordinarla o Individuo á Igreja por amor
á unidade orgánica? Do ponto de vista teológico, falta de unidade nfio 6
o verdadelro coracfio do Protestantismo ?"

Apesar desta e de semelhantes vozes, pode-se dizer que o


Congregatíonalismo reconhece cada vez mais a necessidade de
superar, de algum modo, o total individualismo de seus pri-
meiros mentores.

3.2. O ministerio

Os congregacionalistas, como os demais protestantes, re-


jeitam o sacerdocio ministerial, conferido pelo sacramento da
Ordem; atribuem a todos os crentes as mesmas facuidades e
privilegios na Igreja.

Quando os congregacionalistas, impondo as máos, ordenam


um ministro ou pastor para o servico da congregagáo, apenas
tendonam reconhecer que o candidato recebeu de Deus um
chamado interior que o inspirou a se oferecer voluntariamente
para o ministerio, ünpondo as máos, a Igreja local professa
que o candidato foi chamado por Deus e foi aceito ou escolhido
pelos membros da congregacáo; a congregagáo nao confere ao
candidato algum poder espiritual ou sacramental. — Assim
como a comunidade local escolhe os seus ministros, ela tam-
bém os pode demitir. Esta situagáo deixa os ministros na total
dependencia do beneplácito da comunidade.

— 36 —
OS CONGREGACIONAUSTAS 37

3.3. Domáis crenjas :

O movimento de independencia, em seus inicios, professava


a teología de Calvíno, pois era remotamente inspirado pelos
reformistas de Genebra; apenas diferia de Calvino no tocante
á forma de se organizar e governar a Igreja. :

Em 1658, sob Oliverio Cromwell (que favorecía as idéias de


independencia), os congregacionalistas reuniram-se no Palacio
Savoia em Londres e publicaram urna «Declaracáo da Fé eda
Ordem confessadas e praticadas ñas Igrejas congregaclonais da
Inglaterra». Essa Profissáo reafirmava as doutrinas calvinistas
em geral, a da predestinacáo em particular, e insistía no prin
cipio da absoluta liberdade para as congregagdes locáis.

Todavía a fé na doutrina calvinista, aos poucos, sofreu


desvíos e contestares.

Com efeito; em 1739 John Wesley iniciou o seu movimento


pietista, declarando a salvagáo possível para todos os homens
de boa vontade. Rejeitou a teoría de Calvino referente á pre
destinacáo. Ora os congregacionalistas, como os demais crentes
da Inglaterra, foram influenciados pelos enslnamentos de
Wesley.

As idéias de Wesley foram levadas, em 1740, para a Nova


Inglaterra por George Whitefield, pregador metodista que fora
companheiro de Wesley: a «teología da Nova Inglaterra» mi-
tigou a severidade do Calvinismo, acentuando o amor de Deus
e o poder do honuem para corresponder á grasa divina.

Entende-se que a doutrina teológica tenha multiplicado os


6eus matizes dentro do Congregacionalismo: este reconhece a
seus membros a faculdade de adotar os pontos de vista que
lhes aprazam, sem que haja o exercicio de urna autoridades ma
gisterial.

Em suma, o Congregacionalismo está bem na lógica do


principio protestante do livre exame da Biblia. Este principio,
inspirado por profundo subjetivismo-individualismo, havia de
dar aos poucos os seus frutos: ruptura com o Papado,... com
o episcopado,... com o presbiterio,... com o poder civil, fi-
cando, em última análise, o en como, arbitro das verdades da
fé e da prática religiosa — Pode-se dizer que táo acentuado li
beralismo é causa de fraqueza da denominacáo congregaciona-

— 37 —
38 cPERGUNTE E RESPONDEREMOS> 253/1981

lista, que no mundo protestante nao é das mais numerosas: tres


milhóes de crentes aproximadamente!

Bibliografía:

BIHLMAYER-TUECHLE, Historia da Igreja, vot. 3, Sfio Paulo 1965.

MOOY, SUITBERTO, Problemas ecuménicos na Igreja a ñas Igrelaa.


Sfio Paulo 1963.

ROPS-OANIEL, Une ere de renouveau: La Reformo Cathollque. Pa


rís 1S5S.

RUMBLE, L, Os Congregectonalbtas. ColecBo "Vozes em Defesa da


Fe" tí* 15. Petrópolls 1959.

TUECHEL-BOUMAN, Nova Historia da Igreja. Vol. III: Reforma e Con


tra-Reforma. Petrópolls 1971.

