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VALLADARES, Ana Cláudia A**; SOUZA, Leila P.***; FUSSI, F. E.; MUNARI, D. B.
RESUMO
ABSTRACT
* Pesquisa financiada/ CNPq, vinculada ao Núcleo de Est. E Pesq. Em Saúde Integral/ FEN/UFG.
** Arteterapeuta e Coordenadora do Curso de Especialização em Arteterapia/UFG.
*** Arteterapeuta, Arte-Educadora da Secretaria Municipal de Educação em Goiânia – Goiás.
masks confection rescue the hospitalize children intimate appeal, bringing to their conscious what
was occult because of pain and stress disease, hospitalize and treatment experience. The mask
helps to recover the psychic balance, making stronger the healthy side of living.
Colocação do Problema:
A arte é um registro vivo da história da humanidade. As primeiras manifestações da arte
surgiram na pré-história junto a existência humana. Originalmente, a arte tinha um aspecto
mágico, onde as pinturas das cavernas ou as máscaras feitas de peles de animais usadas pelo
homem primitivo camuflavam o caçador, atraindo ou matando suas presas.
A arte, assim como as máscaras nela inseridas, sempre estiveram presentes em todas as
culturas e são manifestações de costumes, religiões e outros temas ligados à vida do ser humano e
da história da humanidade. Ora estavam a serviço da vida cotidiana, como instrumento de uma
técnica mágica ou como continuação da realidade; ora representavam algo profano ou sagrado,
que espantavam os maus espíritos; ou ora representavam apenas algo decorativo.
A arteterapia é uma modalidade de trabalho terapêutico que utiliza a arte, em todas as suas
manifestações expressivas, como instrumento do processo terapêutico onde o indivíduo expressa
suas imagens internas e inconscientes através de uma experiência artística. E é, por conseguinte,
compreendida como ato de expressar, de comunicar e de criar, que leva a processos de
desenvolvimento, transformação e auto-conhecimento (Pain & Jarreau, 1996).
Em arteterapia com abordagem junguiana, a conduta é fornecer materiais expressivos
diversos e adequados para a criação de símbolos presentes no universo imagético singular de
cada cliente. Esse universo traduz-se em produções simbólicas que retratam estruturas psíquicas
internas, do inconsciente pessoal e coletivo. Jung (1964) conceitua como inconsciente pessoal as
camadas mais superficiais, aquelas que bloqueiam recordações penosas ocorridas no decorrer da
vida. O inconsciente coletivo se refere às camadas mais profundas deste universo e são estruturas
psíquicas comuns a todos os homens.
Este processo, como cita Philippini (1995:4-5) colabora para a compreensão e resolução
de estados afetivos conflituados, favorecendo a estruturação e expansão da personalidade
através da criação.
Dentre os vários recursos expressivos usados em Arteterapia, este trabalho visa aprofundar
na utilização das máscaras. Algo fascinante para todos, objeto que disfarça, que simula e
transforma. O próprio vocábulo "persona" provém do latim persona, que originalmente significa
máscara, a pessoa que se transforma em outro ser.
A máscara então, pode ser definida como uma cobertura, um disfarce, colocada sobre o
rosto para dissimulá-lo ou substituído por outro artificial, criando assim a ilusão. A máscara
corresponde ao estado rudimentar da consciência em que não há distinção absoluta entre ser e
parecer e em que a modificação da aparência determina a modificação da própria essência
(Chevalier & Gheerbrant ,1996:597).
Como assinala Lexiron (1990:136) a máscara é uma forma muito antiga e expressiva
usada freqüentemente para encobrir o rosto; servia para assustar os inimigos e era utilizada
nas práticas mágicas para representar espíritos e poderes personificados de animais e homens,
acentuando quase sempre, de maneira evidente, determinados traços estereotipados do caráter.
A máscara está freqüentemente associada aos princípios básicos do teatro, como refere
Amaral (1996:33) a máscara, como o teatro, amplia conceitos, exagera fatos, amplia a vida,
mostra algo além do que aparenta.
Este termo máscara, ou persona, também é empregado dentro da psicologia analítica para
caracterizar a função desempenhada por alguém na sociedade ou sua posição social. O termo está
associado ao sistema de adaptação ou à maneira pela qual se dá a comunicação com o mundo.
Cada estado, ou cada profissão, por exemplo, possui sua persona característica... Pode-se dizer,
sem exagero, que a persona é aquilo que uma pessoa é verdadeiramente, mas o que nos mesmos e
outros pensam que somos (Jung apud Jaffé, 1975:357).
