Sobre a imortalidade de Rui de Leão
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Rui de Leão é um nobre branco que se casa com uma mulher indígena. À beira da morte, seu sogro lhe apresenta uma poção que o tornará imortal. Beber o elixir sequer parece uma escolha: Rui de Leão abraça a imortalidade com avidez, apenas para perceber que estender tanto a própria vida talvez seja menos uma bênção e mais uma punição.
Publicados em 1872 e 1882, respectivamente, Rui de Leão e O imortal contam duas versões diferentes da mesma história. Nessa narrativa considerada a precursora da ficção científica brasileira, Machado de Assis usa seu típico estilo humorístico e crítico para explorar a realidade brasileira através dos séculos pelo ponto de vista de um único homem.
Os dois contos são reunidos em um só volume pela primeira vez para serem estudados em paralelo e podermos observar as sutis mudanças na escolha do autor – um deles está em terceira pessoa, contado por um narrador onisciente, e o outro é narrado pelo filho do protagonista. A edição da Plutão Livros ainda conta com um excelente prefácio de Roberto de Sousa Causo e ilustrações de Paula Cruz.
Machado de Assis
Joaquim Maria Machado de Assis (Rio de Janeiro, 21 de junho de 1839 Rio de Janeiro, 29 de setembro de 1908) foi um escritor brasileiro, considerado por muitos críticos, estudiosos, escritores e leitores o maior nome da literatura brasileira.
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Sobre a imortalidade de Rui de Leão - Machado de Assis
Prefácio
O imortal e o imortal: Machado de Assis e a ficção científica
Rui de Leão
O imortal
Machado de Assis
Roberto de Sousa Causo
Paula Cruz
Créditos da edição
Machado de Assis e a ficção científica
A FICÇÃO CIENTÍFICA brasileira existe desde meados do século XIX. Essa é uma afirmativa que, ao mesmo tempo em que é incontestável, exige explicações e qualificativos, especialmente porque a ocorrência de FC no país é bastante esporádica. O quadro de inconstância se dá, curiosamente, entre os anos de 1857 e 1957, um lapso de cem anos que forma o que chamei de Período Pioneiro da Ficção Científica Brasileira — e de saída admito que cem anos são de fato muito tempo para agrupar uma determinada circunstância literária.
Esse período, é claro, possui momentos e situações bastante variadas, mas é justo levantar dois pontos que circunscrevem muito da sua identidade: primeiro, a maior parte daquela produção ficcional aderia aos modelos narrativos e às convenções literárias do século XIX, especialmente o romance de aventura e de capa e espada, o conto de subjetividade romântica, a narrativa de mundo perdido, a sátira social e o panfleto utópico; segundo, a falta do entendimento — crítico ou popular — de tal produção como parte de um gênero literário específico.
O segundo aspecto citado começa a se alterar muito rapidamente a partir de 1957, ano em que os cientistas soviéticos puseram o Sputnik em órbita, e quando a ameaça de conflito nuclear entre as superpotências vencedoras da Segunda Guerra Mundial, além do advento de inovações tecnológicas como o computador, o aparelho de televisão, o voo supersônico e o míssil teleguiado entraram na consciência popular. São fatores que aproximam a realidade imediata das ideias da ficção científica. A FC é então redescoberta como um gênero literário com algo a dizer de concreto, profundo e urgente sobre o mundo. Nos Estados Unidos, a grande produção antes dirigida às revistas populares (chamadas de pulp magazines) já havia se decantado em um número de romances e antologias publicadas em livro — edições em capa dura destinadas ao mercado de bibliotecas públicas e clubes do livro; e edições em brochura e formato de bolso, em grandes tiragens, na assim chamada "revolução dos paperbacks" surgida durante a guerra.
No Brasil, dois livros lançados em 1958 marcam a chegada
da FC como gênero no país: a antologia Maravilhas da ficção científica, editada por Fernando Correia da Silva e Wilma Pupo Nogueira Brito, e O homem que viu o disco-voador, um hábil romance de Rubens Teixeira Scavone, ambientado em São Paulo e na Ilha da Trindade. A antologia não trouxe nenhuma história brasileira, mas apresentou uma brilhante e erudita introdução do crítico Mário da Silva Brito, que, por si só, disparou um debate envolvendo a intelectualidade de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro sobre a relevância ou irrelevância da FC para a literatura e a modernidade. O gongo soou, e no ringue dessa questão literária subiram figuras de peso como Otto Maria Carpeaux, Wilson Martins, Antônio Olinto, Maria de Lourdes Teixeira, João Camilo de Oliveira Torres, Clóvis Garcia, Alcântara Machado, Frederico Branco, Willy Lewin, Fausto Cunha, Laís Corrêa de Araújo, André Carneiro e o editor Gumercindo Rocha Dorea. Algo semelhante só viria a acontecer com os esforços de Luiz Bras (pseudônimo de Nelson de Oliveira) — seguidos ao seu ensaio-manifesto Convite ao mainstream
(2009) — de aproximar a ficção científica da ficção literária brasileira, mas em menor escala e com menor polêmica.
Quase nesse mesmo instante, Gumercindo Rocha Dorea publica a coletânea de histórias Eles herdarão a Terra (1960), de Dinah Silveira de Queiroz, e a Antologia brasileira de ficção científica (1961), editada por si próprio — a primeira antologia de FC brasileira da história da literatura. Os livros saíram na coleção Ficção Científica GRD, que a partir daí abrigou diversos outros autores nacionais: Olinto, Carneiro, Cunha, Zora Seljan, Levy Menezes, Guido Wilmar Sassi, Álvaro Malheiros e o veterano Jerônymo Monteiro — que fundou a Associação Brasileira de Ficção Científica (o primeiro fã-clube de FC do país) e foi o editor do Magazine de Ficção Científica (1970-72), nossa versão da importante revista americana The Magazine of Fantasy & Science Fiction.
Seguindo as Edições GRD de Dorea, veio a EdArt, publicando Carneiro, Nilson D. Martello, Walter Martins, Domingos Carvalho da Silva e vários outros. O Clube do Livro também participou desse momento, publicando Scavone e Luiz Armando Braga. A atuação de Dorea foi impactante o suficiente para que Fausto Cunha, então um dos críticos mais relevantes do Brasil, chamasse de Geração GRD
o elenco de escritores brasileiros que escreveram FC naquela década.
Surge aí, entre 1957 e 1972, a Primeira Onda da Ficção Científica Brasileira. Sem dúvida, a ditadura militar (1964-85) teve um papel tanto na descontinuidade da Primeira Onda quanto na reorientação do que seria a tônica da FC nacional na década de 1970. Esse momento seguinte — que pode ser chamado de Ciclo ou Onda de Utopias e Distopias (1972-82) — empurrou os autores da Primeira Onda para o fundo do palco, como as figuras que tiveram uma sobrevida nessa década, Carneiro, Cunha, Queiroz e Scavone. Para a frente veio uma FC que, muitas vezes de maneira alegórica e absurdista, fazia a crítica ao regime militar, à tecnocracia e à impertinência do Estado que tentava gerenciar a sexualidade e os costumes. Foram autores como Ruth Bueno, Mauro Chaves, Chico Buarque, Maria Alice Barroso, Herberto Sales, Márcio Souza e, especialmente, Ignácio de Loyola Brandão, cujo romance Não verás país nenhum (1981) se tornou o marco daquele momento. Essa tendência, porém, dissipou-se com