— 38 —
Por que

nao comer carne?

Em símese: A prática da abstinencia de carne e do jelum A pro*


•crislfi. Fol adotada pela Igreja desde os seus primordios, nfio por motivos
dualistas ou manlqueus, nem por respelto a animáis nos quals estarla
reencarnado um ser humano, mas em vista dos beneficios físicos a esplrl-
tuals que a abstinencia proporciona. Com elelto, a carne sempre fol consi
derada um alimento forte e excitante; em conseqüéncia, o nao uso da carne
fol concebido como fator que posslblllla o autodominio da pessoa e a
elevagao da mente a Oeus. Há quem julgue a abstinencia nociva & saúde,
por privar de proteínas o organismo. Em resposta, observa-se que nao
somonte a carne contém proteínas, mas lambétn certoa alimentos vegetáis
(como o feijáo, a soja...) e alimentos Indlretamente animáis (como o
lelle e derivados, os ovos), além do pelxe. Por Isto mesmo a abstinencia
perpetua, sabiamente pratlcada por certas Ordens Religiosas, está lonoe
de prejudlcar a saúde.

Seria necessário que os fiéis crlstfios compreendessem o significado


do precedo da abstinencia e do Jejum. Reduzldo a dols días apenas no
Brasil (quarta-felra de clnzas e sexla-falra santa), tal precelto lembra aos
fiéis o dever da penitencia; esta é Inórente & vida crista e tem que ser
prestada mesmo no séc. XX, aínda que de manelras diferentes daquelas
que os antigos observavam.

Quanto ao uso do pelxe como tal, ó secundarlo na Semana Santa.


O que importa, ó a abstinencia de carne e a sobrledade de vida do
crlstáo, para que possa participar da Palxfto e da Reesurrelcflo de Cristo.

Comentario: A abstinencia de carne por motivos religio


sos é praticada tanto pelos fiéis católicos como por adeptos de
cutres crengas. Hoje em dia muitas pessoas perguntam por
que se observa tal costume, pois as concepc5es evoluiram e já
nao se percebem táo fácilmente os porqués dessa prática ou
as premissas que inspiravam aos antigos a abstinencia de carne.
Vamos, pois, no presente artigo estudar: 1) em que con
sista a abstinencia na Igreja Católica; 2) as razóes de tal
prática; 3) urna objecáo levantada contra a mesma.

. 1. Abstinencia: em que consiste ?


A Igreja, desde os seus primordios, observa a abstinencia
de carne e o jejum como sendo práticas salutares ou aptas á

— 39 —
40 tPERGUNTE E RESPONDEREMOS» 253/1981

santificagáo dos fiéis. Por isto, o Código de Direito Canónico


sandonou tais usos. No tocante a abstinencia, o canon 1250
proibe a carne e o caldo de carne em certos dias do ano. Tais
dias atualmente no Brasil se reduzem a dois: a quarta-feira de
cínzas e a sexta-feira santa. As sextas-feiras do ano eram, até
pouccs anos atrás, dias de abstinencia; todavía o Papa Pió XII
houve por bem comutar a abstinencia por outras obras peni
tenciáis (a criterio dos fiéis) ñas sextas-feiras do ano.
O preceito da abstinencia proibe carne, gordura e caldo de
carne dos animáis que tenham o sangue quente. Nao excluí,
porém, o consumo de animáis de sangue frió: peixes, moluscos,
ras...; nem excluí ovos, leite e seus derivados.

O preceito da abstinencia obriga todo fiel católico pela


vida inteira desde o uso da razáo, ou seja, desde os sete anos
de idade completos (cf. can. 88 § 3). Tal obrigacáo delxa de
existir desde que graves razóes físicas ou moráis se lhe opo-
nham: doenca, debilidade física, determinados trabamos.
Importa agora considerar os porqués de tal prática re
ligiosa.

2. Os poiques...

Sabe-se que nao somente o Cristianismo, mas também ou


tras correntes religiosas, impóem a abstinencia de carne (e o
jejum( aos seus discípulos; tais usos vigoraram em todos os
tempos até hoje. Diversos, porém, sao os motivos que os inspira-
ram. Perguntamo-nos: quais as razóes que induziram os cris-
táos a tal prática?