Assim, através da confecção de máscaras em Arteterapia, com suas inúmeras
possibilidades, surgirão os símbolos necessários para a compreensão e transformação dos
conteúdos inconscientes que representam.
Pelas contribuições potenciais das máscaras ao processo arteterapêutico, os símbolos
inconscientes transitarão para a consciência. Deste modo, contribuirão para a expansão de toda a
estrutura psíquica do ser humano, objetivando resgatar a qualidade de vida do indivíduo. Por isso,
poderá ser de grande produtividade terapêutica, especialmente com crianças enfermas e
hospitalizadas.
A doença, a hospitalização e o tratamento constituem uma "crise" na vida da criança e
afetam tanto o lado físico, como o psíquico e social da mesma, determinando distúrbios
comportamentais diversos, criando entraves ao desenvolvimento normal, como assinala
Angerami (1996).
Esses processos envolvem a perda da autonomia, a separação de pessoas e objetos
significativos, a interrupção de hábitos cotidianos, além de ter que obrigatoriamente lidar com
procedimentos dolorosos etc.
Nestas circunstâncias, a máscara em Arteterapia não é utilizada apenas como recurso
teatral, educacional ou como forma de divertir ou distrair, mas especialmente como forma de
expressar conteúdos internos conflitantes. Assim, procura-se resgatar o ajustamento emocional e
conseqüentemente físico e emocional da criança, contribuindo também para reduzir a atmosfera
geradora de tensão e angústia no ambiente pediátrico hospitalar, por ser algo lúdico.
Este trabalho é importante para profissionais da área de enfermagem, pois desconhece-se a
existência de estudos que tratem da máscara junto a crianças no ambiente hospitalar. Tendo em
vista que a equipe de enfermagem permanece um tempo maior com o grupo de crianças
hospitalizadas, consequentemente, esses profissionais percebem, com mais intensidade, suas
necessidades e anseios. Este trabalho é parte do projeto de pesquisa: “Pesquisando Caminhos
para a Prevenção da Saúde Mental na Assistência em Saúde e na Formação de Recursos
Humanos”.
Objetivos:
Os objetivos deste trabalho foram
- Apresentar subsídios teórico-práticos para os trabalhos de confecção de máscaras junto a
crianças hospitalizadas;
- Ilustrar e discutir casos de confecção de máscaras com grupos de crianças hospitalizadas.
Metodologia:
Optamos por um estudo descritivo e exploratório, com abordagem qualitativa. Foi
desenvolvido a partir de atividades artísticas desenvolvidas na Clínica Pediátrica do Hospital das
Clínicas de Goiânia / Goiás, nos períodos de 30-05-98 à 28-07-99.
Constituiu-se sempre de acompanhamento coletivo em sessões de Arteterapia não
consecutivas e com grupos distintos.
A população-alvo constituiu-se de catorze crianças de ambos os sexos, com idades entre
dois e doze anos. Em relação a escolaridade houve variação o analfabeto ao primeiro grau
incompleto. O nível sócio-econômico era baixo. Ambas as crianças encontrava-se hospitalizadas
e estavam acompanhadas por cuidadores durante o processo de hospitalização e apresentavam
casos clínicos diversos.
De acordo com o momento do processo terapêutico propunha-se à criança a construção de
máscaras como forma de expressar-se diante de sua problemática. Esta proposta era feita de
maneira simples e livre, mas sempre após a temática trazida naquela sessão específica, como por
exemplo a leitura de um conto de fadas.
A forma de conduzir a dinâmica era absolutamente natural e espontânea, tanto por parte
dos profissionais da saúde como por parte dos enfermos. O que mais importava era proporcionar
à criança a oportunidade de criação das máscaras a partir de histórias e, posteriormente, a
dramatização dos personagens criados como forma de exteriorizar os seus conteúdos internos.
Na coleta de dados, todo o comportamento e reação da criança era observado de forma
estruturada, desde a forma de sua aceitação ou não da proposta, suas expressões e/ou
verbalizações, a escolha e manipulação dos materiais utilizados e o processo de elaboração do
produto artístico.
Após o término das sessões, registravam-se as observações por escrito na tentativa de ser
extremamente fiéis aos seus conteúdos manifestos, facilitando uma posterior análise mais
criteriosa.