1) Em termos negativos, diremos:


a) Nao se trata de aversáo á carne ou & materia, como
se esta fosse má por si mesma. Tal concepcáo era professada
por escolas dualistas, que estabeleciam antitese entre materia
(carne) e espirito. Algumas seitas heréticas, como o maní-
queismo e o montañismo, tentavam introduzir tal concepcáo no
Cristianismo; mas nao lograram impor-se. Na verdade, todas
as criaturas sao obra do mesmo Deus infinitamente sabio e
bom (cf. Gn 1,31). O apostólo S. Paulo rejeita explícitamente
o dualismo: «Tudo o que Deus criou, é bom, e nada é despreá-
vel, se tomado com agáo de gracas» (lTm 4, 1-4). O Concilio
regional de Tolosa n, em 447, condenou o dualismo, que con
sidera a carne má e, por isto, nao comesüvel.

—— 40 —
POR QUE NAO COMER CARNE ? 41

b) Também nao se trata de respeito aos animáis decor-


rente da teoría da metempsicose. Esta ensina que o ser humano
se pode reencarnar em algum animal; por isto os brámanes e
os budistas se abstém de carne, ciosos de nao comer a carne de
algum familiar ou amigo.
7J5

c) Os cristáos também nao sao movidos pelos preceitos


da lei de Moisés, que proibia certos alimentos, inclusive alguns
tipos de carne (cf. Lv 11; Dt 14). Na verdade, a Lei de Moisés
já preencheu o seu papel de pedagogo (cf. Gl 4,1-3); urna vez
chegado o Messias, cessou a sua funcáo de guia. Foi o que Sao
Pedro percebeu! no episodio sintomático de At 10, 10-16, em
que o Senhor lhe disse: «Nao chames impuro o que Deus de-
clarou puro» (10, 15).

2) Em termos positivos, a Igreja prescreve a abstinencia


de carne por motivo de ascesa ou penitencia. Esta nada tem
de comum com o masoquismo. O cristáo mortifica o seu corpo,
privando-o de certos cuidados ou regalías, a fim de obter (com
a graga de Deus) o dominio sobre as paixóes e a liberdade in
terior; em conseqüéncia, a mente se eleva mais fácilmente ao
Senhor e a oracáo se torna mais pura e intensa. A abstinencia
de carne concorre para tonto, visto que a carne é considerada
um alimento forte e excitante, provocador dos instintos natu-
rais e cegos. Assim, por exemplo, escrevia S. Bernardo
(t 1153): «Hei de me abster de carne, pois esta, ao alimentar
fortemente a carne, alimenta também os vicios da carne» (Pa
trología Latina, ed. Migne, t 183, 1096s). S. Jerónimo (t 421)
recomendava: «Se queres ser perfeito, é bom que nao bebas
vinho nem comas carne» (Patrol. Latina, ed. Migne, t 22, 892).
Na Suma Teológica de S. Tomás sao expostas as mesmas ra-
zóes ascéticas em favor da abstinencia (cf. u/11, qu. 147,
art 8).

Estas concepcóes explicam por que, desde os primordios do


Cristianismo até hoje, a abstinencia de carne é observada. Ex-
plioam outrossim por que nao poucos ascetas e pensadores nao
cristáos praticam tal exercício.

Verdade é que nos últimos decenios a Igreja tem abran-


dado os preceitos relativos ao jejum e a abstinencia. Isto se
deve as condigóes de vida das populacóes flageladas pela guerra
ou pela fome em diversas partes do mundo. O jejum e a abs
tinencia sao meios, e nao fins; embora muito úteis e caros á
tradicáo crista, a Igreja aceita mitigá-Ios; todavía ao mesmo
tempo pede aos seus filhos procurem, cada qual dentro do

— 41 —
42 «PERGUNTE E RESPONDEREMPS» 253/1981

quadro de vida próprio, outras formas de penitencia, a fim de


vencer as paixóes e conseguir a liberdade interior, em conse-
qüéncia das quais a oragáo e a uniáo oom Deus se tornam
mais intensas e estáveis.

Eis, porém, que urna objecáo se levanta:

3. E que dizem os higienistas ?


Desde os primeiros sáculos da Igreja houve quem impug-
nasse a abstinencia de carne como sendo nociva á saúde. Se
gundo dizem, priva o organismo de proteínas e, de modo espe
cial, das proteínas animáis, o que pode ter conseqüéncias da-
ninhas para o organismo.

A propósito, deve-se observar o seguinte:

É, sem dúvida, necessário o consumo de proteínas para


sustentar o organismo e repamr a perda de energias ocorrente
no trabalho de cada dia. Os fisiólogos discutem a quantidade
de proteínas a ser ingeridas todos os dias por um individuo:
julga-se, porém, que para um adulto a cota diaria deva ser de
1 grama por quilograma de peso do corpo, ou seja, cerca de
70 gr.por dia. Para os individuos em idade de crescimento, essa
cota há de ser elevada a 1, 5 gr por quilo de peso do corpo.
Requerem-se outrossim, como complemento, cerca de 500 gr
de glucídios e 100 gr de lipídios.

Ora verifica-se que nao é nociva á saúde a abstinencia de


carne, mesmo se praticada de modo permanente, como nos
casos das Ordens Religiosas dos Cartuxos, dos Camaldulenses,
dos Trapistas, das Clarissas, das Carmelitas...

Com efeito; existem proteínas também nos alimentos ve


getáis, como o feijáo, a soja...

Todavía há quem replique que ao menos um terco das


proteínas ingeridas diariamente deve ser de origem animal;
estas fornecem aminoácidos que nao se encontram ñas proteínas
vegetáis e que o organismo humano nao chega a sintetizar. —
Em resposta, observa-se que tais aminoácidos podem ser obti-
dos mediante o consumo de alimentos indiretamente animáis,
como o leite, o queijo, os ovos... ou aínda mediante o recurso
ao peixe. Donde se vé que a abstinencia de carne sabiamente
praticada nao prejudica a saúde.
Alias, a experiencia de antigos e modernos pensadores con
firma tal conclusáo: Pitágoras, por exemplo, morreu com cerca

— 42 —
POR QUE NAO COMER CARNE ? 43

de cem anos de idade no séc. VI a. C, após vida marcadamente


sobria; Séneca (t 65 d.C.) afirmava que, após uní ano de
regime vegetariano, as suas aptidoes intelectuaís se tinham de
senvolvido (cf. ep. 108) ; o filósofo neoplatónico Porfirio
(t 301 d.C.) escreyeu um livro cSobre a abstinencia», no qual
sustenta que o regime vegetariano é o mais apto a agucar o
genio filosófico. Somelhantes testemunhos se encontram em
Plutarco, Ovidio, Epicuro. Na época do Renascimento, o nobre
Alyise (Luigi) Comaro, vitima de vida desregradá e achaques
físicos em idade avanzada, submeteu-se a regime vegetariano
rigoroso, que lhe permitía recuperar a saúde e mprrer :com
91 anos de idade (1475-1566); a fim de divulgar o éxjto dq seu
regime, publicou a obra Discorsi sulla vita sobria, que conhe-
ceu numerosas edic.5es. Também se deve registrar que na ígre-
ja Católica muitos fiéis, quer nos conventos, quer no secuto,
se submeteram á abstinencia de carne (perpetua ou periódica)
e foram beneficiados por esta, levando vida equilibrada e santa
nao raro no desempenho de atividade intelectual assaz intensa.
Estas consideracóes permitem concluir que a abstinencia
de carne prescrita pela Igreja em determinados días do ano
(atualmente, em dois días apenas) está longe de prejudicar a
saúde. Mesmo a abstinencia perpetua praticada por algumas
Ordens Religiosas nada apresenta de nocivo; mas, ao contrario,
tem produzido frutos copiosos tanto no plano físico como no
intelectual e no místico (obsérvese que é grande o número de
Religiosos e Religiosas que morrem em idade provecta nos con
ventos). '
Como se compreende, desde que se evidencie a inconve
niencia ou a impossibilidade de praticar a abstinencia de carne,
a Igreja nao hesita em dispensar da mesma as pessoas neces-
sitadas.

4. Reflexoo final
Até os nossos tempos a Igreja prescreve a abstinencia de
carne, aínda que em dois dias do ano apenas. Estes dois días
sao o vestigio final da prática rigorosa e prolongada que os
cristáos antigos e medievais observavam com fidelidade.
A manutencáo dos dois dias de abstinencia de carne (quar-
-feira de cinzas e Sexta-feira santa), dias nos quais também é
prescrito o jejum, tem caráter simbólico. Deve lembrar aos
fiéis católicos o dever da mortificagáo. Esta conserva seu pleno
valor até os nossos dias; sem mortificacao ou penitencia o ser
humano difícilmente se liberta das paixóes; ao contrario, corre
o risco de se ver escravizado pelos instintos, que o arrastam