A análise dos dados ocorreu com base na confecção das máscaras e na mudança
comportamental dos enfermos frente à criação dos personagens. O Comitê de Ética em Pesquisa
Médica Humana e Animal H/UFG, analisou e aprovou este Protocolo de Pesquisa, bem como o
termo de consentimento livre e esclarecido. E estes foram considerados em acordo com os
princípios éticos vigentes, tendo sido, portanto, aprovado para sua realização.
Caso A
Caso B
Caso C
Caso D
Caso E
Caso F
Caso G
Caso H
Caso I
Caso J
Caso K
Caso L
Caso M
Caso N
Conclusões:
As crianças internadas formam um contingente significativo nos hospitais gerais. Destas
crianças, grande parte está, e provavelmente continuará, desenvolvendo bloqueios no seu
crescimento normal, devido às tendências apresentadas nos atendimentos terapêuticos atuais,
expressos através de reações de apatia, isolamento, tristeza, hipoatividade e impotência.
No que se refere aos casos específicos aqui apresentados, constatou-se que estas crianças,
enfermas em um processo terapêutico, ao construírem máscaras, puderam resgatar aspectos mais
saudáveis e estruturantes da personalidade. Isso reforça a afirmativa de que é possível minimizar
os aspectos desfavoráveis da hospitalização.
Verificou-se ainda que as crianças hospitalizadas, quando colocadas frente a materiais de
caráter lúdico e potencialmente expressivos, como as máscaras, manifestam-se criativamente.
Esse fato foi demonstrado pela produção final e pela significação simbólica dados a ela,
conforme a percepção individual sempre atinente a seus conteúdos próprios. Este processo
evidenciou-se pela mudança de comportamento e manifestou-se por um melhor equilíbrio
emocional das crianças ao término das sessões.
Observou-se que cada criança, construindo suas máscaras, lidou melhor com suas fantasias
latentes bloqueados pelo processo de hospitalização.
Esse processo assemelha-se a um ritual mágico onde, em alguns instantes, a criança pode
ser transportada para um mundo específico, só seu.
A construção das máscaras, por ser um exercício de caráter lúdico, ganha sentido nos
ambientes hospitalares, favorecendo ainda, a reconstrução dela própria, através de sonhos e do
criar com materiais expressivos, passando da reflexão à sua prática de vida.
A possibilidade dessa criança manifestar, refletir e confrontar-se com diversas questões
que lhe são pertinentes ao processo de vida, doença, internação e tratamento, podem favorecer
uma melhor elaboração e, conseqüentemente, adaptação à condição de ser ou estar doente.
A máscara resgata os encantos íntimos dessas crianças, trazendo à luz de sua consciência o
que estava oculto pela dor e estresse vivenciados na doença, hospitalização e tratamento. A
máscara as ajuda a retomar seu equilíbrio psíquico, fortalecendo seu lado mais saudável de viver.
Importa destacar, então, a chance da construção das máscaras como co-participante na
elaboração da imaginação e fantasias internas e dissolução de bloqueios emocionais dessa
clientela. A manipulação, criação e construção de personagens é, necessariamente, ponto de
relevante importância na mudança de comportamento dessas crianças.
Nesta perspectiva, o atendimento à criança hospitalizada implica não apenas o
atendimento ao aspecto biológico da doença, mas o resgate a um ser autônomo e criativo,
proporcionando oportunidades de desenvolvimento em todos os seus aspectos biopsicossocial.
Estas estratégias objetivam a prevenção, remediação e recuperação da saúde do enfermo com
menos sofrimento e proporcionando-lhe uma vida mais saudável dentro de um ambiente tão
adverso.
Referências Bibliográficas:
1- ANGERAMI, V. A et al. E a psicologia entrou no hospital. São Paulo, Pioneira, 1996;
2- AMARAL, A M. Teatro de formas animadas. São Paulo, Edusp, 1996;
3- CHEVALIER, J.; GHEERBRANT, A Dicionário de símbolos. 10 ed. Rio de Janeiro,
José Olympio, 1996;
4- JAFÉ, A Memórias, sonhos e reflexões. 14 ed. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1975;
5- JUNG, C. G. O homem e seus símbolos. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1964;
6- LEXIKON, H. Dicionário de símbolo. São Paulo, Cultrix, 1990;
7- PAIN, S.; JARREAU, G. Teoria e técnica da arteterapia. A compreensão do sujeito.
Porto Alegre, Artes Médicas, 1996;
8- PHILIPPINI, A. Universo Junguiano e Arteterapia. In: Imagens da transformação. Rio
de Janeiro, v. 2, n. 2: 4-11, ago. 1995.