AO
44 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS> 253/1981

para as realidades sensíveis ou sensuais e, geralmente, lhe di-


ficultam a elevacáo da mente. É necessário, pois, que mesmo
no sáculo XX, cujo ritmo de vida é muito diferente do de épo
cas anteriores, os cristáos pratiquem a penitencia; se nao lhes
é possível recorrer ao jejum e a abstinencia como outrora, visto
que o trabalho acelerado e mais intensos exige alimentacáo e
repouso adequados, esforcem-se por praticar outras formas
de mortificagáo. Esta, como dito, é inerente á vida do cristáo,
pois o cristáo é chamado a ver a Deus face-a-face — o que nao
é possível a quem esteja desfigurado por instintos ou paixóes
desregrados. Tenham-se em vista as palavras do apostólo S.
Joáo;
"Carlssimos, desde já somos fllhos de Oeus, mas o que seremos aínda
nao se manlfestou. Sabemos que, por ocasláo dessa manlfestacfio, seremos
eemelhantes a ele, porque o veremos tal como ele é. Todo o que nele
tem esta esperance, purlflca-ee a si mesmo como também ele ó puro"
(Uo 3,1-3).

Os dizeres do apostólo evidenciam a necessidade da purifi-


cacáo. Deve-se mesmo afirmar: se alguém nao se purifica dos
afetos desordenados na vida presente, deverá fazé-lo na vida
postuma ou no purgatorio; faz-se.mister, porém, lembrar que o
tempo oportuno e normal para se realizar tal tarefa é'a vida
presente, e nao a postuma. Alias, a respeito do purgatorio ve-
ja-se PR 200/1976, pp. 359-365.
Na concepcáo popular, a mortificagáo suscitada pela Se
mana Santa foi assoclada ao consumo do peixe — o que da
ensejo a especulacóes comerciáis. — Vé-se que tal realidade
está deturpada. Nao é o uso do peixe como tal que interessa ao
cristáo na Semana Santa, mas, sim, a participacáo na Paixáo e
na Ressurreicáo de Cristo mediante o exercicio da penitencia.
Esta, simbolizada pela abstinencia de carne e o jejum, nao sig
nifica necessariamente consumo de peixe; pode haver auténtica
Semana Santa sem recurso ao peixe, desde que o cristáo, em
fidelidade á norma da Igreja, se abstenha de carne e procure
mortificar suas paixóes mima conduta de vida sobria e unida
ao Senhor pela oracáo. — Quem pratica isto, obtém os frutos
da Quaresma.
Possam tais concepcóes divulgar-se entre os nossos fiéis!
A propósito:
' NINNO, G. DE, AsUneira, em: Enciclopedia Caltóllca II Cltta del
Vaticano.
ORTOLAN. T., Abstlnence, em: "Dlctlonnalre de Théologle Cathollque"
I, 1. París, 1930.

Estévao Bettencourt O.S.B.

— 44 —
livros em estante
A Ave-Maña. O feminino e o Espirito Santo, por Leonardo Boff. — Ed.
Vozes, Petrópolis 1S80, 137x210 mm, 100 pp.

Vem a lume mais um livro de Frei Leonardo Boff, desta vez sobre o
texto da Ave-María. De certo modo faz eco á obra "O rosto materno de
Deus" do mesmo autor; cf. PR 236/1979, pp. 311-319.

A obra em pauta visa a ser um comentario da saudagáo angélica


assim concebido: primeramente o autor procura identificar o sentido de
cada frase ou palavra da saudagáo; a seguir, tenta "urna penetracáo a estru-
turas cíe sentido mais fundas que ullrapassam o texto; o próprio texto, neste
nivel, significa um momento, entre outros, de manifestacio de um sentido
antropológico de fundo. Feita esta operacáo, trabaIhar-se-á, por fim, sobre
o sentido teológico-mariano de cada parte da Ave-María : nesta parte nao
temos a ver apenas com o ser humano (María), mas com Deus mesmo que
se revela mediante María" (p. 24).

Á p. 41, Frei Leonardo trata de "María associada ao Espirito Santo",


procurando explanar as relacóes entre María e o Espirito como insinuadas
pelo texto de Le 1,35; o teólogo franciscano, nsste contexto, propóe a
hipótese teológica de que María estaría unida ao Espirito Santo em uníao
quase hipostática. Por isto também á p. 86 refere que "nao sem razáo
aiguns teólogos afiímam urna relagáo intima e ontológica do Espirito com
a Igreja, constituida em urna única mystica persona, urna pessoa mistica
corn o Espirito. Esta incorporadlo da Igreja á Pessoa do Espirito Santo se
entende como derivacáo e prolongamento daquela que se realizou entre
María e o Espirito" (p. 86). Estas propesicóes sao discutidas, pois carecem
de sólido fundamento teológico.

Em suma, o livro contém betas páginas, que se prestam á meditacáo


e á uniáo com Deus. Observaríamos aínda que a linguagem é por vezes
metafórica ou imprecisa, dificultando a sadia compreensáo do texto de Frei
Leonardo; assim, por exemplo, quando se lé que "María nao é somente o
templo de Deus, mas também o Deus do templo" (p. 84) ou aínda: "O
Espirito Santo é a máe divina do homem Jesús" (p. 84).

Meu Álbum de Prlmelra Contundió, pelo Pe. Raúl Paiva e equipe.


Ed. Loyola, Sao Paulo 1980, 205x270 mm, 151 pp.

Nao raro pais e educadores indagam a respeito de bons manuais de


catequese; procuram lívros que transmitan* as grandes verdades da fé
numa auténtica perspectiva de fé. Podemos com prazer recomendar a obra
do Pe. Raúl Paiva S. J. e de sua equipe, integrada pelas professoras Ana
María Testani, Marilda Martins, Maria do Carmo Kalil Ohl, María Luiza de
Oliveira. Recorre aos processos modernos do desenho e da criaividade e
expoe de maneira sólida as principáis proposIcSes da doutrina cristi, va-
lendo-se do texto bíblico como base das explanacóes respectivas. Até
mesmo o difícil tema do pecado original acha-se exposto com clareza e
fidelidade (pp. 25-30). Eis por que nos congratulamos com o Pe. Paiva e
sua equipe pela obra assim doada ao público após longos anos de expe
riencia catequética.
Trabalho e Teología, por diversos autores. Colecto "Teología em
Diálogo" 5. — Ed. Paulinas, Sao Paulo 1979, 160x230 mm, 95 pp.

Trata-se de urna coletánea de artigos que focalizam o trabalho atra-


vés dos prismas da sociología, da filosofía, da teología e da pastoral... a
cargo de uma equipe constituida por Beni dos Santos, Paúl Singer, Alvaro
Dias Telhado, Waldemar Valle Marlins, Roberto Mascarenhas Roxo, Romano
Rezek, Cardeal Arns, Freí Betto, Marcio A. Couto. A tónica dos artigos em
pauta é a valorízacao do trabalho e do trabalhador; sente-se também ai
a preocupagáo com a questáo social latino-americana; o artigo de Mons.
Roberto Roxo (pp. 51-68) parece especialmente denso e feliz, marcado por
nota de equilibrio, que nem sempre se encontra nos demais artigos. A
entrevista dada por Freí Betto (pp. 80-84) apregoa a absorcáo da oracao
pelo trabalho, em contra-parte ao lema "Ora e trabalha" das Ordens mo
násticas; preconiza também a adogáo dos sinais litúrgicos do candomblé
para substituir os da Liturgia católica, que, conforme o entrevistado, é
muito abstrata e inspirada por gestos da corte da monarquía européia
(p. 81).

Em síntese, o livro é interessante 8 útil ao estudioso, mas, por certo,


nao aprésenla teses definitivas e, sim, materia a ser ulteriormente pensada
e elaborada, como se le .na Apresentacáo do livro (p. 5), da lavra do Pe.
Beni dos Santos.
E.B

AOS NOSSOS AMIGOS E ASSINANTES PEDIMOS ENCA


RECIDAMENTE

1) QUEIRAM RENOVAR SEM DEMORA A SUA ASSINA-


TURA DE PR. CONTAMOS COM CADA CONTRI BUICÁO DE
NOSSOS LEITORES ;

2) QUEIRAM DIFUNDIR PR E OBTENHAM NOVOS ASSI


NANTES PARA A REVISTA, QUE PRECISA DE SE EXPANDIR
PARA MELHOR REALIZAR O SEU OBJETIVO.

3) QUEM ESTEJA COM OS PAGAMENTOS ATRASA


DOS, QUEIRA DIRIGIR-SE A LIVRARIA MISSIONÁRIA, RÚA
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DIRECÁO E REDACÁO DE PR

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